Universidades: dezenas de professores dão aulas sem receber salário

Em 2014, eram 176 os casos de docentes com contratos sem remuneração. Sindicato Nacional do Ensino Superior calcula que o número tenha aumentado.

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Na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas da Universidade Nova de Lisboa são investigadores "voluntários" que asseguram algumas unidades curriculares Rui Gaudencio/arquivo

São docentes ou investigadores e trabalham com um contrato que não prevê remuneração. A situação não é nova e, só este ano, a Universidade do Porto contratou 40 professores neste regime, e a Universidade Nova de Lisboa tem aulas asseguradas por investigadores “voluntários”. A notícia é avançada nesta quarta-feira pelo Jornal de Notícias.

O Sindicato Nacional do Ensino Superior (Snesup) diz que estes contratos são “ilegais”, mas a balança desequilibra-se quando as instituições vêm desmentir e negar a ilegalidade dos mesmos. Gonçalo Velho, presidente do Snesup, diz ao JN que a autonomia das instituições universitárias se tornou um “Estado dentro do Estado”.

Perante os 176 casos calculados em 2014 pela Direcção-Geral do Ensino Superior, Gonçalo Velho afirma que esse número – que traduz 0,7% do total de contratações do sistema público – cresceu, apontando para um aumento de 35% desse número durante a anterior legislatura.

Enquanto a Universidade do Porto afirma que este tipo de procedimento “a título gracioso” é uma “tradição” para “suprir necessidades muito específicas”, a FCSH-UNL diz que existem unidades curriculares “não remuneradas” que são criadas “a pedido dos investigadores” para “disseminação da sua investigação” e não “necessárias para o funcionamento dos ciclos de estudos”, justificam as instituições ao jornal.

Contactada pelo JN, a Faculdade de Medicina Dentária da Universidade do Porto (FMDUP) confirma que dos 40 professores, três estão como assistentes convidados e os restantes pertencem a uma categoria superior na carreira.

Conhecida esta situação da FMDUP, o ex-director da instituição António Pinhão Ferreira enviou uma carta ao reitor da universidade – Sebastião Feyo de Azevedo – , alegando que este procedimento “agrava a precariedade” dos envolvidos. “É difícil consentir a existência de contratos de trabalho sem remuneração”, conclui ao JN.

Na carta enviada, o ex-director quis ver esclarecidas algumas questões, entre elas se a Universidade do Porto iria fazer descontos (Segurança Social e Caixa Geral de Aposentações) ou até mesmo se esses docentes com contratação não remunerada teriam direito, posteriormente, a subsídio de desemprego. A revisão da situação foi a promessa na resposta de Sebastião Feyo de Azevedo, que não voltou a dar novidades sobre o assunto.

Em Lisboa, a situação repete-se, mas desta vez com investigadores. Na Faculdade de Ciências Sociais e Humanas (FCSH) da Universidade Nova de Lisboa (UNL), os contratos sem remuneração não são assinados, mas os investigadores são convidados a participar no ensino, ou seja, dão aulas de graça.

Este ano, 39 unidades curriculares são leccionadas por investigadores, um processo que a faculdade diz ser sempre aprovado “a pedido dos investigadores”, cita o Jornal de Notícias. Esta experiência não pode constar no currículo dos investigadores, visto que quem “dá nome” às unidades curriculares são docentes de carreira, explica ao mesmo jornal José Neves, professor de História na FCSH.

“É um mecanismo de ilusão que cria um ciclo vicioso: a faculdade não precisa de criar lugares de quadro quando tem pessoas que asseguram essas aulas/funções de graça”, diz o professor de História ao JN.

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