Georgieva apresenta-se como a gestora que chegou fora do tempo

A principal adversária de António Guterres à liderança das Nações Unidas dirigiu-se à Assembleia Geral da ONU. À imagem de tecnocrata, a ex-comissária europeia quis juntar uma face mais humana.

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Brendan McDermid / Reuters

Foi uma imagem de uma boa gestora, que consegue “fazer coisas acontecer” e com um currículo rico em conseguir ultrapassar divisões que Kristalina Georgieva se apresentou esta segunda-feira à Assembleia Geral das Nações Unidas. Da crise dos refugiados às mudanças climáticas, a vice-presidente da Comissão Europeia teve de defender os méritos da sua candidatura.

A búlgara de 63 anos reconheceu que a sua entrada na corrida para o cargo de secretário-geral da ONU é “tardia”. “Teria preferido ter entrado mais cedo, especialmente uma vez que a transparência e a abertura definiram a minha carreira”, disse Georgieva durante a sua declaração inicial. A entrada da comissária europeia no processo de eleição do sucessor de Ban Ki-moon está envolta em polémica. Apesar de ser um nome que vinha sendo sugerido há já algum tempo, Georgieva avançou apenas na semana passada, numa altura em que os restantes candidatos tinham já passado por apresentações públicas, debates e cinco rondas de votações informais.

A Assembleia Geral da ONU decidiu este ano modificar o processo de selecção do secretário-geral – normalmente muito criticado por se resumir a uma negociação à porta fechada entre os membros permanentes do Conselho de Segurança – numa tentativa de o tornar mais transparente. Até agora, o ex-primeiro-ministro português, António Guterres, recolheu o maior número de votos de encorajamento e é visto como o candidato mais bem posicionado.

Perante os embaixadores dos países membros da ONU, Georgieva quis sublinhar a sua experiência em cargos diversos em instituições como o Banco Mundial e a Comissão Europeia como prova de que está bem preparada para fazer pontes entre posições divergentes. “Seja em termos de gestão ou a integrar sectores diferentes consegui levar a cabo reformas diversas que tornaram as organizações mais vibrantes”, garantiu. Ao longo da sessão, a candidata búlgara expressou-se maioritariamente em inglês, mas fez questão em dizer algumas frases em francês e russo – com o objectivo claro de reforçar o seu potencial de unir vários blocos regionais.

Vestindo a pele de gestora, Georgieva avisou que pretende trabalhar para melhorar a gestão do financiamento das agências da ONU e prometeu trazer soluções novas neste âmbito. Dando o exemplo do desenvolvimento sustentável, a ex-vice-presidente do Banco Mundial descreveu-se como uma “campeã” a encontrar financiamento para estas iniciativas e disse ter o objectivo de “trazer o sector privado a bordo”. Os reparos da candidata ao funcionamento interno da ONU surgem na sequência das fortes críticas deixadas pelo Wall Street Journal à gestão de Guterres enquanto esteve à frente do Alto-Comissariado da ONU para os Refugiados. 

Porém, Georgieva teve o cuidado de não se deixar dominar pela imagem de uma tecnocrata mais focada em orçamentos do que em pessoas. Quando lhe perguntaram qual o cargo que mais impacto teve na sua formação pessoal, a resposta recaiu no papel como comissária para a Ajuda Humanitária – que desempenhou entre 2010 e 2014 – que disse ter feito dela uma “pessoa melhor”. “O nosso problema é que a bondade é silenciosa, mas o ódio é barulhento. O meu trabalho seria amplificar esta voz da bondade”, afirmou Georgieva.

A corrida à liderança da ONU está marcada pelo desejo expresso por vários líderes mundiais, incluindo o actual secretário-geral, Ban Ki-moon, de que o cargo seja liderado por uma mulher. Georgieva espera que isso jogue a seu favor e prometeu aumentar a quantidade de mulheres nos cargos das Nações Unidas. Outro dos requisitos informais que têm sido avançados é o de que o próximo secretário-geral deve vir de um país do antigo bloco soviético – o único grupo regional que nunca teve um secretário-geral. Georgieva não escondeu que este critério também lhe é caro. “Todas as nações devem olhar para o topo e ver-se representadas”, afirmou.

Esta quarta-feira, os 15 membros do Conselho de Segurança vão reunir-se para a primeira ronda de votações oficiais, em que serão conhecidas as preferências de cada país. Apesar de poder ser reversível, um voto de desencorajamento de um dos membros com assento permanente (EUA, Rússia, França, Reino Unido e China) poderá pôr um ponto final a uma candidatura. 

 

 

 

 

 

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