Um em cada cinco incêndios é intencional. Há 50 detidos até agora

Há jovens e menos jovens, alguns com cadastro. No ano passado, até ao fim do ano, foram detidas 131 pessoas pelo crime de incêndio/fogo posto. Este ano, diz a GNR que 19% dos incêndios têm causa "intencional".

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A GNR contabiliza para já 10.548 incêndios, que correspondem a 100.270 hectares de área ardida n/FACTOS

A GNR deteve até agora 11 pessoas por suspeita de incêndio/fogo posto e a Polícia Judiciária (PJ) 39  — Judiciária que só nos últimos dois dias anunciou cinco detenções. Uma das últimas foi a de um homem de 26 anos, sem ocupação profissional que, acredita-se, será responsável por um incêndio a 11 de Agosto na localidade de Cabanes, em Vila Pouca de Aguiar. Colocou em perigo casas e floresta. Sobre o que o moveu, o comunicado da PJ nada diz.

Outro detido nas últimas horas é um pedreiro desempregado, divorciado, 53 anos. Terá usado um isqueiro para atear dois fogos no dia 10, no concelho de Tondela. Entre os suspeitos, há jovens e menos jovens, cadastrados, pessoas com aparentes problemas de saúde mental e outras sem qualquer sinal disso.

A GNR contabiliza para já 10.548 incêndios, que correspondem a 100.270 hectares de área ardida (no ano passado foram menos de 64 mil). O que se sabe da origem dos fogos deste ano? A negligência é apontada como “causa” em 37% dos incêndios. Em 35% dos casos ainda não se sabe o que os provocou. E em 19% a causa é “intencional”.

Na quarta-feira, uma mulher de 52 anos, sem nenhum antecedente criminal, confessou à polícia que usou uma caixa de fósforos. Diz a PJ que ela contou que tinha visto, “ultimamente”, o combate aos fogos nas proximidades da sua casa, no concelho de Oliveira do Bairro. O que a levou a atear três focos de incêndio, que só não resultaram em danos avultados porque os bombeiros andavam perto, não é explicado.

Um agricultor de 54 anos, em Pinhel, que admitiu “não ter conseguido dominar o seu ímpeto incendiário”, já condenado anteriormente por atear fogos, e um desempregado de 46 anos, com “tendências autodestrutivas”, que já tinha tentado colocar fogo em botijas de gás, na Guarda, foram outros dos detidos nos últimos dias.

As cadeias portuguesas e instituições similares têm, recorde-se, 51 pessoas a cumprir pena por incêndio florestal. Mas todos os anos são muitas as participações às polícias. O Relatório Anual de Segurança Interna (RASI) de 2015 mostra que “o crime de incêndio/fogo posto em floresta/mata, arvoredo ou seara foi o que maior aumento [de participações] registou”. Chegou-se às 9988.

Foram detidas nesse ano pelas forças de segurança 131 pessoas, aplicadas 2821 contraordenações por incumprimento da legislação florestal e constituídos 135 arguidos.

Adolescentes identificados

Nesta quinta-feira a GNR faz saber que para além das 11 detenções feitas nestes primeiros sete meses e meio, identificou até agora, 319 pessoas e registou 872 autos de contraordenação por incumprimento do Decreto-Lei n.º 124/2006 (que estabelece as medidas e acções a desenvolver no âmbito do Sistema Nacional de Defesa da Floresta Contra Incêndios).

“Além das acções de patrulhamento e vigilância das zonas florestais, a GNR é responsável pela validação e medição das áreas ardidas dos incêndios florestais e pela investigação das suas causas, trabalho que se encontra actualmente em curso em diversas zonas do país”, recorda em comunicado. Os incêndios de Arouca (8 de Agosto), com 25.864 hectares ardidos, Águeda (mesmo dia), com 7761 hectares, e Arcos de Valdevez (mesmo dia), com 3676 hectares, foram os maiores em extensão de área ardida.

Só no distrito de Aveiro, um dos mais afectados pelos incêndios que se registaram nos últimos dias, foram identificadas pela GNR 13 pessoas na última semana, entre as quais dois adolescentes com 13 e 14 anos que estariam a tentar atear um fogo em Canedo, Santa Maria da Feira, explicou ao PÚBLICO a oficial de Comunicação e Relações Públicas do Comando Territorial de Aveiro, tenente Rita Afonso.

Nenhuma das 13 pessoas está detida, diz Rita Afonso. “Este crime é da competência da PJ que investigará e pode eventualmente vir a deter. A GNR só faz detenções em flagrante delito.”

Rui Almeida, responsável na PJ pela área dos incêndios florestais, considera que uma taxa de 19% de incêndios com “causa intencional” como a registada este ano não anda longe da observada noutros anos, “umas vezes é um pouco mais, outras um pouco menos”. São estes fogos que passam para a esfera da investigação PJ. E um dos trabalhos a que se tem dedicado esta polícia é estudar os perfis dos incendiários. Rui Almeida diz que muitos são “pessoas de meia idade, com baixa escolaridade, problemas de alcoolismo ou problemas psiquiátricos mais genéricos”. Mas há muitas nuances a ter em conta, até de ano para ano.

Depois, há os que deitam fogo por vingança, por zangas conjugais, em processos de divórcio, ou de litígios causados por heranças. Há quem tenha o fascínio do fogo. Há quem some diferentes características destas. “Por vezes conjugam-se diversos factores.”

Muitos dos que este ano foram detidos não se limitaram a atear um incêndio. Um homem de 37 anos (que nesta quinta-feira acabou por ficar preso preventivamente) é suspeito de ter desencadeado a 4 de Agosto 12 focos, numa área de mato que termina nas falésias situadas entre as praias de Benagil e Marinha, no concelho de Lagoa.

Ainda na quarta-feira: outro homem sem ocupação laboral, ex-bombeiro, 45 anos, e já com uma condenação de prisão efectiva no cadastro, pelo mesmo crime, foi detido. Suspeita-se que ateou 26 incêndios só este ano, no concelho de Oliveira de Azeméis. Dois deles assumiram “grandes proporções”, de acordo com a PJ.

Inquéritos arquivados

No ano passado, de acordo com a Procuradoria Geral da República, foram abertos 11.311 inquéritos, “para investigação da eventual prática de crime de incêndio florestal, cometido na forma dolosa ou negligente”.

Perto de 94% (10.599 ) foram arquivados. Outros 140 resultaram numa acusação. Foi aplicado o instituto da suspensão provisória do processo em 685 (o Ministério Público, pode, em certas circunstâncias determinar, com a concordância do juiz de instrução, a suspensão do processo impondo ao arguido obrigações, como frequentar um determinado tipo de programa de reabilitação, e regras de conduta).

O maior número de inquéritos iniciados registou-se nas comarcas de Vila Real (1225), Porto Este (1055), Braga (1040), Santarém (964) e Porto (718). O maior número de acusações deduzidas teve lugar nas comarcas de Braga (19), Viseu (18), Vila Real (17) e Santarém (13).

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