A empresa que constrói as fábricas das multinacionais

Garcia, Garcia, na mesma família há quatro gerações, especializou-se na construção de unidades industriais. É a ela que recorrem as multinacionais quando querem instalar as suas fábricas.

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O administrador Carlos Garcia prevê que o volume de negócios da empresa aumente mais de 61% este ano, para 36,2 milhões Fernando Veludo/nFACTOS

A trabalhar directamente nas instalações que a empresa tem em Moreira de Cónegos, a Garcia, Garcia tem 120 trabalhadores. Mas, se o critério for contabilizar o número de colaboradores que exercem as suas funções debaixo dos tectos que já construiu, o número chega facilmente aos cinco milhares. “Na verdade, nunca fizemos essas contas”, responde Carlos Garcia, um dos administradores que assegura a quarta geração de gestão familiar da empresa, especializada na construção de unidades industriais e logísticas.

Se Carlos Garcia, um dos três irmãos que desde 2004 assumiu os comandos da empresa, ficou surpreendido com a pergunta, rapidamente percebeu que não é propriamente abusivo contabilizar quantos postos de trabalho existem nos edifícios que concebeu e executou, muitos encomendados por multinacionais. “Na verdade, quando garantimos a construção de uma fábrica ou de um armazém, acabamos por não estar ali só a executar a ideia do cliente. Atrevemo-nos a fazer sugestões, a alterar os planos, sempre em prol da satisfação do cliente e não obedecendo apenas ao critério que quanto mais facturarmos melhor”, diz.

A Garcia Garcia não tem fábricas mas é responsável pela construção de unidades onde se produz de tudo um pouco: desde a alta tecnologia que é usada pela Bosch Termotecnologia em Cacia, às máquinas fotográficas da Leica, que na fábrica de Famalicão exige um ambiente limpo de poeiras e humidade. Também construiu as fábricas com o selo PIN (Projecto de Interesse Nacional) em Santo Tirso da Casfil, que produz polímeros para embalagens, e da Borgwarner em Viana do castelo, uma empresa americana de componentes de automóveis.

“Podemos não perceber nada do negócio de cada um deles, mas esforçamo-nos por perceber de layouts industriais e temos experiências a partilhar”, acrescenta o gestor. Em áreas tão sensíveis como são a produção e as patentes industriais, a confiança é o seu melhor cartão-de-visita. “Nunca perdemos um cliente”, afirma Carlos Garcia, que não tem equipa comercial a tentar angariar novos clientes. “Todos trabalhamos para isso e os nossos clientes são aqueles a quem agradecemos as boas recomendações que fazem de nós”, esclarece.

Um dos exemplos é o da Eurocast, multinacional de origem francesa que integra o grupo GMD, ligada ao sector automóvel. A Garcia, Garcia construiu a fábrica de Arcos de Valdevez, um investimento de 15 milhões de euros que gerou 70 postos de trabalho. Nove meses depois de ter entregue a obra, foi solicitada para assegurar a construção da maior fábrica da GMD em Portugal e no mundo (o grupo marca presença em nove países espalhados por três continentes). A Garcia, Garcia assume um projecto “chave na mão”: participa na identificação e selecção dos locais a instalar a empresa, assina os projectos de arquitectura e engenharia e executa-os. A segunda fábrica da Eurocast, em Estarreja, deverá estar a funcionar no final deste ano, findo o prazo de oito meses que a empresa tem para entregar a obra. Os primeiros 12 mil metros quadrados da fábrica (que vai permitir à multinacional francesa aumentar em mais 21 mil metros quadrados a sua capacidade de fundição injectada de alumínios para componentes automóveis) tiveram de ser construídos nos primeiros três meses.

Os 125 anos de história que leva a empresa, desde que Bernardino Garcia a fundou, nos finais do século XIX, não se escreveram sempre com tinta dourada. A empresa, que surgiu com a indústria têxtil e se alimentou do seu crescimento durante o século XX, teve de acomodar as duas crises de ajustamento dos dois sectores: a crise do têxtil, primeiro, e a do sector da construção, depois. Parece ter sobrevivido às duas, não sem um processo de reestruturação que culminou em 2014. “Antes não subcontratávamos nada, tínhamos carpintaria, electricistas, etc. Hoje, só mantemos a área da metalomecânica e do projecto. E subcontratamos o resto”, explica o administrador. Nenhum dos três irmãos é engenheiro ou arquitecto, nenhum deles tem, inclusive, qualquer formação superior. Quando a quarta geração de Garcias tomou conta da empresa, o número de trabalhadores era de 220. Em 2006 o número caiu para pouco mais de 60 funcionários, sem ter recorrido a despedimentos colectivos. Dez anos depois o número de funcionários aumentou para 120 e nos últimos seis anos o crescimento do volume de negócios foi de 260%. Em 2016, prevê fechar o ano com um volume de negócios de 36,2 milhões de euros, mais 61,2 % face a 2015.

A Garcia, Garcia construiu grande parte das chaminés das velhas fábricas têxteis que continuam de pé um pouco por todo o Vale do Ave e são, hoje, património industrial protegido pelos municípios. “Espero que continuem a não cair”, brinca Carlos Garcia. A primeira chaminé do Garcia, como continua a ser chamado o fundador, o bisavô Bernardino, ainda está firme à entrada da fábrica em Moreira de Cónegos. 

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