Despesas com Papa em Portugal feitas por ajuste directo

Limite de empreitadas sem concurso público sobe de 150 mil euros para 5,1 milhões, abrangendo gastos tanto da administração central como da Câmara de Ourém.

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Papa estará em Portugal entre 12 e 13 de Maio Reuters/TONY GENTILE

As despesas relacionadas com a vinda do Papa a Portugal, entre 12 e 13 de Maio, e o chamado centenário das aparições não vão estar sujeitos ao lançamento de concursos públicos. Um decreto-lei publicado esta terça-feira em Diário da República estabelece um regime excepcional de contratação de empreitadas de obras públicas e de aquisição de bens e serviços por ajuste directo destinado a acelerar procedimentos, viabilizando as obras consideradas necessárias para acolher os visitantes que Fátima vai acolher naquela data.

O Governo tem justificado a medida com o facto de a confirmação da visita do Papa só ter tido lugar no final de Setembro passado. Assim, tanto o Estado como a Câmara de Ourém passam a poder contratar empreitadas por ajuste directo até 5,1 milhões de euros, quando o limite habitual acima do qual é obrigatório lançar concurso público se situa nos 150 mil. Da mesma forma, a aquisição de bens e serviços fica autorizada por ajuste directo até aos 207 mil euros, quando habitualmente não pode ultrapassar os 75 mil. Diz ainda o decreto-lei promulgado pelo Presidente da República que a entidade adjudicante deve convidar pelo menos três entidades distintas para apresentarem propostas. De entre as despesas a efectuar, o diploma legal elenca apenas aquelas que são da responsabilidade da autarquia de Ourém, e que passam pela reabilitação não só da rede viária como de vários imóveis, sendo omisso em relação a todas as outras.

"Esperados milhões de pessoas"

“São esperados milhões de pessoas, tornando-se necessário garantir acessos seguros, condições de escoamento rodoviário rápido e eficaz”, justifica o Governo. “Neste contexto, torna-se conveniente adoptar, até Dezembro de 2017, um regime que combine a celeridade procedimental exigida pela proximidade da data, em segurança, com a defesa dos interesses do Estado e a rigorosa transparência nos gastos públicos.”

“Tenho vontade de rir para não chorar”, diz a jurista Bárbara Rosa, uma das fundadoras do blogue Má Despesa Pública, lamentando que, à boleia do Papa, o Estado venha lançar mão de medidas que “contribuem para a falta de transparência, concorrência e igualdade na contratação pública”.

“Por que razão não foi lançado antes um concurso público urgente?”, interroga. Uma das diferenças entre esse procedimento e o adoptado, explica, é que o concurso urgente obriga a anúncio público, o mesmo não sucedendo com o ajuste directo. “Isto não augura nada de bom”, prossegue. A jurista teme que, mais uma vez, os gastos do erário público fiquem “no segredo dos deuses”, uma vez que podem vir a ser invocadas razões de segurança para algumas destas despesas não serem divulgadas. 

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