Suspeito de triplo homicídio chegou a pedir em casamento uma das vítimas

Jovens de nacionalidade brasileira, cujos corpos foram encontrados esta sexta-feira em Cascais, estavam desaparecidas havia vários meses. Suspeito de homicídio é o namorado de uma delas, que estava grávida.

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Michelle Santana, 28 anos, e Thayane Mendes, 21 anos DR

Michele, brasileira de Minas Gerais, chegou a Portugal há cerca de oito anos, e trabalhava como empregada doméstica. No final do ano passado a irmã mais nova, de 16 anos, juntou-se a ela. As duas irmãs e uma amiga deixaram de dar notícias à família que ficou no Brasil no início de Fevereiro. Serão delas os corpos encontrados esta sexta-feira num tanque nas imediações do aeródromo de Tires, concelho de Cascais, pela Polícia Judiciária (PJ). A polícia suspeita que terão sido mortas pelo namorado de Michele.

Michele estaria grávida deste cidadão brasileiro, que trabalhou vários anos num hotel para animais em cujo tanque foram encontrados esta sexta-feira os corpos, na Quinta Monte dos Vendavais, freguesia de São Domingos de Rana.

De resto, não foi a primeira vez que a PJ se deslocou a esta quinta, em busca dos corpos das irmãs Michele e Lidiana e da amiga Thayane, de 21 anos: já ali tinha ido anteriormente, para, com o auxílio dos Bombeiros Voluntários da Parede, esvaziar alguns poços nesta e noutras propriedades em redor.

Esta sexta-feira, informações iniciais davam conta de que o namorado de Michele teria sido entretanto detido pelas autoridades brasileiras, o que não foi confirmado nem pela Polícia Federal do Brasil, contactada pelo PÚBLICO, nem pela PJ em Portugal. Sabe-se, sim, que o suspeito embarcou para aquele país escassos dias depois do desaparecimento das jovens.

As três eram procuradas desde Fevereiro, altura em que as suas famílias no Brasil estranharam a falta de notícias e resolveram alertar as autoridades. Chegaram a criar uma página no Facebook para tentarem encontrá-las.

Na origem do triplo homicídio poderá ter estado a gravidez de Michele. Segundo a mãe da jovem, Solange Santana, em declarações à estação televisiva SIC, as amigas de Michele tinham comentado que o namorado a ameaçara de morte se ela engravidasse, e que faria desaparecer o corpo. A polícia acredita que, de resto, a chegada a Portugal da ex-mulher do suspeito terá provocado no empregado do hotel para cães um estado de pânico tal que cometeu o triplo homicídio para não ver o seu novo relacionamento descoberto.

Soube pela Internet

Foi esta sexta-feira, pela Internet, que Vinicius Santana Ferreira, irmão de Michele e de Lidiana, soube que os corpos tinham sido encontrados. Ao PÚBLICO, ao telefone do Brasil, contou que a irmã mais velha, Michele, estava em Portugal havia oito anos e trabalhava como “empregada em casa de família”.

“Um dia, o namorado ligou para a minha mãe para pedir Michele em casamento e tudo e eles iam casar-se, mas houve um roubo em casa da minha irmã, roubaram-lhe os documentos”, contou Vinicius. Nunca se soube quem tinha sido o autor do roubo, o casamento acabou por não acontecer, “mas [o namorado] disse para ela ir morar com ele”.

Tudo isto aconteceu no ano passado, diz, mas Vinicius não sabe precisar a data. Certo é que Michele passou a viver com o namorado e foi na casa de ambos que recebeu a irmã mais nova, Lidiana, quando esta decidiu em Novembro vir também de Minas Gerais para Portugal. A elas juntar-se-ia depois, poucos dias antes do crime, aquela que viria a ser a terceira vítima, a namorada da irmã de Michele.

Solange Santana assegurou à SIC que o suspeito já não estava casado na altura em que a namorada engravidou: “Ele ligou-me e pediu-ma em casamento. Ela queria voltar para o Brasil”.

Vinicius conta ainda que há amigas de Michele que vivem em Portugal a afirmar que a relação entre ela e o namorado “não era muito boa, que ele a tratava como um cachorro”. Mas nos telefonemas que fazia regularmente para casa, para falar com a família, ela não falava disso.

Até que deixou de dar notícias. “Estranhámos, apresentámos queixa no dia 11” de Fevereiro. Vinicius diz que confiava mesmo que a irmã ainda ia aparecer, sã e salva. A mãe nem tanto. 

“A gente não sabe se as três estão vivas ou mortas. O companheiro de Michele relatou que as três foram para Londres, que Michele tinha largado o emprego. Mas eu não confiei nessa história porque ela me falaria, não mudaria de país sem falar e ainda um amigo chegou a dizer que eles tinham um relacionamento explosivo”, declarava há cinco meses numa entrevista publicada pelo portal de notícias da rede Globo.

A Polícia Federal do Brasil limitou-se a esclarecer que os “indícios” levam a crer que as jovens encontradas em Portugal “sejam das brasileiras desaparecidas”. E que “a Polícia Federal instaurou um inquérito para apurar as circunstâncias do desaparecimento”. Não disse se já tinha detido o suspeito — que, se vier a ser julgado no Brasil, poderá vir a ser condenado a 30 anos de prisão, uma pena superior à que lhe poderia ser aplicada em Portugal, onde a pena máxima não pode ir além dos 25 anos.

Rapto foi primeira suspeita

Em Portugal o caso foi investigado pela Unidade Nacional de Contra-Terrorismo da Polícia Judiciária, por se suspeitar inicialmente de rapto ou mesmo tráfico de seres humanos. Nisso acreditava, aliás, também a mãe de Thayane, que disse à imprensa brasileira, quatro meses depois do desaparecimento, temer que a filha e as amigas tivessem sido vendidas como escravas para prostituição.

À medida que a investigação da PJ avançava, porém, com a colaboração da Polícia Federal do Brasil e o acompanhamento do Ministério das Relações Exteriores daquele país, essa tese começou a perder terreno. 

A remoção dos corpos, que foram levados para o Instituto de Medicina Legal, teve de ser feita com especial cuidado, uma vez que os cadáveres se encontravam em adiantado estado de decomposição, explicou o comandante dos Bombeiros Voluntários da Parede, Pedro Araújo. Cabe agora aos peritos determinar se as vítimas estavam ainda vivas quando entraram no tanque e qual a causa da sua morte.

Da lista da Interpol de pessoas que se encontram desaparecidas em vários países do mundo constam 78 cidadãos brasileiros. Quatro desapareceram em Portugal — três são as jovens agora encontradas e uma quarta é uma mulher de 31 anos de quem se perdeu o rasto no Porto, em Setembro de 2015.     

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