Investidores querem construir parque subterrâneo na Praça da Alegria

Projecto ocupa subsolo de três prédios e parte de uma área do domínio municipal e pode colidir com estatuto de protecção às árvores da praça. Promotores pedem urgência na decisão.

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Árvores da Praça da Alegria estão classificadas e protegidas por lei Nuno Ferreira Santos

A ideia de uma nova Praça da Alegria sem carros, anunciada no projecto de reabilitação da autarquia para esta zona da cidade, não coincide com aquilo que a câmara de Lisboa está a fazer agora”. Quem diz é Catarina Lopes, directora geral de um fundo imobiliário dono de um edifício para reabilitação na praça, que acusa o município de “comprometer seriamente” os objectivos do programa de reabilitação com o atraso na aprovação de um projecto de acesso único às garagens subterrâneas de três prédios da praça. A classificação das árvores da praça pode impedir esta solução. 

Vamos por partes. A East Banc Portugal, subsidiária da norte-americana EastBanc Inc e proprietária de vinte edifícios na zona do Príncipe Real, detém, desde 2008, o prédio com os números 1,2 e 3 da Praça da Alegria e 81 a 89 da Avenida da Liberdade. Submeteu há um ano e meio o Pedido de Informação Prévia (PIP) à câmara. A empresa propõe, em vez da instalação de monta-autos (elevadores para automóveis) nas traseiras do edifício, no topo nascente da Praça da Alegria, a construção de um estacionamento subterrâneo com acesso comum a outros dois edifícios contíguos, também a serem reabilitados - um pela Stone Capital, outro pela NM Architects, num total de 64 lugares de estacionamento previstos.

A primeira proposta foi rejeitada pelo pelouro do Urbanismo da Câmara de Lisboa, tendo um segundo PIP sido entregue em Maio de 2016, com alterações. De acordo com a empresa, esta segunda proposta foi aprovada na generalidade pelo gabinete de Manuel Salgado no início de Janeiro, tendo seguido para os departamentos técnicos (entre os quais o departamento de tráfego e o das estruturas verdes), com os quais foram feitos vários ajustes. A versão final chegou resultado de “um compromisso milimétrico” sobre a área para acomodar as árvores já existentes, classificadas como interesse público, e fazer corresponder a curvatura das garagens à legislação do tráfego. Aprovado pelos departamentos, espera a aprovação final do pelouro.

O projecto, a que o PÚBLICO teve acesso, consiste na criação de um estacionamento subterrâneo com cerca de 500 m2 com entrada e saída pela Rua da Conceição da Glória, acesso cedido pelo Palácio São Miguel - a ser reabilitado pela NM Architects. Cerca de dois terços desta área pertencem ao município, sendo para isso necessária autorização da autarquia.

Esta opção evita, dizem as três empresas envolvidas, o acesso a garagens pela praça, as cargas e descargas na via pública e o estacionamento à superfície pelos utilizadores dos prédios (dois deles para habitação ou turismo, outro para escritórios). Avaliada em cerca de 875 mil euros, permitirá ainda “libertar o rés-do-chão, que de outra maneira fica ocupado pelos monta-autos, para colocar lojas e esplanadas”, assume Catarina Lopes.

A questão é que a janela de oportunidade para a construção do estacionamento subterrâneo está a esgotar-se, à medida que as obras nos edifícios da Stone Capital e da NM Architects avançam. “Temos 4 a 5 meses para começar a obra sem que isso implique atrasar as obras dos outros dois edifícios”, afirmou a responsável da East Banc. O PÚBLICO tentou contactar as duas empresas, mas não obteve resposta até ao fecho da edição.

Em resposta ao PÚBLICO, a Câmara de Lisboa esclarece que está a aguardar um “parecer favorável do Instituto de Conservação da Natureza e Florestas”, dado que a escavação dos acessos ao estacionamento coincide “em parte com a área de protecção do arvoredo da Praça da Alegria.” Uma vez que este parecer é vinculativo, a provação do PIP está suspensa até obterem resposta. Ainda assim, a autarquia afirma que decorrem reuniões com os promotores para acompanhamento do desenvolvimento do projecto de licenciamento.

De acordo com a lei de protecção do arvoredo classificado de interesse público em vigor (número 53/2012), estas árvores beneficiam automaticamente de uma zona de protecção de 50 metros de raio a contar da sua base, onde são proibidas quaisquer intervenções que as possam destruir ou danificar. O PÚBLICO teve acesso a um documento enviado, a 16 de Junho de 2016, pelo Instituto de Conservação da Natureza e Florestas à autarquia onde informa a revisão da classificação destas árvores, anterior à entrada em vigor da nova portaria (número 124/2014) que regula a lei agora em vigor, e onde é apresentada uma zona de protecção que não abrange os prédios em questão. Esta delimitação foi enviada ao departamento de estrutura verde do município. Na resposta, a Agosto de 2016, lê-se que o departamento concorda com a classificação e “com os limites propostos para a zona geral de produção.”

As três empresas assinaram uma carta conjunta, entregue esta quarta-feira ao pelouro do urbanismo, onde pedem “urgência na apreciação e viabilização da solução preconizada”.

Mas porque é que a “outra opção” é a construção de monta-autos? Uma vez que os proprietários são obrigados a colocar os acessos às garagens pela fachada menos valorizada, que neste caso é a Praça da Alegria, segundo Catarina Lopes, a colocação destes elevadores para automóveis é uma “solução lógica”, por não haver espaço para estacionamentos na rua. “Mas importa também valorizar o imóvel a longo prazo e isso passa pela valorização da praça”, argumenta, em defesa de uma solução que permitiria colocar comércio no rés-do-chão, minimizar eventuais congestionamentos na hora de ponta e, insiste, potenciar a zona como “uma praça para se visitar a pé.”

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