“Estávamos nas ruas da amargura, agora conseguimos chegar ao topo”

Vila Cova lidera o “ranking alternativo” do ensino secundário. Há dez anos, a escola estava no fundo da tabela, mas tem feito um investimento para escapar aos constrangimentos da sua localização, na zona rural do concelho de Barcelos.

Fotogaleria
Nélson Garrido
Fotogaleria
Nélson Garrido
Fotogaleria
Nélson Garrido
Fotogaleria
Nélson Garrido
Fotogaleria
Nélson Garrido
Fotogaleria
Nélson Garrido
Fotogaleria
Nélson Garrido

Na sala oito da escola de Vila Cova, em Barcelos, só estão dez alunos. Sentados nas primeiras filas, não reparam na imensidão de lugares vazios atrás de si. Junto ao quadro, o professor Carlos Silva está a tirar as últimas dúvidas da matéria de Geometria a Três Dimensões antes de fechar este capítulo do programa do 11.º ano. A turma é assim pequena habitualmente: só há cinco estudantes em falta. E isto é uma vantagem. “Posso fazer perguntas a todos durante uma aula e ir ao lugar de cada um ver como está a correr o trabalho”, conta o docente, que é o responsável pelo grupo de Matemática.

A escola de Vila Cova é a primeira do ensino secundário num “ranking alternativo”, que permite saber qual a percentagem de alunos que não chumbou nem no 10.º ano nem no 11.º e teve positiva nos exames estruturantes do 12.º ano. Também o seu director, Alberto Rodrigues, concorda que o facto de ter cerca de 500 alunos do 1.º ciclo ao ensino secundário contribui para os seus bons resultados. A dimensão média das turmas nos vários níveis de ensino está abaixo dos 20 alunos. “Toda a gente se conhece. Eu sei os nomes de todos os alunos do secundário, por exemplo.”

O tamanho do estabelecimento de ensino também é apontado como determinante por Fernando Trindade, director do agrupamento de escolas da Mealhada, ao qual pertence a Escola Básica de Pampilhosa n.º 2. Esta é, no 3.º ciclo do ensino básico, a segunda escola no “ranking alternativo” (atrás do Colégio do Vale, em Almada) e a melhor representante da rede pública. Tem 280 alunos. “Não é bem a história do ‘small is beautiful’ (frase do economista Ernst Friedrich Schumacher, que em português se pode traduzir por “o pequeno é bonito”), mas anda perto disso”, graceja aquele responsável.

Receitas, não há

Trindade diz não haver “uma receita” que explique o sucesso da escolha da Pampilhosa, à parte essa condição. “Tentamos planificar os momentos de avaliação para que não haja sobreposições e as famílias possam tomar decisões em função disso e damos apoio aos alunos para as provas externas, mas há muitas outras escolas a fazer este tipo de coisas”, reconhece. No ranking tradicional, que só leva em conta as notas nos exames, a escola da Pampilhosa está no 480.º lugar, bem longe do resultado alcançado no ano passado (109.º).

Já a escola de Vila Cova conseguiu este ano melhorar a sua prestação no ranking do ensino secundário: de 83.º para 81.º lugar. Este resultado consolida uma melhoria que se tem verificado ao longo dos últimos anos. A escola barcelense teve destaque pela primeira vez em 2011, quando conseguiu a maior subida nacional, passando da 599.ª posição para a 65.ª. Depois de uma quebra em 2014 (desceu ao lugar número 245), repete em dois anos seguidos uma posição no "top 100".

“Temos feito um trabalho ao longo dos últimos dez anos cujos resultados estão a aparecer”, considera o director, Alberto Rodrigues. Vila Cova fica numa zona rural no Oeste do concelho de Barcelos, a meio caminho de Esposende. Dois terços dos alunos são apoiados pela Acção Social Escolar. Ainda assim, nos últimos quatro anos, os resultados têm estado sempre acima do esperado para o seu contexto socioeconómico. A nível de qualificações, a realidade não é muito diferente. A escolaridade média dos pais dos alunos desta escola é de 6,7 anos. A das mães um pouco mais alta: 7,4. 

Alunos “focados” sem distracções

Quando, há 16 anos, Rodrigues assumiu a direcção do estabelecimento de ensino, encontrou os problemas mais graves no Português, com resultados que ficavam muito abaixo da média nacional. Foi nessa disciplina que se concentraram as principais estratégias de mudança da escola de Barcelos. Desde então, fez-se um investimento na reformulação e apetrechamento da biblioteca, foi definida uma política de empréstimos domiciliários de livros, bem como de promoção da leitura digital, com a compra de e-readers. O objectivo era induzir hábitos de leitura numa comunidade em que “os alunos não estavam habituados a ver os pais com um livro à cabeceira, ou ver pais a ler revistas e jornais”.

A estratégia “está a dar os seus frutos”, sustenta Alberto Rodrigues. A Português, os alunos da Escola Secundária de Vila Cova conseguiram uma média de 14,27 valores nos exames nacionais do ano passado. É o quinto melhor resultado à disciplina a nível nacional e o primeiro entre as escolas públicas (num ranking que só ordena as escolas onde pelo menos 15 alunos prestaram provas de Português): “Há dez anos, estávamos nas ruas da amargura, e agora conseguimos chegar ao topo.”

Para o director da escola de Barcelos, a subida nos rankings tradicionais e a liderança no ranking alternativo não pode ser explicada pelo apoio específico para os exames nacionais. Há apoios às principais disciplinas, com um reforço nas vésperas das provas, através da aplicação de exames de anos anteriores. “O normal noutras escolas”, refere Rodrigues, segundo o qual a escola tinha possibilidades de atribuir mais horas de apoios e não o faz. “Não fazem falta”, garante.

Alberto Rodrigues atribui, por isso, o sucesso a outros factores, como a estabilidade de um corpo docente onde só quatro dos 63 professores são contratados, ou o envolvimento da comunidade: cerca de 95% dos pais são presença assídua nas reuniões com os professores. Por último, a escola de Vila Cova tem alunos “focados”. Desta vez, o contexto joga a seu favor: “Não há um cinema ou uma rua comercial como numa cidade onde eles podem ir dar uma volta. Estão aqui é para trabalhar.”

Veja as listas ordenadas das escolas

Sugerir correcção
Comentar