Christo cancela instalação porque não quer Trump como senhorio

O artista abandonou o projecto Over the River, no qual terá investido cerca de 14 milhões de euros do seu próprio bolso, em protesto contra a administração de Donald J. Trump.

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Christo e Jeanne Claude Peter Morgan/REUTERS

Em 1985, Christo e Jeanne-Claude, a sua companheira de vida e obra que morreu em 2009, embrulharam a estrutura da Pont Neuf de Paris e não puderam deixar de notar o jogo de reflexos e luzes que o tecido dourado projectava no rio Sena. Nesse momento, imaginaram aquela que deveria ser a maior instalação pública do casal em território americano – um toldo prateado que percorreria uma extensão de 68 km sobre o rio Arkansas, no Colorado. Após mais de 20 anos de planeamento e de um investimento próprio de cerca de 14 milhões de euros, Christo anunciou esta quarta-feira que não pretende avançar com Over the River durante o mandato da administração de Donald Trump. “Venho de um país comunista”, começou por dizer ao The New York Times o artista que nasceu na Bulgária. “Uso o meu próprio dinheiro, faço o meu trabalho e os meus planos porque gosto de ser completamente livre. E agora o governo federal é o nosso senhorio”. Sem mencionar directamente o nome de Trump, Christo de 81 anos referiu que não pode “fazer um projecto que beneficia o senhorio”.

Over the River  estaria em exibição por 14 dias durante o mês de Agosto, para ser posteriormente desmantelado, à semelhança das restantes obras de Christo e Jeanne-Claude. Estimava-se que a instalação de arte pública, que demoraria dois anos a construir, levasse ao Colorado centenas de milhares de pessoas e gerasse uma receita de mais de 90 milhões de euros para aquele estado. Questionado directamente sobre a administração de Donald J. Trump, Christo reiterou que “a decisão fala por si” e assinalou que “tal como muitas outras pessoas, nunca acreditou que Trump fosse eleito”.

Apesar do grande investimento de tempo e dinheiro que implicou, Over the River enfrentou desde a sua concepção uma longa batalha legal. Um grupo de locais, Rags Over the Arkansas River (ROAR), argumentava que o projecto poria em perigo o rio e a vida selvagem do Bighorn Sheep Canyon, assim como o trânsito da estrada que atravessa o desfiladeiro. Joan Anzelmo, porta-voz do grupo, manifestou o seu contentamento pela decisão do artista, independentemente dos seus motivos. “Isto quer dizer que os locais agora estarão protegidos”, afirmou. Em tribunal, Christo argumentou que tomou todas as precauções necessárias de modo a evitar danificar o rio ou a terra à sua volta a longo prazo. Até à data, as suas declarações prevaleceram em tribunal, mas o artista referiu que “mesmo que ganhe o caso”, não levará o projecto avante.

Christo pretende agora concentrar-se em The Mastaba, uma instalação pensada para a cidade de Abu Dhabi, nos Emirados Árabes Unidos. Segundo Christo, o projecto foi pensado por si e pela mulher “há 40 anos” e, de acordo com o The Art Newspaper, será uma obra com 150 metros de altura composto por barris de metal que deverão imitar a forma de um trapézio. Esta deverá ser a única obra em grande escala do casal que ficará em exibição permanente.

Christo, cujo trabalho geralmente supõe envolver ou embrulhar a arquitectura de um espaço ou uma paisagem, é conhecido por projectos como The Gates (2005), em que dispôs 7503 painéis de tecido pelo Central Park, em Nova Iorque e por Wrapped Reichstag (1995), em que cobriu o edifício de Berlim com tecido prateado. No ano passado, The Floating Piers, um passadiço amarelo de tecido feito de 220 mil cubos flutuantes atraiu mais de um milhão de visitantes ao Lago de Iseo, em Itália.

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