De onde vêm as misteriosas explosões de rádio no Universo? Agora já sabemos

Em 2007 surpreenderam toda a gente como as explosões de rádio mais distantes no Universo. Agora identificou-se a localização destas fontes de luz. E o mistério passou a ser outro.

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O radiotelescópio Very Large Array no Novo México (EUA) Danielle Futselaar

Não, ao olhar para o céu, por mais limpo que esteja, não conseguimos detectar as rápidas explosões de luz de que vamos falar. Foi preciso usar muitos telescópios ligados entre si para descobrir de que sítio vêm do Universo. Nas revistas Nature e The Astrophysical Journal Letters, uma equipa internacional de cientistas revela agora que estas explosões de luz na frequência de rádio tiveram origem fora da nossa galáxia (a Via Láctea), mais exactamente numa galáxia anã muito longe de nós, a 3000 milhões de anos-luz de distância.  

Decorria 2007 quando o radiotelescópio Parkes, na Austrália, detectou umas misteriosas explosões de rádio. Este fenómeno veio a ser designado por “explosões de rádio rápidas 121102”. E, em Novembro de 2012, detectou-se o primeiro e único conjunto consecutivo de explosões, na constelação de Auriga, com o radiotelescópio de Arecibo, em Porto Rico.

Mas permanecia a questão: de onde vinham afinal estas explosões, que duravam fracções de segundo mas eram muito energéticas? Sabemos agora que vieram de uma velha galáxia anã a mais de 3000 milhões de anos-luz da Terra. Fazendo contas, o Universo surgiu há 13.800 milhões de anos e a luz destas explosões levou 3000 milhões de anos a chegar até nós. O que significa que o Universo tinha então 10.800 milhões de anos desde o Big Bang – nessa altura, estavam a surgir no nosso planeta as primeiras células.

Para identificar a localização destas explosões foi preciso realizar observações em radiotelescópios de grandes dimensões, ao longo de 83 horas, distribuídas por seis meses em 2016. Primeiro, o radiotelescópio Very Large Array (VLA), no Novo México, nos EUA, detectou nove explosões de rádio isoladas.

Estas observações permitiram determinar a localização no céu das explosões e, em seguida, os cientistas apontaram para aí o telescópio Gemini Norte, no Havai, para obter uma imagem da luz visível (aquela que os nossos olhos vêem) do que se encontrava nessa região – e foi assim que identificaram uma galáxia anã muito ténue.

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O radiotelescópio Gemini Norte, no Havai Danielle Futselaar

Depois, a equipa usou vários radiotelescópios espalhados pela Europa, Ásia, África do Sul, Estados Unidos e Austrália, ligados pela técnica da interferometria. Através destas redes de radiotelescópios os cientistas conseguiram localizar, por fim, a posição das explosões de rádio com uma precisão cerca de dez vezes superior à das observações anteriores. “Com este nível de precisão, obtivemos provas fortes de que a origem das explosões está fisicamente relacionada com uma fonte persistente de emissões de rádio”, afirma Benito Marcote, um dos autores da descoberta, em comunicado da Faculdade para Investigação da Astronomia da Holanda.

Até agora, descobriram-se 18 explosões de rádio rápidas. Caracterizam-se por serem altamente energéticas, mas têm uma duração extremamente curta, de um a cinco milissegundos. Esperava-se que viessem de grandes galáxias, tanto com grande número de estrelas como de estrelas de neutrões (os restos mortais de estrelas maciças que explodem como supernovas e ejectam materiais para o cosmos).

Contudo, a galáxia anã onde ocorreram as explosões de rádio rápidas tem apenas 1% da massa da Via Láctea e poucas estrelas. Além disso, as suas estrelas nascem e morrem a grande velocidade, o que sugere que as explosões de rádio rápidas provêm de estrelas neutrões jovens.

Mas qual será a origem destas explosões? Podem ter sido estrelas de neutrões extremamente magnéticas (ou magneto-estrelas). Ou um buraco negro supermaciço activo no centro da galáxia, com emissões de rádio nas suas redondezas. E existem ainda outras hipóteses: explosões de longa duração de raios gama; e supernovas superluminosas, que ocorrem frequentemente em galáxias anãs.

“Há ainda muito trabalho até se desvendarem os contornos misteriosos das explosões de rádio rápidas”, diz a física Victoria Kaspi, também autora do estudo e da Universidade de Montreal, do Canadá. “Mas ter identificado a galáxia em que se localizam estas explosões já é um grande passo para resolver o puzzle.”

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O radiotelescópio Very Large Array (VLA), no Novo México, nos EUA Danielle Futselaar

No comentário ao artigo científico publicado também na Nature, Heino Falcke (do Instituto para a Matemática, Astrofísica e Física de Partículas, da Universidade de Nijmegen, na Holanda) escreve que estas explosões são “espectacularmente diferentes” porque vêm de um Universo muito distante. “As explosões de rádio rápidas são os sinais de rádio mais distantes de que temos conhecimento no Universo”, sublinha. “Foi uma surpresa, quando, quase uma década depois [em 2016], flashes de rádio aparentemente isolados foram descobertos com uma duração de poucos milissegundos.”

Mas este é apenas um começo na investigação das explosões de rádio rápidas no Universo. Continuarão a ser estudadas com telescópios capazes de ver na banda dos raios gama, dos raios X ou na luz visível, salienta a equipa. Para já, Laura Spitler, do Instituto Max Planck para a Radioastronomia, na Alemanha, dá um exemplo do que se pode desvendar: “Se conseguirmos encontrar uma periodicidade para a chegada das explosões, então teremos provas fortes de que são originadas pela rotação de estrelas de neutrões.”

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