Parlamento aprova voto de repúdio minimalista do PCP contra sanções

Comunistas rejeitam a ingerência comunitária na política nacional. Sociais-democratas argumentam que o país fez todos os esforços possíveis.

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Dois dos pontos propostos pelo PCP no voto de repúdio foram chumbados Daniel Rocha/Arquivos

Foi um voto de repúdio minimalista contra eventuais sanções de Bruxelas, que passam pela cativação dos fundos europeus, aquele que o PCP acabou por conseguir fazer aprovar esta sexta-feira de manhã na Assembleia da República.

O caso incluiu um pequeno diferendo com o PSD, cuja bancada entregou também um voto de repúdio mas que não foi aceite para discussão por causa da oposição dos comunistas. A proposta devia ter sido entregue na Mesa até ao final do plenário de ontem para poder ser discutida esta sexta-feira e não durante a manhã de hoje, argumentou o PCP agarrando-se ao regimento da Assembleia, enquanto todos os outros grupos parlamentares até admitiam a discussão.

Os comunistas viram o seu voto reduzido a apenas um dos pontos com o chumbo dos outros dois, em que a Assembleia expressa “protesto e repúdio pelas pressões que, sob a forma de ameaça de sanções, visam o condicionamento do debate político e das decisões que só ao povo português e aos órgãos de soberania nacional cabe tomar”. O texto recebeu o voto contra do PSD, a abstenção do CDS e a favor dos restantes grupos parlamentares.

Da proposta do PCP foram, no entanto, chumbados os dois pontos em que se considerava a suspensão dos fundos uma “forma de ingerência contrária ao interesse nacional” – porque o PS se juntou ao CDS na abstenção -, e se recusavam o Tratado Orçamental, os diplomas da governação económica e o processo do semestre europeu. Nesta última o PS votou contra, ao lado do PSD e do CDS, e o PAN absteve-se.

Já em Junho, a direita e a esquerda não se conseguiram entender na elaboração de um texto único sobre a rejeição e condenação das sanções a Portugal e o Parlamento acabou por aprovar dois votos Na altura, porém, ainda não estava decidida a multa zero, que só foi anunciada no fim de Julho e que veio acompanhada pelo aviso sobre a cativação dos fundos estruturais.

O pequeno debate que antecedeu a votação foi aceso. O PSD lamentou o adiamento do seu documento que não permitiu “enriquecer” a discussão, defendeu que as sanções são “injustas e injustificadas” mas que agora cabe ao Governo cumprir os objectivos a que se propôs para garantir que não haverá, de facto, sanções. Considerando que o texto do PCP mostra o “habitual ressentimento e hostilidade contra a Europa”, Miguel Morgado atacou com uma “contradição fatal” dos comunistas. “O PCP é livre de defender a saída da UE, mas deve ter coragem de ser consequente: se Portugal não deve estar na União, porque deve receber fundos europeus?”

O centrista Pedro Mota Soares repetiu os argumentos do PSD e culpou o PCP por em Junho ter quebrado a unanimidade no voto de repúdio e assim “enfraquecer a posição do Estado português” em Bruxelas. “O PCP é contra a UE, a pertença de Portugal ao euro e portanto contra que Portugal receba fundos comunitários (…) É o PCP que tem de ser desmascarados neste debate.” O deputado disse ainda que os comunistas apresentam este voto agora para justificarem perante o seu eleitorado que “qualquer medida negativa deste orçamento não é uma medida sua mas obrigada por Bruxelas”

A acusação de “discurso duplo” foi também usada por João Oliveira na réplica, acusando o PSD e o CDS de fazerem “jogo duplo com o discurso pela não aplicação de sanções e ao mesmo tempo esfregam as mãos e torcem para que sejam aplicadas, e outro ainda ao protestarem contra elas mas serem a favor do quadro [legal comunitário] que permite estas sanções”. O líder parlamentar comunista admitiu “não ter ilusões” sobre o que pensa a maioria do hemiciclo sobre o processo de construção europeia mas prometeu que o PCP continuará a bater-se pelo fim dos constrangimentos europeus.

O bloquista Pedro Filipe Soares defendeu que os fundos “não são uma esmola” nem uma “recompensa por nos ajoelharmos” perante Bruxelas. E acrescentou que as sanções são a forma como a UE “tenta colocar o pé em cima de um país pensando que é a direita que ainda está no poder”. O deputado Hugo Costa realçou que o PS “é e foi sempre um partido da construção europeia” mas recusa-se a ter uma “visão acrítica”. E atirou as culpas para o PSD e CDS, que estavam no poder entre 2013 e 2015, o período a que se referem as eventuais sanções do procedimento por défice excessivo.

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