Clinton mostra declaração de impostos e pressiona Trump

Candidata do Partido Democrata e o seu marido, Bill Clinton, declararam mais de nove milhões de euros em 2015, uma soma ainda assim muito inferior à de 2014. Trump tem fugido à questão e pode ser o primeiro a furar a tradição no Partido Republicano desde 1980.

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Foram também divulgadas as declarações do candidato a vice-presidente, Tim Kaine Scott Audette/Reuters

A pressão para que Donald Trump revele finalmente a sua declaração de impostos atingiu este fim-de-semana um novo patamar, com a publicação das declarações relativas a 2015 de Hillary Clinton e do seu candidato a vice-presidente, Tim Kaine.

Com estes documentos, a candidata do Partido Democrata tenta descansar os muitos eleitores que a consideram uma pessoa pouco transparente, mas arrisca-se também a dar argumentos aos que a criticam por estar afastada da realidade dos cidadãos comuns – num dos anos em que menos dinheiro entrou na conta dos Clinton, o casal facturou ainda assim 10,6 milhões de dólares (9,5 milhões de euros), o que o coloca num exclusivo grupo em que só entram 0,1 por cento das famílias norte-americanas.

Tal como em anos anteriores, a maioria dos rendimentos do casal resultou de discursos proferidos um pouco por todo o mundo, mas 2015 foi um ano pior nesse aspecto porque Hillary Clinton anunciou a sua candidatura à nomeação pelo Partido Democrata e essa actividade foi posta de lado.

Por esses rendimentos, o casal pagou uma taxa combinada de impostos (federal, estadual e local) de 43,2 por cento – uma taxa muito mais elevada do que a maioria dos milionários norte-americanos porque a esmagadora maioria dos seus rendimentos provém de discursos e não de investimentos financeiros.

Em 2014, quando Hillary Clinton ainda não tinha anunciado a sua candidatura, o casal declarou rendimentos de 27,9 milhões de dólares (25 milhões de euros), também com base em discursos – incluindo três de Hillary Clinton na gigante Goldman Sachs, pelos quais foi criticada tanto por Donald Trump como por Bernie Sanders, o seu antigo rival nas primárias do Partido Democrata.

Um dos principais pontos de ataque de Sanders durante as primárias foi precisamente esse, e Trump continua a insistir nele: Clinton deve divulgar as transcrições desses discursos, para que os eleitores possam avaliar a sua proximidade aos grupos financeiros de Wall Street, que a candidata promete enfrentar se for eleita Presidente.

Tim Kaine, o parceiro "pobre"

Apesar de se poderem expor como um casal multimilionário e afastado da realidade do cidadão comum, a verdade é que a relação de Bill e Hillary Clinton com o fisco pode ser consultada desde 1992 – um argumento que Donald Trump não pode usar, para além de também lhe ser difícil argumentar que compreende o dia-a-dia dos cidadãos comuns.

Para aumentar ainda mais a pressão sobre Donald Trump, a campanha de Hillary Clinton divulgou também as declarações de impostos da última década do candidato a vice-presidente, Tim Kaine, e da sua mulher, Anne Holton.

Em termos financeiros, o senador da Virginia e a antiga secretária da Educação no mesmo estado vivem num planeta muito distante do de Bill e Hillary Clinton – ao todo, Tim Kaine e Anne Holton declararam no ano passado 313,441 dólares (281 mil euros), sobre os quais pagaram uma taxa de impostos federal de 20,3 por cento. O casal doou também 7,5 por cento dos seus rendimentos a instituições de solidariedade social. O pior ano da última década para o casal foi 2012, quando declarou 153 mil dólares (137 mil euros).

Trump pode quebrar tradição

Os candidatos oficiais dos partidos não são obrigados a tornar públicas as suas declarações de impostos, mas essa tem sido a regra nas últimas décadas – a ideia é que os eleitores tenham mais informação sobre quem vão escolher como seu Presidente, incluindo se a pessoa em causa tem contas em paraísos fiscais, se paga mais ou menos impostos do que a média dos cidadãos, ou se faz doações a instituições de solidariedade social, por exemplo.

No Partido Republicano essa tem sido a prática desde 1980 – Ronald Reagan (1980 e 1984), George Bush (1988 e 1992), Bob Dole (1996), George W. Bush (2000 e 2004), John McCain (2008) e Mitt Romney (2012), todos eles divulgaram as suas declarações de impostos antes das eleições.

Esta prática costuma ser comum também entre os candidatos a candidatos – este ano, durante as eleições primárias, os eleitores ficaram a conhecer as declarações de impostos de Jeb Bush (entre 1981 e 2014), Ted Cruz (entre 2011 e 2014), Marco Rubio (entre 2000 e 2014), Carly Fiorina (2012 e 2013) e John Kasich (entre 2008 e 2014).

Mas das declarações de impostos de Donald Trump, nem sinal. Pouco depois de ter anunciado a sua candidatura, no Verão do ano passado, o magnata do imobiliário começou por dizer que revelaria os seus impostos se Hillary Clinton divulgasse os e-mails que foi enviando e recebendo através de um servidor pessoal enquanto foi secretária de Estado, entre 2009 e 2013.

Desde então, a sua posição tem mudado: em Fevereiro disse que iria divulgá-los "a seu tempo" e em Maio disse que estava a ser auditado pelo Governo federal (uma auditoria de rotina) e que esperava poder mostrar a sua declaração de impostos quando essa auditoria estivesse concluída, manifestando a esperança de que isso acontecesse "antes das eleições" – Trump diz que nem sequer pode divulgar a declaração porque está a ser auditado, mas o IRS esclareceu que qualquer cidadão sujeito a uma auditoria pode revelar essa informação de forma voluntária.

O argumento de Donald Trump é que a sua declaração de impostos é muito complexa e que a sua divulgação não iria ser bem compreendida pela maioria dos jornalistas, o que levaria a uma imensidão de notícias prejudiciais e injustas para a sua candidatura. Esta ideia é defendida por vários advogados, como Robert J. Kovacec, da empresa Steptoe & Johnson: "No fundo, Donald Trump é uma enorme empresa, e essa complexidade não pode deixar de estar reflectida nos seus pagamentos de impostos", disse Kovacec ao New York Times.

Mas o Partido Democrata, vários analistas independentes e até nomes influentes do Partido Republicano, como Mitt Romney, têm argumentado que Trump só não revela os seus impostos porque tem algo muito relevante a esconder: ou não paga impostos de todo, devido às várias excepções previstas na lei para empresários da área do imobiliário; ou através da sua declaração os eleitores ficariam a saber que não tem, nem de perto nem de longe, a fortuna que diz ter, o que poria em causa o argumento do homem de negócios bem-sucedido; ou não dá nenhum dinheiro a instituições de solidariedade social, ao contrário do que tem afirmado várias vezes durante a campanha.

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