2016: E a nossa vida ficou mais fácil?

O que nos trouxe 2016 e o que foi feito ao longo deste ano.

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O Túnel do Marão abriu este ano e aproximou Trás-os-Montes do litoral

Liberdade de escolha do hospital? 83 mil escolheram

Em Junho os cidadãos passaram a poder escolher o hospital do Serviço Nacional de Saúde (SNS) para onde são encaminhados para a primeira consulta de especialidade, ao contrário do que acontecia antes, quando eram por norma enviados para aquele que pertencia à sua área de residência. A liberdade de escolha já deu frutos: em cerca de meio ano (até 22 de Novembro), mais de 83 mil pessoas escolheram uma unidade hospitalar que não corresponde ao local onde residem, mas onde querem ser observadas e tratadas. Na maior parte dos casos, os doentes escolheram outros hospitais para conseguirem aceder de forma mais rápida a uma consulta com um especialista, sobretudo em áreas com atendimento mais demorado, como a oftalmologia, a dermatologia e a otorrinolaringologia. Esta nova possibilidade está, porém, a ter alguns efeitos secundários: há unidades de saúde que dão sinais de começar a ficar saturadas, porque estão a receber muito mais doentes, segundo alertaram já vários administradores hospitalares. Ao mesmo tempo, desde Abril passou a ser obrigatória a receita sem papel, que permite aviar a prescrição médica em momentos diferentes e em farmácias diferentes, se o doente assim o entender. Também os doentes crónicos passam a poder levantar medicamentos directamente na farmácia, sem terem de passar antes pelo centro de saúde. Quanto aos médicos, esses podem, com este sistema, aceder a informação sobre alergias do utente e reacções adversas anteriores. Mas a grande vantagem da receita sem papel é a de permitir combater com muito mais eficácia a fraude neste sector. Após a emissão da prescrição electrónica, os dados podem ser disponibilizados ao utente através do envio de uma mensagem de texto para o telemóvel (SMS), email ou através da impressão do guia de tratamento, que inclui a posologia e os códigos necessários para aviar a medicação.  Mas a operacionalização da receita sem papel também não está isenta de críticas: os médicos e os representantes das farmácias têm-se queixado de muitas falhas e erros, que levam a que muitas receitas tenham que voltar a ser passadas em papel. Erros que, segundo a Ordem dos Médicos, põem em causa “a segurança dos doentes” e frequentemente impedem a dispensa na farmácia. A instituição responsável pela prescrição electrónica, a Serviços Partilhados do Ministério da Saúde, alega que os problemas decorrem do “crescimento exponencial” da receita sem papel, que exige “alterações e melhorias constantes”. A.C.

 

Nova resposta para a violência doméstica

O anúncio foi feito em Junho pelo ministro adjunto Eduardo Cabrita, numa audição parlamentar na Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantia: Portugal ia ter, por fim, uma casa-abrigo para homens vítimas de violência doméstica. Há cada vez mais homens a quebrar o silêncio. O Relatório Anual de Segurança Interna 2015 aponta para 15% de vítimas do sexo masculino, esclareceu. Em Setembro, Eduardo Cabrita esteve em Faro a assinar a carta de compromisso entre o Estado e a Fundação António Silva Leal. A casa-abrigo pode acolher até dez homens. “Após acolhimento, apoiamos do ponto de vista psicológico, social, do ponto de vista da saúde e ajudamos num projecto de vida, que é exactamente o que fazemos com as mulheres”, referiu António Silva Leal. Este foi o ano da diversificação das respostas de emergência às vítimas de violência doméstica. A secretária de Estado para a Igualdade e Cidadania, Catarina Marcelino, assinou um acordo com a associação ILGA Portugal, em Lisboa, e com a Associação Plano I, em Matosinhos, para criar gabinetes de apoio a vítimas lésbicas, gays, bissexuais, ‘trans’ e intersexo. A.C.P.

 

A estreia dos manuais grátis e reutilizáveis

Em ano de estreia da nova medida, mais de 90% dos alunos do 1.º ano do ensino básico receberam os manuais oferecidos pelo Estado, aceitando a condição de os devolverem quando as aulas acabarem. E o país ficou assim mais perto de outros, como a Dinamarca, Finlândia, Noruega, Suécia, Reino Unido e França, onde os manuais são adquiridos pelos governos, regiões, autarquias ou escolas. E, por isso, não têm custos para as famílias. Com o Orçamento de Estado de 2017 veio o anúncio de que mais crianças seriam abrangidas pela gratuitidade (até ao 4.º ano de escolaridade). E o compromisso do Governo é o de que “no prazo da actual legislatura” esta se alastre a toda a escolaridade obrigatória. As escolas aplaudiram. Mas também houve quem contestasse. A Associação Portuguesa de Editores entregou pareceres ao ministério para fazer valer a sua posição (nomeadamente a posição do destacado constitucionalista Gomes Canotilho que entende que a reutilização dos manuais “dificilmente pode ser considerada um meio constitucionalmente legítimo” e que pode repercutir-se negativamente no aproveitamento escolar”, uma vez que os estudantes deixam de ter acesso aos livros dos anos anteriores, que entretanto devolveram). Mas parece difícil nesta fase voltar atrás. A.S.

 

O Simplex regressou com 255 medidas

Foi o ano do regresso do Simplex, com o objectivo de facilitar o relacionamento dos cidadãos com a administração do Estado. As 255 medidas preparadas pela ministra Maria Manuel Leitão Marques para a legislatura têm uma taxa de execução de 41%, sendo que 29 estão concretizadas. Destaquem-se: nascer com médico de família e boletins de saúde electrónicos, registo criminal online, aplicação Poupe na Receita, o catálogo editorial nacional, Empresa na Hora com pedido de livro de reclamações, envio de diplomas sem papel, factura dos pequenos retalhistas mais simples, gestão da sala de audiências, kit de boas-vindas os refugiados, segurança alimentar – acesso electrónico aos resultados laboratoriais, senhas de atendimento online para os centros de emprego. Foram abertas seis lojas do cidadão – Mafra, Sardoal, Cacém, Valongo e Arruda dos Vinhos, Anadia - e 55 espaços do cidadão – um dos quais no Consulado em Paris. Até ao fim do ano, está prevista a abertura de mais 12 espaços e duas lojas, em Belmonte e Santarém. S.J.A.

 

Um túnel histórico que fura a Serra do Marão

Oito anos depois de a obra ter sido lançada, os 5,7 quilómetros do maior túnel da Península Ibérica, o que fura a Serra do Marão, foram inaugurados em Maio com pompa e circunstância, permitindo aproximar Trás-os-Montes do litoral. A viagem entre o Porto e Vila Real passou então a poder fazer-se totalmente por auto-estrada permitindo poupar tempo e ganhar segurança. Isto para os condutores de veículos ligeiros dispostos a pagar 1,95 euros de portagem pelo percurso. O túnel, cujas obras estiveram paradas várias vezes, custou 137 milhões de euros aos contribuintes, um valor que sobe para os quase 400 milhões quando se contabilizada toda a nova auto-estrada entre Amarante e Vila Real. Na inauguração, o primeiro-ministro António Costa sublinhou o carácter histórico do investimento e comparou a relevância da abertura do túnel do Marão à construção da primeira ponte sobre o Tejo, durante o Estado Novo. Nenhuma outra infra-estrutura foi tão importante nos últimos 50 anos para vencer uma barreira natural, considerou. M.O.

 

Pobreza desceu pela primeira vez em quatro anos

É uma boa notícia, mas também tem um travo amargo — e foi preciso esperar por ela até aos últimos dias do ano. Na quinta-feira o Instituto Nacional de Estatísticas divulgou os mais recentes dados sobre pobreza. Diz que em 2015, em Portugal, a percentagem de pessoas com rendimentos abaixo da linha de pobreza desceu para 19% (contra 19,5% nos dois anos anteriores). Foram só 0,5 pontos percentuais, é certo. Mas foi a primeira descida em quatro anos. Uma parte da explicação para a redução é simples: a emigração fez com que muitos dos que estavam desempregados saíssem do país. E, na verdade, a taxa de pobreza entre os idosos aumentou. Mas os primeiros dados de 2016 revelados pelo INE reforçam a tendência, ainda que ténue, de melhoria. Há menos pessoas em privação material em relação ao ano passado (aqui medida não pelos rendimentos, mas por indicadores como ter ou não capacidade para fazer uma refeição de carne ou peixe de dois em dias, conseguir ter as rendas e outras despesas em dia ou pagar uma semana de férias por ano fora de casa). A.S.

 

Barrigas de aluguer “retocadas”

Três meses depois de tomar posse, o regime da gestação de substituição que legalizava as chamadas barrigas de aluguer – obrigatoriamente gratuitas – foi o primeiro diploma que Marcelo Rebelo de Sousa entendeu devolver ao Parlamento, tornando-se assim no seu primeiro veto político, a 7 de Junho. Na AR, a lei fora aprovada numa data simbólica, a 13 de Maio, com os votos do PS, BE, PEV e PAN e 24 deputados do PSD.

O Presidente - que promulgara, no entanto, o alargamento das restantes formas de procriação medicamente assistida a todas as mulheres - considerou que o articulado tinha lacunas legais que podiam desproteger a criança gerada ou provocar conflitos entre os pais e a pessoa que disponibilizava a barriga, tal como prevenia o Conselho Nacional para as Ciências da Vida. O Bloco de Esquerda, proponente original do diploma, acatou as recomendações e introduziu alterações ao texto na reapreciação em plenário. A versão final foi aprovada a 20 de Julho e recebeu a promulgação de Marcelo dez dias depois. M.L.

 

À segunda, a adopção plena tornou-se realidade

A história da adopção plena, ou seja, extensiva a casais do mesmo sexo, tinha já vários capítulos na Assembleia da República e até fora aprovada na generalidade em 2013, mas o processo acabou por ser atropelado por uma proposta de referendo dos deputados da JSD com disciplina de voto, caso que levou à demissão da vice-presidente da bancada Teresa Leal Coelho, e depois pelo chumbo de todas as iniciativas da esquerda por PSD/CDS.

A esquerda não descansou e prometeu voltar à carga. A 18 de Dezembro do ano passado, as propostas do PS, BE, PEV e PAN para o acesso pleno à adopção por casais de pessoas do mesmo sexo foram aprovadas na AR, mostrando a divisão do PSD no assunto: em 86 deputados presentes, 17 votaram a favor e quatro abstiveram-se. Remetido o diploma a Belém, Cavaco Silva vetou-o na véspera das presidenciais, fazendo-o voltar ao Parlamento. Este reconfirmou-o em plenário a 10 de Fevereiro, obrigando o ex-Presidente a terminar o mandato promulgando uma matéria em relação à qual era contra. M.L.

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