Novo mapa mostra a Via Láctea com um detalhe inédito

Primeiro pacote de informação obtida pelo telescópio espacial Gaia fica disponível para todos os astrónomos do mundo.

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O mapa baseado na informação obtida pelo Gaia ESA/AFP

Mil dias após o seu lançamento, o telescópio espacial europeu Gaia revelou nesta quarta-feira um pacote de dados que permite construir um mapa da nossa galáxia com um grau inédito de pormenores.

O Gaia foi lançado a 19 de Dezembro de 2013. Desde então, escrutinou toda a Via Láctea, com os seus 100.000 anos de diâmetro (o que significa que a luz, para atravessar a galáxia de um lado ao outro demora 100.000 anos). A cada dia, obteve informação sobre 60 milhões de estrelas. Por isso, identificou até agora 1000 milhões de estrelas, segunda a Agência Espacial Europeia.

Este é um recorde em termos de recenseamento, apesar do número representar menos de 1% das estrelas contidas na Via Láctea, que deverá ter entre 100 e 200 mil milhões de estrelas. “Abre-se uma nova página na astronomia”, disse François Mignard, director do Centro Nacional de Investigação Científica (CNIC) da França e membro da equipa científica do Gaia. “Ao longo dos séculos, andámos a investigar o céu todos os dias, mas nunca o fizemos com esta profundidade, com esta precisão. É um trabalho monstruoso.”

Além de uma simples observação que permite fazer uma cartografia do espaço, os dados produzidos pelo Gaia irão permitir aos astrónomos calcular a distância entre a Terra e as outras estrelas. A medição das distâncias tem um papel central na astronomia. São os dados mais importantes, mas são também os mais difíceis de obter porque é necessário observar o movimento das estrelas durante 14 meses.

Para a maioria das estrelas da Via Láctea, conhecemos a sua direcção mas não a distância que separa cada estrela da Terra. Só as medições da distância é que permitem situar como deve de ser cada estrela no espaço.

Na quarta-feira, ficou-se com “a distância e o movimento de dois milhões de estrelas” da Via Láctea. Um número 20 vezes superior do que o que o conhecido anteriormente, explica François Mignard. “E de uma só vez!”

Atrás do Gaia e da Agência Espacial Europeia, 450 investigadores trataram os dados obtidos pelo telescópio e traduziram-nos para posições, velocidades, brilho e cor. “O volume de dados a tratar não tem igual”, segundo o CNIC. Os dados estão, desde quarta-feira, à disposição de todos os astrónomos do mundo.

Entre os investigadores está uma equipa de astrónomos portugueses da Universidade de Lisboa, Universidade Nova de Lisboa, Universidade do Porto e Universidade de Coimbra. A equipa foi coordenada por André Moitinho de Almeida da Faculdade de Ciências da Universidade de Lisboa.

Planetas também, mas não para já

“O Gaia vai revolucionar aquilo que sabemos sobre as estrelas da galáxia”, disse David Hogg, um astrónomo da Universidade de Nova Iorque citado pela revista britânica Nature. “Os estudos publicados com base nestes dados serão, muito provavelmente, em quantidades consideráveis, na casa das centenas”, disse por sua vez François Mignard.

O Gaia vai permitir também descobrir os planetas, mas não para já, sublinham os cientistas. “Aposto que a missão irá revelar milhares de novos mundos”, insistiu Gregory Laughlin, um astrónomo da Universidade de Yale, nos Estados Unidos. “Mas não antes de 2018, ou mesmo antes do fim da missão em 2020”, notou François Mignard.

As observações do Gaia vão também permitir aprender bastante sobre a matéria escura da nossa galáxia, um dos maiores enigmas do Universo e um dos objectivos científicos da missão.

O telescópio espacial europeu também tem olho para os asteróides. Como pode vê-los a uma distância maior do que os telescópios na Terra, o Gaia poderá alertar os observatórios astronómicos para a presença de asteróides que poderão ser uma ameaça para nós.   

Apesar do seu objectivo primário ser a observação da Via Láctea, o telescópio observa luz vinda de bastante mais longe, e recolhe informação a dez milhares de milhões de anos-luz de distância. “Na quantidade de dados enviados na quarta-feira, há 2152 quasares (objectos ultra-luminosos que emitem uma energia colossal), os objectos mais longínquos do Universo”, diz François Mignard.

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