Hollande só queria falar da Síria, Putin decidiu cancelar visita a Paris

Relações entre ocidentais e Moscovo continuam a deteriorar-se por causa da guerra. “O diálogo com a Rússia é necessário, mas deve ser firme e franco”, afirmou o Presidente francês.

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Putin e Hollande na cimeira do G20, em 2013, em São Petersburgo Eric Feferberg/AFP

O Presidente russo, Vladimir Putin, cancelou a visita agendada para a próxima semana a Paris, recusando as condições que o homólogo francês, François Hollande, apresentou para que pudessem encontrar-se. A decisão confirma o azedar das relações entre os dois países depois de a Rússia ter vetado uma resolução apresentada pela França a exigir a reposição do cessar-fogo em Alepo.

A visita de Putin, anunciada pelo embaixador russo ainda na Primavera, era privada e teria como ponto alto a inauguração de um “centro espiritual e cultural”, um imponente edifício nas margens do Sena que inclui uma catedral ortodoxa. Só que a deslocação, prevista para o próximo dia 19, criou um dilema às autoridades francesas, que não queriam ser vistas a receber com grandes honras Putin na mesma altura em que a aviação russa bombardeia sem tréguas Alepo, mas resistiam também a arriscar o futuro das relações com um importante “parceiro” internacional.

Um embaraço que o próprio Hollande reconheceu numa entrevista segunda-feira à televisão TMC, ao admitir que não sabia ainda se receberia o homólogo russo. “Será que é útil? Será que é necessário?” O chefe da diplomacia francesa, Jean-Marc Ayrault, foi mais longe, afirmando que se o Presidente viesse a receber Putin “não seria para mundanidades, mas para lhe dizer umas verdades”.

As dúvidas foram desfeitas nesta segunda-feira. “Houve contactos entre o Kremlin e o Eliseu esta manhã para informar que seria possível uma reunião de trabalho sobre a Síria”, mas excluindo qualquer outro tema ou encontro, adiantou às agências internacionais uma fonte da presidência francesa. “Em resposta a esta proposta, a Rússia indicou que quer adiar a visita”.

Pouco depois, o Kremlin revelava que Putin tinha “decidido anular” a deslocação, mas estava disponível para “visitar Paris quando o Presidente Hollande se sentir confortável” para o receber. Hollande respondeu que “está disponível a qualquer momento” para se encontrar com o homólogo russo, mas só se isso servir para “fazer avançar a paz”, nomeadamente na Síria. “O diálogo com a Rússia é necessário, mas deve ser firme e franco”, acrescentou, em resposta às críticas da oposição de direita, que não via razões para a desconsideração a Putin.

O fosso que separa os russos dos ocidentais na guerra da Síria aumentou ainda mais no sábado com o veto de Moscovo à resolução apresentada por Paris, e apoiada por 11 dos 15 membros do Conselho de Segurança, em que se exigia o fim dos bombardeamentos aéreos russos e sírios contra aquela que já foi a segunda maior cidade do país e onde agora 250 mil pessoas vivem sob cerco.

Depois disso, a diplomacia francesa insiste que os ataques contra as áreas controladas pelos rebeldes constituem crimes de guerra, sugerindo que os responsáveis devem prestar contas perante a justiça internacional – uma hipótese inverosímil já que nem a Rússia nem a Síria são signatárias do tratado que institui o Tribunal Penal Internacional, pelo que as atrocidades cometidas no conflito só ali poderiam ser julgadas mediante decisão do Conselho de Segurança, onde Moscovo detém poder de veto. 

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