Há outra maneira de procurar África no Google

Teddy Goitom apresenta no Fórum do Futuro a sua Afripedia, um portal disposto a congregar os artistas africanos e a dar-lhes uma visibilidade internacional sem mediações estereotipadas.

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Serge Attukwei Clottey, artista plástico ganês STOCKTOWN FILMS
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Cyrus Kabiru, escultor queniano STOCKTOWN FILMS
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Titica, a estrela transexual do kuduro angolano STOCKTOWN FILMS
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A dupla de músicos e produtores Gazelle, da África do Sul STOCKTOWN FILMS
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O fotógrafo senegalês Omar Victor Diop OMAR VICTOR DIOP

Com raízes na Etiópia e na Eritreia, mas nascido em Jerusalém e educado na Suécia, o realizador Teddy Goitom, fundador da produtora de documentários Stocktown, apresenta esta sexta-feira à tarde no Porto, onde participa no Fórum do Futuro, o seu mais recente projecto: a Afripedia, uma plataforma visual que está ainda em fase de lançamento, mas que quer mostrar ao mundo os mais estimulantes criadores africanos contemporâneos, rompendo com as imagens estereotipadas do continente e da arte africana.

Goitom fala às 19h no Auditório Isabel Alves Costa do Teatro Rivoli – a sessão será moderada por José Capela e Vânia Rodrigues, da companhia mala voadora (ver caixa) – e o título da sua palestra é Afripedia: do gueto para a aldeia global. No entanto, o objectivo da plataforma que criou não é apenas o de dar visibilidade no circuito internacional a artistas africanos pouco conhecidos, mas também o de reduzir o grande desconhecimento mútuo que persiste entre as várias cenas artísticas do continente.

Teddy Goitom e os dois realizadores que trabalham consigo na Stocktown, Senay Behre e Bejamin Taft, começaram a pensar naquilo que viria a ser a Afripedia já em 2009, contou Goitom ao PÚBLICO: “Falávamos muito do tipo de imagens de África que estávamos a ver todos os dias, através dos media, e queríamos ajudar a mudar essa narrativa." Começaram por uma série de documentários de meia hora cada um, dedicados a jovens criadores que vivem em algumas das principais cidades do continente e que, diz Goitom, “estão a definir a música, a arte, a cultura contemporânea em África”.

Até agora realizaram cinco filmes – os trailers estão já disponíveis na Afripedia –, que os levaram ao Gana, onde encontraram os bidões de plástico de Serge Attukwei Clottey, ao Senegal onde Omar Victor Diop quer reinventar a fotografia de estúdio, à África do Sul da dupla de músicos e produtores Gazelle e ao Quénia de Cyrus Kabiru. E também a Angola, onde filmaram Titica, a estrela transsexual do kuduro, o produtor e músico MC Sacerdote, e o polivalente Nástio Mosquito, cuja obra associa performance e poesia, cinema e música, instalações e arte digital. Tal como existe neste momento, a plataforma mostra um pequeno filme sobre cada cena artística, e remete para as páginas pessoais de cada um dos criadores.  

Goitom assume que um dos objectivos principais da Afripedia é funcionar como ponto de encontro de artistas africanos, quer vivam no continente, quer façam parte da vasta diáspora africana. “Quando estivemos no Gana, mostrámos o que tínhamos filmado na África do Sul e os criadores ganeses só nos perguntavam: ‘Quem são estes artistas, como é que podemos contactar com eles?’”, conta. “Isto não é só para mostrar a arte africana ao mundo ocidental”, acrescenta, “é para os artistas africanos verem que há gente que está a fazer coisas semelhantes e que eles não conhecem, para se encontrarem e colaborarem”.

De resto, o próprio conceito de arte africana lhe parece equívoco, no sentido em que uniformiza uma realidade altamente diversificada. “É um rótulo usado por quem organiza exposições, mas acho que muitos artistas não gostam de ser rotulados como artistas africanos ou ver a sua identificada como arte africana”, diz. E foi por isso mesmo que optou por dedicar um documentário autónomo a cada país, embora não deixe de observar que “quanto maior for a visibilidade destes artistas, mais fácil é sermos específicos”.  

Outro assumido propósito da Afripedia é vir a funcionar como uma agência de emprego informal. “Gostaríamos que estes artistas pudessem ser contratados através da plataforma, porque se queremos quebrar os estereótipos, também é preciso trazer estas pessoas para as indústrias criativas, onde podem ajudar a romper com o preconceito”, explica Teddy Goitom. E nos próprios filmes que ele e os seus parceiros realizaram há momentos que mostram como o preconceito persiste nas mais insuspeitadas formas. Num segmento do documentário sobre o Quénia, um artista conta aos realizadores que uma mulher queria comprar as suas obras, mas que colocava como condição que ele lhe contasse a sua (presumivelmente difícil e comovente) história pessoal. Uma exigência que o artista recusou, tendo dito à potencial cliente que se ela vinha comprar histórias, ele não as vendia.

Na Stocktown, Teddy Goitom e os seus parceiros gerem ainda uma plataforma de vídeo, onde qualquer um pode comentar clips que viu no YouTube, mas na qual participam também vários curadores, que são convidados a divulgar e debater vídeos que achem particularmente interessantes. Foi através da rede de contactos proporcionada por esta plataforma que chegaram a muitos dos artistas hoje representados na Afripedia.

Os documentários da série já foram exibidos em alguns festivais, e um canal sueco pagou para os mostrar, mas é a pequena equipa da Stocktown que financia a sua produção, o que a obriga a encontrar parceiros locais ou a aproveitar oportunidades, como aconteceu com o filme que mostra a actual cena artística da África do Sul, pago com o dinheiro que Benjamin Taft ganhou a filmar um anúncio para a empresa Puma.

Neste momento, Goitom e Senay Behre estão em Nova Iorque, como convidados do programa de incubação de projectos culturais New Museum, New Inc., a tentar desenhar as soluções mais eficazes para assegurar que a Afripedia seja sustentável no futuro próximo.

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