SNS português fica à frente do inglês em avaliação internacional

A Holanda é o país com a melhor classificação numa avaliação dos sistemas de saúde de 35 países europeus, do ponto de vista do consumidor.

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Portugal surge a vermelho no que diz respeito à elevada taxa de cesarianas, à extrema dificuldade de acesso a cuidados de saúde oral e ao problemático acesso directo a consultas com especialistas Rui Gaudêncio

Portugal subiu, de 2015 para 2016, seis posições num ranking internacional, o Euro Health Consumer Index (que compara o desempenho dos sistemas de saúde de 35 países europeus) e ficou, pela primeira vez, à frente do Reino Unido e de Espanha. Efectuada por uma organização sueca numa perspectiva diferente da habitual (a do consumidor), esta avaliação anual coloca Portugal em 14.º lugar, com 763 pontos em mil possíveis.

Na edição de 2016, a Holanda voltou a ser o país que reuniu mais pontos nos 48 indicadores avaliados, conseguindo uma classificação de 927 em 1000, por oposição à Roménia, que se ficou pelos 497 pontos. A Health Consumer Powerhouse (HCP) faz esta análise desde 2005.

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Na edição de 2016, Portugal ultrapassou o Reino Unido por uma margem estreita, numa “escalada” que é destacada no relatório da HCP, divulgado nesta segunda-feira. Mas têm sido oscilantes as classificações obtidas por Portugal ao longo dos últimos anos neste ranking — do 25.º lugar, em 2012, passou para o 16.º no ano seguinte, subindo para o 13.º em 2014 e caindo para o 20.º lugar, em 2015, uma queda que, lê-se no estudo, se ficou a dever à percepção menos “positiva dos doentes sobre os tempos de espera”.

A avaliação é feita a seis áreas distintas. As áreas em que Portugal pontua pior, e em que deveria investir mais, são a da “acessibilidade” — devido às listas de espera — e a “diversidade e abrangência dos serviços prestados”. Em contrapartida, conseguimos melhor classificação na área dos direitos dos doentes, dos resultados dos tratamentos e na prevenção.

Portugal fica também bem colocado, nesta espécie de fotografia, no que diz respeito à relação entre os gastos em saúde e os resultados obtidos, uma análise do custo-eficiência dos cuidados de saúde que é designada “Bang for the buck”. Posiciona-se aqui no 10.º lugar, à frente da Holanda. Quando fala em resultados, a HCP refere-se, por exemplo, a sobrevivência ao cancro, mortalidade por doenças cardiovasculares e mortalidade infantil.

Mas ainda é longo o caminho a percorrer. Os principais problemas nacionais observados neste estudo não constituem surpresa, na maior parte dos casos. A HCP utiliza uma escala de cores para assinalar pontos fracos e fortes nos diferentes países, que vai de vermelho a verde, passando pelo amarelo. Portugal surge a vermelho no que diz respeito à elevada taxa de cesarianas, à extrema dificuldade de acesso a cuidados de saúde oral (estamos no segundo pior lugar, a seguir à Letónia) e ao problemático acesso directo a consultas com médicos especialistas.

A vermelho são igualmente assinalados os elevados tempos de espera para exames de diagnóstico em situações não agudas e a alta prevalência de infecções hospitalares por Sptaphylococcus aureus resistente aos antibióticos mais comuns (neste caso, estamos no segundo pior lugar, a seguir à Roménia).

Em contrapartida, o país aparece a verde em vários indicadores, como a queda na mortalidade por enfarte, o rácio de cirurgias às cataratas na população idosa (estamos em segundo lugar, a seguir à França) e a boa taxa de vacinação.

A amarelo destacam-se, entre outros indicadores, a acessibilidade a médicos de família e a disponibilidade de camas em lares de idosos e cuidados continuados por 100 mil habitantes.

Holanda e Suíça na liderança

No grupo dos 35 países, a Noruega regista o melhor resultado nas áreas dos direitos dos doentes e informação e na prevenção, enquanto a Holanda e a Suécia se destacam na diversidade e abrangência dos serviços e tratamentos disponibilizados, com a pontuação máxima (125). Os melhores resultados em saúde (“outcomes”) foram encontrados na Finlândia, Islândia, Alemanha, Holanda, Noruega e Suíça.

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A Bélgica, a Macedónia e a Suíça estão na liderança no que à acessibilidade diz respeito. Já nos aspectos relacionados com medicamentos, os melhores resultados são obtidos pela França, Alemanha, Irlanda, Holanda e Suíça.

No cômputo geral, a organização conclui que os sistemas de saúde europeus estão a melhorar e que o direito à escolha e o envolvimento dos doentes também. Pela primeira vez, acentua, há dois países (a Holanda e Suíça) que ultrapassam a barreira dos 900 pontos em mil. Mas os responsáveis da organização lamentam a persistente desigualdade entre os melhores classificados e os piores (Roménia, Montenegro, Bulgária, Albânia e Polónia).

Um exemplo que merece destaque, pela positiva, é o da Macedónia, que mudou radicalmente de posição no que à acessibilidade diz respeito, por ter posto em prática um sistema de registo electrónico dos doentes a aguardar tratamento, o que permitiu quase eliminar as listas de espera.

Resultados devem ser vistos com “cautela”

Compilado a partir de estatísticas públicas, de informação de organizações de doentes e de investigação independente, este ranking tem motivado algumas críticas de especialistas, que põem em causa o rigor dos seus resultados. A própria organização sublinha, aliás, que os resultados devem ser olhados com “cautela”, devido aos problemas da “qualidade da informação” que é fornecida. No entanto, as autoridades de saúde dos diversos países enviam dados e informações para este projecto. Em Portugal, a Direcção-Geral da Saúde colabora desde 2009.

Num comentário feito por escrito aos resultados desta classificação, Catarina Sena, da Direcção-Geral da Saúde, considera que Portugal ficou à frente de Inglaterra e de Espanha “porque está melhor classificado no que respeita à acessibilidade, sendo, entre outros aspectos, valorizada a possibilidade de marcação de uma consulta nos cuidados de saúde primários no próprio dia”.  

Nota, porém, que a pontuação de Portugal é “penalizada” porque este estudo “parte de um diferendo ideológico face ao nosso sistema, ou seja, privilegia o acesso indiscriminado aos cuidados de saúde, sendo que Portugal, ao seguir o modelo de Beveridge (também seguido no Reino Unido), parte de uma concepção de referenciação prévia, habitualmente via cuidados de saúde primários [médico de família]”.

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