Maria de Lurdes Rodrigues diz que avaliação de professores acabou em Portugal

Ex-ministra da Educação defende que é necessário encontrar "outros instrumentos" que não suscitem a contestação que o seu modelo de avaliação provocou.

O encontro de seis ex-ministro da Educação foi promovido pela Fundação Francisco Manuel dos Santos
Fotogaleria
O encontro de seis ex-ministro da Educação foi promovido pela Fundação Francisco Manuel dos Santos Público
Fotogaleria
Público
Fotogaleria
Público
Fotogaleria
Público
Fotogaleria
Público

O tema da avaliação dos professores acabou em Portugal. Quem o diz é a ex-ministra da Educação Maria de Lurdes Rodrigues que, precisamente, fez da avaliação de professores o seu cavalo de batalha.

Respondendo a uma questão sobre o fim da prova de admissão à carreira, Maria de Lurdes Rodrigues, que pertenceu ao Governo liderado por José Sócrates entre 2005 e 2009, assumiu na presença dos outros ex-ministros da Educação que o final do seu mandato mostrou que “não existem condições objectivas” para introduzir a avaliação docente.

O modelo de avaliação introduzido pela ex-governante foi sendo sucessivamente simplificado, incluindo no seu mandato, tendo sido expurgadas as componentes que geraram mais polémica, como a influência dos resultados dos alunos ou a obrigatoriedade da observação de aulas, que foi limitada a dois escalões de uma carreira que tem dez.

Actualmente, os professores estão também obrigados à apresentação de relatórios anuais, que são avaliados por responsáveis da escola ou por professores exteriores, caso se tenha realizado a observação de aulas.

Maria de Lurdes Rodrigues falava durante uma mesa redonda com os ex-ministros David Justino (PSD/CDS), Maria do Carmo Seabra (PSD/CDS), Isabel Alçada (PS) e Nuno Crato (PSD/CDS), com moderação de outro antigo titular da pasta, Marçal Grilo (PS). Sendo a avaliação um “tabu é nosso dever arranjar outros instrumentos que permitam alcançar os mesmos objectivos – melhorar o recrutamento e as competências – sem os confrontos e as crispações a que assistimos”, disse Maria de Lurdes Rodrigues.

A última vaga de contestação teve no centro a chamada Prova de Avaliação de Conhecimentos e Capacidades (PAAC), obrigatória para acesso à carreira. Esta prova foi legislada por Maria de Lurdes Rodrigues, posta em prática por Nuno Crato e extinta pelo actual ministro.

O encontro dos ex-ministros foi promovido pela Fundação Francisco Manuel dos Santos para analisarem os resultados da última edição dos testes PISA, realizada em 2015. Os testes PISA são promovidos pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico (OCDE) para avaliar a literacia dos alunos de 15 anos em matemática, ciências e leitura. Em 2015, os resultados dos alunos portugueses ficaram pela primeira vez à frente da média da OCDE.

Perigo de recessão

Isabel Alçada, que sucedeu a Maria de Lurdes Rodrigues no segundo Governo de José Sócrates e é actualmente conselheira para a Educação de Marcelo Rebelo de Sousa, revelou que recebeu a notícia com "lágrimas nos olhos". O feito atribui-o ela, em grande parte, às medidas adoptadas pelos ministros socialistas da Educação, a começar por Marçal Grilo, com a expansão da rede pré-escolar, e sobretudo às adoptadas por Maria de Lurdes Rodrigues, que não nomeou, como a adopção do modelo de gestão, que criou a figura de director, e a requalificação das escolas.  

Os alunos que realizaram o PISA em 2015 "são tributários dos investimentos políticos" que foram feitos na educação, afirmou Maria de Lurdes Rodrigues, que destacou também a expansão da rede do pré-escolar. Os testes PISA têm permitido aferir que os alunos que frequentaram o pré-escolar têm, em regra, melhores desempenhos.

Mas a ex-ministra alertou para o perigo de uma "recessão" nos resultados, devido à quebra de frequência daquele nível de escolaridade durante os anos de crise, e também ao desvio precoce de alunos para vias profissionalizantes que, lembrou, vai contra as recomendações da OCDE.

A ex-ministra deixou o recado, sem especificar que o desvio para vias profissionalizantes a partir dos 13 anos foi introduzido em Portugal por Nuno Crato, com os chamados cursos vocacionais, que entretanto estão a ser extintos.

Resultados e capital humano

"Os últimos anos foram muito importantes para estes resultados", comentou Nuno Crato, frisando que "a educação custa a construir, mas é muito fácil de destruir". Em seu abono, Crato lembrou ainda que, para além dos bons desempenhos do PISA, a taxa de retenção desceu em 2015 em todos os níveis de ensino para os valores "mais baixos" de sempre, o mesmo acontecendo com a taxa de abandono precoce da educação, que em 2015 estava nos 13,7%. Um ano depois subiu para 14%. 

Recuando mais no tempo, Crato considerou que os resultados do PISA são também fruto de uma "maior atenção aos resultados", da introdução de exames e de metas curriculares. Para se progredir, "são precisos objectivos claros e uma grande autonomia para os atingir", disse ainda. 

David Justino, que foi ministro do PSD/CDS entre 2002 e 2004, considerou, por seu lado, que as taxas de retenção ainda existentes resultam numa "destruição do capital humano", sendo a sua redução um dos "principais desafios" que o sistema educativo tem pela frente, Quanto aos resultados do PISA, indicou que uma das variáveis que mais contaram para o melhor desempenho de Portugal foi a existência de um número significativo de escolas de meios carenciados que tiveram melhores resultados.

"Temos melhores alunos do que em 2000", quando da primeira edição do PISA, e também "professores mais motivados", disse. "O país percebeu a importância da avaliação e da exigência. É uma cultura que hoje está assumida e que há 20 anos não existia", concluiu Marçal Grilo, que foi ministro da Educação do PS entre 1995 e 1999. Grilo referiu a propósito que a cultura de avaliação e da exigência "não tem a ver exclusivamente com exames", mas sim com que o que cada um pretende para si próprio.

Sugerir correcção
Ler 15 comentários