“Joãozinho” tenta fazer negócio com o Continente com terrenos que são do Estado

Presidente da associação acorda ceder à cadeia comercial por 50 anos um terreno que é público e com isso financiar as obras da nova ala pediátrica.

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PAULO PIMENTA / PUBLICO

A Associação “Um Lugar para o Joãozinho” quer ceder ao Continente Hipermercados, S.A., pelo prazo de 50 anos, um terreno que é do Estado que seria destinado à construção de um supermercado. Em contrapartida, a empresa iria financiar as obras da nova ala pediátrica do Hospital de S. João, no Porto, orçadas em 20 milhões de euros. Mas esta cedência não tem enquadramento legal nem contratual, segundo garantiu ao PÚBLICO um especialista em contratos públicos e professor em Direito Administrativo.

Situado no perímetro do Hospital de S. João, o terreno em causa tem 7116,40 metros quadros e fica próximo da ala pediátrica.

A Câmara do Porto garantiu esta sexta-feira que não deu entrada nenhum projecto de licenciamento e, dificilmente, o projecto será viabilizado porque – alega autarquia - a obra a construir nada tem a ver com a actividade do hospital.

O Jornal de Notícias avançou na edição desta sexta-feira que a construção da nova ala pediátrica financiada pelo Continente em troca da construção de um supermercado no mesmo terreno do hospital recebeu um parecer jurídico negativo e deverá cair por terra.

O economista Pedro Arroja, que preside à associação, “não dá importância” ao parecer e garante que tem uma reunião na quinta-feira com o sectário de Estado da Saúde, Manuel Delgado, para discutir o assunto. Esta sexta-feira, o ministro da Saúde, Adalberto Campos Fernandes, falou sobre o “Joãozinho” para dizer que se trata de “um problema que tem de se resolver". “Estamos perante um problema que nos antecede, que antecede esta administração e que é da maior complexidade", disse o governante, furtando-se a responder se o Governo estaria disponível para suportar financeiramente a construção daquele equipamento hospitalar.

O antigo secretário de Estado da Saúde, Manuel Pizarro, entende que “é preciso encontrar uma solução para o ‘Joãozinho’”, mas sublinha que o problema “só se resolverá com dinheiros públicos”. “Na prática o ‘Joãozinho’  ainda não saiu do papel pelo que o que é necessário é fazer o trabalho para resolver o problema das condições da Pediatria do Hospital de S. João”, que funcionam há vários anos pré-fabricados, afirmou Manuel Pizarro.

Ao PÚBLICO, o antigo governante e actual vereador na Câmara do Porto lamenta que ao fim de “tantos anos – o projecto do ‘Joãozinho’ nasceu em 2009 - a ala pediátrica ainda não esteja construída” e que “só tenham sido angariados 700 mil euros”.

A Associação e o Continente chegaram a um acordo em Setembro e a administração do Hospital de S. João foi informada de que o terreno seria cedido para financiar a construção da ala pediátrica. O presidente do CA, António Oliveira e Silva, decidiu solicitar um parecer à Sociedade de Advogados Cuatrecasas, Gonçalves Pereira, que alertou para a falta de enquadramento legal.

O PÚBLICO falou com uma fonte da Sociedade de Advogados que precisou não se tratar de um parecer jurídico, mas sim de uma “apreciação preliminar”, uma vez que não foram analisados os detalhes do negócio, pelo que o acordo feito aquando do lançamento da ala pediátrica, celebrado com a anterior administração, presidida por António Ferreira, se mantem em vigor. Esclarece que o terreno em causa foi cedido à associação pelo prazo de três anos pelo que não pode agora ser cedido por um prazo de 50 . “Trata-se de um terreno que é público e o negócio que a associação pretende fazer com o Continente não tem base contratual e legal. Nestes termos, o Estado não tem qualquer forma de interferir no negócio da cedência de um terreno que é público”, esclareceu a fonte, que pediu para não ser citada.

Pedro Arroja diz que abordagem à cadeia Continente foi feita ao abrigo do mecenato realizado entre associação e o hospital. Desta forma, a associação cede o terreno ao Continente e este compromete-se a contribuir com 300 mil euros/ano para a associação, durante 50 anos, num total de 15 milhões de euros.

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