Transparência e Integridade critica “relativismo ético” dos políticos

Luís de Sousa, presidente da TIAC, defendeu na comissão da transparência exclusividade dos deputados e divulgação pública das agendas dos políticos.

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O presidente da TIAC, Luís de Sousa, defende regras mais apertadas PEDRO CUNHA / PUBLICO

“Portugal é um país onde as pessoas optam por fazer mais do que a lei permite e menos do que a ética exige, e os políticos não são excepção. Muitos dos casos de conflito de interesses [entre actividades privadas e cargos públicos] são reveladoras deste relativismo ético e não tem sido levado à séria por quem devia dar o exemplo. Sempre que a ética falha, recorre-se à lei”.

Foi assim que o presidente da Transparência e Integridade Associação Cívica (TIAC), Luís de Sousa, arrancou esta terça-feira a sua intervenção na Comissão Eventual para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções Públicas, para comentar o pacote legislativo em preparação, que passa pela regulamentação do lobbying, o aperto da malha das incompatibilidades e o reforço do controlo das declarações de interesses e do património dos políticos .

Luís de Sousa considerou positivo haver espaço para o consenso entre os partidos, mas deixou o seu receio que o processo legislativo em curso “não altere os problemas de fundo”. “As leis são sobretudo reactivas e legisla-se desenfreadamente”, comentou o investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, criticando a falta de uma “visão holística do problema” e a tendência para legislar “sem fazer estudos prévios”.

A nível da regulamentação do lobbying, proposta até agora apenas pelo CDS, o dirigente da TIAC considerou que a existência de um registo prévio dos representantes de interesses não é suficiente, defendendo que seja adoptada a pegada legislativa – que permite perceber quem influenciou a lei e em que medida – e a divulgação pública das agendas dos decisores e dos legisladores.

São pesos-pesados os deputados da Comissão Eventual para o Reforço da Transparência no Exercício de Funções Públicas, presidida pelo social-democrata Fernando Negrão: Luís Marques Guedes e Carlos Abreu Amorim pelo PSD, Pedro Delgado Alves e Jorge Lacão pelo PS, Pedro Filipe Soares e José Manuel Pureza representam o Bloco de Esquerda, António Carlos Monteiro e Vânia Dias da Silva em nome do CDS-PP e Jorge Machado pelo PCP (ausente nesta audição).

Marques Guedes defendeu que, em matéria de representação de interesses (lobbying), a Assembleia da República deve “olhar para as boas práticas no plano europeu e tentar fazer uma legislação que inicie a construção de um edifício a partir dos alicerces, para depois, numa lógica incremental, ir aprofundando a legislação nos anos seguintes”. Uma lógica que Luís de Sousa não incentivou: "Já que estão a ter o trabalho, devem fazê-lo de forma mais abrangente". 

Pedro Delgado Alves considerou que o registo dos lobistas deve ser desde já obrigatório – como vai agora passar a ser nas instâncias europeias -, e defendeu que a regulamentação deve deixar muito claro tanto o conceito de lobbying como os deveres dos seus profissionais. Reconhecendo que uma das zonas mais cinzentas é a actuação dos deputados advogados, que podem ter clientes com interesses nas matérias sobre as quais fazem as leis, o socialista defendeu para a criação de códigos de conduta para deputados, como "mecanismo soft law com depósito de valorações que pode ser escrutinada pelo cidadão".

Pelo CDS, Vânia Dias da Silva afirmou que a proposta do partido – a única até agora apresentada sobre o tema – é “propositadamente aberta para se chegar a consenso”,  e que, embora preveja o registo obrigatório, não propõe nenhuma sanção por ter dúvidas sobre o interesse destas. Assim como não propõe a pegada legislativa nem a divulgação pública das agendas dos políticos, em que a TIAC insiste.

Sobre a questão das incompatibilidades e impedimentos  dos políticos, em especial dos deputados, Luís de Sousa apontou a diversidade de posições – cada partido tem uma proposta diferente – e estranhou o facto de o BE ter uma proposta sobre exclusividade e outra sobre incompatibilidades.

Pedro Filipe Soares, líder da bancada bloquista, explicou que essa é a posição “de princípio” do partido, mas que apresentou um projecto “dentro do paradigma”, na medida em que percebe que a exclusividade não será aceite pelas restantes bancadas. “A solução óptima é a exclusividade e tudo o que não for isso é andar a correr atrás da imagem de transparência, de alguma falha sempre presente que não se consegue colmatar”, defendeu.

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