Demolições na ria Formosa são para avançar... em versão reduzida

Os novos gestores da Sociedade Polis da ria Formosa deveriam entrar esta quinta-feira em funções, mas a assembleia-geral que iria aprovar os nomes do conselho de administração ainda não tem data marcada para se realizar.

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Um dos objectivos era renaturalizar zonas ameaçadas pelo mar, o que obriga ao derrube de casas Rui Gaudêncio

Continuar o programa das demolições ou parar? O desafio foi lançado ao Governo pelos autarcas e proprietários das casas de veraneio. Numa primeira fase, o ministro do Ambiente cedeu, ou pelo menos, adiou as acções. Mas garante que o programa vai continuar, embora em versão reduzida. Estas decisões levaram à demissão de  Sebastião Teixeira e João Alves à frente da Sociedade Polis da Ria Formosa, que agora vai ter nova administração. O accionista Estado indicou José Pacheco, técnico da Comissão de Coordenação e Desenvolvimento Regional (CCDR/Algarve) e o advogado, Rogério Gomes para os substituíram uma vez que a anterior gestão cessa funções nesta quarta-feira. Porém, a tomada de posse dos novos dirigentes está dependente da realização de uma Assembleia-Geral que ainda não tem nada marcada para se realizar.

Há cerca de um mês, o ministro Pedro Matos Fernandes, pressionado pelo PS/Algarve e presidentes de câmara, mandou suspender o programa que previa a demolição de 360 casas nas ilha-barreira. O governante considerou que deveria “reanalisar caso a caso” a lista dos clandestinos, admitindo depois que o derrube das habitações poderia cair para menos um terço do previsto – 105 edificações. Os dirigentes da Polis, Sebastião Teixeira e João Alves, consideraram-se “desautorizados” pela tutela, argumentando que até os tribunais já tinham dado o seu aval a um processo que se arrastava há anos. Passados dois ou três dias, pediram a demissão. A renúncia ao cargo foi aceite, com a obrigação de continuarem em funções até final do mês de Novembro.

Agora vem aí um novo ciclo: o presidente da Mesa da Assembleia-Geral da Polis, João Guerreiro, disse ao PÚBLICO ainda não ter tido conhecimento dos nomes dos novos gestores indicados pelo ministério do Ambiente, embora seja este organismo que tem de ratificar a decisão do Governo. “A reunião da assembleia será convocada sem demoras, mas há prazos legais a cumprir”, advertiu.

Com a nova equipa, como ficarão as demolições? Para o presidente da Comunidade Intermunicipal do Algarve (Amal), Jorge Botelho, PS, o que agora importa é o pacote dos investimentos para obras: “Estou focado nas quatro intervenções estruturantes da Polis, o resto [demolições] vamos ver”. O autarca foi, enquanto representante da Amal, o porta-voz da região junto do Ministério do Ambiente, pedindo-lhe que travasse o programa do derrube das casas previsto no Programa de Ordenamento da Orla Costeira (POOC). Os autarcas reivindicam investimentos de 12,5 milhões – uma nova ponta da ilha de Faro, a requalificação da zona ribeirinha de Olhão, um novo cais na ilha de Tavira e melhoramentos no Ancão (Loulé). Mas recusam as demolições.

Ao lado dos municípios colocou-se o grupo parlamentar do PS, aprovando uma recomendação ao Governo para que a Polis continuasse em funções de forma a garantir que os investimentos previstos fossem feitos, descartando aqueles destinados à renaturalização das zonas de risco, o que implicaria a remoção das casas clandestinas. “Os algarvios não podem pactuar com a devolução de dinheiro [do programa Polis]”, afirmou ao PÚBLICO Jorge Botelho, defendo a necessidade de não haver interrupção nos concursos para a realização das obras propostas. O cais para a ilha de Tavira, orçado em 2,4 milhões, é uma das bandeiras para as próximas eleições autárquicas

Porém, o gabinete do ministro do Ambiente, Pedro Matos Fernandes, garantiu ao PÚBLICO que o programa das demolições vai “recomeçar com a nova direcção” da Sociedade Polis da Ria Formosa em diálogo com os poderes locais.

O pedido de renúncia de Sebastião Teixeira, recorde-se, aconteceu depois do governante ter mandado parar o programa nas vésperas da tomada de posse administrativa de 68 habitações nos Hangares e Farol. O ministro justificou a suspensão invocando “respeito à Assembleia da República” que votou um conjunto de recomendações em sentido contrário à politica que estava a ser seguida. Os deputados sugeriram que os “direitos históricos” que foram concedidos às casas pertencentes a pescadores fossem alargados às habitações de veraneio.

Uma posição criticada pelos ambientalistas, que alertam para o impacto que as estruturas fixas têm nestas frágeis zonas dunares e que as incapacitam de se readaptarem naturalmente aos caprichos do mar. Um caminho aberto à erosão. De pé, defendeu na altura a associação ambientalista Almargem, “apenas deviam ficar os edifícios de carácter público, apoios de praia e casas de primeira habitação de pescadores e mariscadores”.

No ilhote do Coco (Olhão) restam quatro barracas sem água nem luz. O pescador Carlos Fernandes, com três filhos menores, é um dos sobreviventes, lutando há três anos pelo direito à primeira habitação, ainda que precária. “Finalmente, vão amanhã [hoje], entregar-me uma casa de habitação social – agora já podem deitar abaixo barraca”, desabafou.

O perigo de viver nas ilhas-barreira, alertam os ambientalistas, espreita a cada momento: “As infra-estruturas não irão resistir eternamente aos avanços do mar, muito menos a uma catástrofe de maiores dimensões”. O exemplo da Fuzeta (Olhão), em 2010, ainda está na memória de alguns. Nesse Inverno, um temporal varreu a ilha e derrubou 38 habitações, antecipando as medidas que estavam previstas no Polis. 

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