Deus e a deusa

Ainda há notícias que me obrigam a beliscar-me para ver se não são fantasias. Acaso li o Luís Miguel Queirós no PÚBLICO a dizer que a Fundação Gulbenkian lançou na segunda-feira três volumes com crónicas da Agustina Bessa-Luís? Não posso ter lido. É bom de mais para ser verdade.

Nesse sonho eram 2791 páginas – mais de 900 generosíssimas páginas por volume – de ensaios e artigos escritos por Agustina para a imprensa, entre 1951 e 2007. O trabalho de recolha e a organização tinha sido da escritora Lourença Baldaque, neta de Agustina e filha de Mónica Baldaque. É bom de mais para ser verdade? É porque não pode ser.

Mas pode. E é. É verdade. Tive de reler tudo várias vezes até acreditar. Não seria só um volume que tinha saído, ficando os outros para sabe-se lá quando? Não. Foram três. Não tinha sido muito difícil juntar todas as colaborações de Agustina? Foi. Contou muito o grande cuidado de Alberto Luís, que casou com ela em 1945: uma colaboração sagrada nascida do amor por Agustina e pela consciência da enorme importância dela. Mas o prazer agora é dos leitores, todo nosso. Como é que podemos começar a agradecer?

Diz Lourença Baldaque que a avó "via a literatura como um só universo". É isso. O génio de Agustina está em tudo o que escreveu. Agustina tinha opiniões taxativas e surpreendentes sobre tudo, escritas não só por uma deusa da prosa – mas como se o impróprio Deus escrevesse sobre o que criou. Pasma-se diante do divino mas é maior o pasmo de saber que veio de mão humana.

Sugerir correcção
Comentar