Sobretaxa de IRS só cai 8% no quarto escalão com mudança no OE

Rendimentos colectáveis entre 40 mil e 80 mil euros ainda vão pagar menos IRS no próximo ano, mas não tanto quanto o anunciado há um mês. Alteração abrange 80 mil agregados familiares.

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Um casal com dois filhos em que cada pai receba 1500 euros por mês, o IRS baixa 178,7 euros PAULO PIMENTA

Em vez de uma redução da sobretaxa de IRS para 2,25%, os contribuintes do quarto escalão vão afinal ver a sobretaxa descer apenas 0,25 pontos em relação ao que pagam este ano (de 3% para 2,75%), suportando retenção na fonte durante mais dois meses do que o anunciado pelo Governo quando apresentou a proposta de Orçamento do Estado (OE) para 2017.

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A alteração, proposta pelo PS, abrange os contribuintes com rendimentos colectáveis superiores a 40.522 até 80.640 euros por ano, os que estão no quarto escalão de rendimento, onde há cerca de 80 mil agregados familiares. É certo que a sobretaxa desce 8,3% relativamente a este ano, mas, face às expectativas criadas pelo executivo há pouco mais de um mês, a mudança implica suportar mais 22% do que o anunciado em Outubro; nessa altura previa-se que estes contribuintes vissem a sobretaxa baixar 25%.

Como a sobretaxa acaba para uns e é reduzida para outros, e ao mesmo tempo os escalões são actualizados em 0,8%, há para a generalidade dos contribuintes uma redução da factura do IRS, mostram simulações da consultora PwC para o PÚBLICO.

Veja-se o que acontece no quarto escalão, por exemplo, com um casal com dois filhos em que cada um dos pais recebe 4500 euros por mês (ou seja, têm em conjunto 126 mil euros de rendimento bruto anual). Em 2016, segundo a simulação da PwC, pagam de IRS 40.336,70 euros; no próximo ano, a factura fiscal baixa cerca de 338 euros, para 39.998,87 euros. No entanto, em Outubro como a redução da sobretaxa era maior, o ganho global no IRS era maior, porque permitia uma redução superior a 800 euros.

Já quem é do segundo escalão sai beneficiado com as alterações propostas pelo PS, porque a sobretaxa afinal acaba este ano, o que abrange cerca de um milhão e 150 mil agregados familiares. Inicialmente, o Governo previa que estes contribuintes suportassem uma sobretaxa de 0,25% no próximo ano.

Se um casal com dois filhos e cada um dos pais receber 1500 euros por mês (em conjunto, 42 mil euros brutos anuais), estes contribuintes já deixarão de pagar a sobretaxa, quando este ano pagam 163 euros. No global do IRS, e porque os escalões são actualizados, o ganho fica nos 178,7 euros (em vez de pagarem 6623,94 euros de IRS, pagam 6445,24).

No caso de um solteiro com um filho que receba 1500 euros por mês, o imposto a pagar este ano é de 3311,97 euros; para o próximo ano tem uma redução de 89,35 euros, sendo 81,51 decorrentes do fim da sobretaxa.

Já se os rendimentos brutos de um casal, também com dois filhos, forem de 3000 euros (em conjunto, 84 mil brutos por ano) nada muda em relação ao que estava anunciado em Outubro. A sobretaxa desce e, com a actualização dos escalões, há uma redução de 564,34 euros no IRS a pagar no próximo ano (o imposto final passa de 22.096,50 euros este ano para 21.532,16).

Para quem está no primeiro e segundo escalão não pagará sobretaxa (o primeiro escalão já não pagava). Quem está no terceiro tem retenção até final de Junho; e quem está no quarto ou no quinto escalão retém imposto até Novembro.

Como a retenção na fonte não dura o ano todo, a taxa que se aplica no momento de “descontar” o imposto no salário mensal é superior à taxa que se aplica sobre todo o rendimento auferido em 2017 (porque a lógica do IRS é anual). Na fonte, a retenção será igual às taxas deste ano, o que significa que, nos meses em que fazem retenção, quem está no terceiro, quarto e quinto escalão nada muda. Para quem está no terceiro escalão, serão retidos 1,75% durante os primeiros seis meses do ano, até 30 de Junho (no resto do ano já não há retenção, por isso a taxa “real” sobre o rendimento anual é de 0,88%).

No quarto escalão, a retenção é de 3% até 30 de Novembro (sendo a taxa aplicada para todo o ano de 2,75%); no último patamar de rendimentos, a retenção continua a ser de 3,5% e também se estende até ao final do mês de Novembro (o que já se sabia), sendo a taxa anual 3,21% porque no último mês já não haverá retenção.

Alterações “neutras”

O Governo diz que as mudanças feitas em relação ao desenho inicial da medida são neutras. Nesta segunda-feira, no final de uma conferência na Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais referiu que as alterações na proposta de redução da sobretaxa de IRS foram feitas sem alterar o nível da receita prevista em relação ao desenho previsto na proposta inicial do Orçamento do Estado de 2017 (há perda de 200 milhões de euros face a 2016). "A alteração que se faz é neutra: aí não há nenhuma alteração na receita fiscal prevista total”, garantiu Fernando Rocha Andrade aos jornalistas.

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Questionado pelo PÚBLICO sobre com há este equilíbrio, o Ministério das Finanças fez saber que a receita “que se perde no segundo escalão é de cerca de 15 milhões de euros, que é aproximadamente a que se ganha no quarto escalão com o prolongamento das retenções na fonte”. Isto porque “estava prevista para o segundo escalão uma retenção a 1% durante três meses, que desaparece; é alargada a retenção na fonte do quarto escalão, que é feita a 3%, mais dois meses”.

Os dados anteriores sobre a arrecadação da receita da sobretaxa, relativos a 2014, só permitem ver qual é o peso de cada escalão tendo em conta que nessa altura a sobretaxa era igual para todos (3,5%). O retrato é incompleto, mas ajuda a enquadrar a leitura: o primeiro escalão assegurava 12% da receita da sobretaxa; o segundo escalão valia 38,5%; o terceiro garantia 32%; o quarto 13% e o quinto 4%.

O desagravamento no IRS, justificou Rocha Andrade na conferência, é feito ao ritmo que “a necessidade de cumprimento de objectivos de consolidação orçamental permite”.

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