Decreto para banir Irmandade nos EUA pode abrir “caça às bruxas a muçulmanos”

ONG como o Council on American Islamic Relations, que levou a ordem de Trump sobre a imigração e os refugiados a tribunal, temem ser perseguidas.

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Muçulmana americana num protesto contra a ordem de Trump no aeroporto internacional de Filadélfia Charles Mostoller/Reuters

A proposta de lei para considerar a Irmandade Muçulmana um grupo terrorista chegou ao Congresso antes da tomada de posse do Presidente Donald J. Trump. Mas as medidas e o discurso do novo chefe de Estado a respeito dos muçulmanos, assim como as opiniões que alguns dos seus nomeados ou próximos expressaram, fazem organizações não governamentais (ONG) como a CAIR – Council on American Islamic Relations – temer o pior.

“Neste momento, temos republicanos radicais e extremistas islamófobos a decidir a política dos EUA e penso que todas as minorias se devem preparar para uns próximos anos muito atribulados”, diz à Al-Jazira o porta-voz da CAIR, Corey Saylor, temendo que a proposta desemboque numa “caça às bruxas”.

A legislação foi promovida pelos senadores republicanos Ted Cruz e Mario Díaz-Balart e é apoiada pela nova Administração. Chama-se Lei de Designação Terrorista da Irmandade Muçulmana e acusa o grupo, fundado no Egipto, de planear uma “grande jihad” para “destruir a civilização ocidental” a partir do seu interior. “Esta ameaça poderosa à nossa civilização intensificou-se durante a Administração Obama por causa da cegueira obstinada das políticas do politicamente correcto que puseram em causa a nossa segurança”, afirma Cruz, ex-candidato presidencial, numa declaração que acompanha a proposta.

Cruz acusa a CAIR de ser um membro da Irmandade Muçulmana, o que Saylor garante não ter qualquer base sem deixar de temer que os grupos muçulmanos da sociedade civil sofram as consequências se a proposta de tornar lei.

Hugh Handeyside, advogado do projecto de Segurança Nacional do  ACLU (American Civil Liberties Union), vê a medida de Cruz e Díaz-Balart como parte “de um longo e articulado plano dos islamófobos extremistas para estigmatizar os muçulmanos americanos”, grupos que já tinham tentado atacar esta minoria, sem sucesso, nas anteriores Administrações de George W. Bush e de Barack Obama. “Qualquer medida para designar a Irmandade Muçulmana pode dar munições à Administração Trump para atacar a sociedade civil americana muçulmana, essa designação abriria a porta ao recurso a leis injustas e propositadamente amplas para designar outras entidades”, argumenta.

Esta é a quinta vez que membros do Senado e da Câmara dos Representantes tentam rotular a Irmandade Muçulmana como organização terrorista – no Egipto, essa designação, promovida depois do golpe de Estado contra o primeiro Presidente eleito democraticamente, Mohamed Morsi, apoiado pelo grupo islamista, serviu de pretexto aos novos líderes militares para perseguir críticos do Governo e diferentes opositores, incluindo ONG de direitos humanos seculares e com décadas de trabalho no país.

A verdade é que, como diz Saylor, “todas as organizações muçulmanas nos EUA já foram sujeitas a processos de veto, muitos extremos, com Bush e com Obama. Se eles começarem a perseguir-nos, então o público tem de saber que é apenas uma caça às bruxas, já todos fomos investigados.”

Nos últimos dias, CAIR e ACLU têm estado no centro das notícias nos EUA por ambas estarem em tribunal a tentar travar os efeitos da ordem presidencial de Trump a suspender a entrada de cidadãos de sete países muçulmanos por três meses e de todos os refugiados por quatro (para os sírios, por tempo indeterminado). O ACLU impôs ao Presidente a primeira derrota, ao conseguir que uma juíza ordenasse a suspensão da medida, no sábado. Durante o fim-de-semana, esta ONG recebeu doações no valor de mais de 24 milhões de dólares.

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