Jaime Soares: “Estamos preparados para 250 incêndios por dia, imagine-se 500”

Presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses diz que situação no terreno é preocupante. Ministro do Ambiente salienta “redução muito significativa” da área ardida este ano.

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Neste domingo houve um número invulgar de fogos em todo o país MARCO DUARTE/NFACTOS

Pelas 13h30 desta segunda-feira havia 145 incêndios em Portugal, um número que vai oscilando ao longo do dia. Apesar de fazer questão de dizer aos portugueses que podem confiar no dispositivo que existe, nos meios e bombeiros que estão no terreno, o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, Jaime Soares, não deixa também de considerar a situação preocupante, tendo em conta que no domingo houve 455 incêndios.

“Em Portugal, estamos muito bem organizados em termos de combate aos fogos florestais, mas quando as coisas ultrapassam determinada dimensão… O nosso dispositivo está preparado para 200 a 250 incêndios por dia. Quando passa este número não há nenhum país na Europa ou no mundo que esteja preparado. Os instrumentos funcionam na perfeição. 250 incêndios por dia já é uma loucura, agora imagine-se quando passam para 500”, disse ao PÚBLICO, por telefone, referindo-se ao dia de domingo.

Sim, disse, “é um dia preocupante, como os outros dias de Agosto, com temperaturas fora do comum, altíssimas, muito vento e alterações a todo o momento de direcção”. Não é a primeira vez que Jaime Soares aborda o problema, acontece todos os anos no Verão: “Tudo isto poderia ter outros efeitos, ou ser alterado, se nós tivéssemos a nossa floresta devidamente tratada. Está completamente abandonada, é preciso ver o que se pode fazer na floresta. Há soluções que passam pelo associativismo, por legislação para que o colectivo se sobreponha ao individual, não temos o cadastro completo da nossa floresta. Todos os anos nos deparamos com esta situação”, lamenta, enumerando as consequências que isto tem no bem-estar da população, na economia ou no ambiente.

“Há uma falta de limpeza da floresta extraordinária. E, depois, deparamos com estas temperaturas e com os incendiários, porque a floresta não arde espontaneamente, ainda que a Polícia Judiciária e a PSP estejam a fazer um bom trabalho… Mas, no ano passado, tivemos mais ignições em Portugal do que Espanha e França juntas. Este ano, se calhar, vamos pelo mesmo caminho”, avisa o presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses, que defende que os planos de emergência devem ser accionados “imediatamente” e não quando já é tarde, como considera ter sido o caso do Porto. “É uma ferramenta que deve ser utilizada”, afirma.

Apesar de a situação ser complicada, Jaime Soares faz questão de deixar palavras de esperança: “Portugal pode estar descansado. O momento é difícil, de esforço tremendo e titânico, mas podem acreditar nos milhares de agentes da Protecção Civil que estão no terreno, a lutar contra este autêntico terrorismo — 98% dos fogos tem origem na mão humana, destes 75% são de origem criminosa. É preciso mais vigilância musculada, com mais gente, mais força, modernização dos postos de vigia”, alerta Jaime Soares, ressalvando sempre, no entanto, que “o dispositivo está bem organizado”.

O presidente da Liga dos Bombeiros Portugueses deixa ainda um apelo: “Confiem e continuem a acreditar que os bombeiros vão ultrapassar, mas compreendam que um país com uma floresta com estas características e temperaturas, as coisas não estão, ou são, fáceis. Apelo aos portugueses para que tenham sentido de responsabilidade, que ajudem, sem porem em risco a vida, há sempre formas de ajudar. Por exemplo, ajudar os bombeiros, muitas vezes perto da exaustão, a esticar mangueiras. Pode ser uma ajuda grande e boa.”

E aproveita ainda a ocasião para elogiar quem está no terreno a combater as chamas: “Quero saudar os milhares de mulheres e homens que estão nesta batalha, a maioria bombeiros, e que fazem esforços titânicos para que os males não sejam tão grandes, para que a vida dos portugueses não corra tanto perigo. Muitas vezes, o país nem o reconhece. Mas fazem-no com competência e profissionalismo. Temos uma organização muito próxima da perfeição, no que diz respeito aos bombeiros na Protecção Civil.”

“Número invulgar” de fogos

O ministro do Ambiente, João Matos Fernandes, reconheceu, citado pela agência Lusa, que no domingo aconteceu "um número invulgar de incêndios", mas preferiu destacar a "redução muito significativa" da área ardida este ano, em comparação com "anos anteriores".

"Lamentamos e muito, evidentemente, a existência desses mesmos incêndios. Queremos acreditar que dias como o de ontem não se voltarão a repetir", disse, sem deixar, no entanto, de “sublinhar aquilo que tem sido uma redução muito significativa da área ardida" em Portugal, este ano, quando "comparada com os anos anteriores", e a "muito grande capacidade de poder agir quando os incêndios deflagram".

Para João Matos Fernandes, é preciso "continuar a prevenir" e "a reforçar os meios" em matéria de incêndios. O ministro afirmou ainda que, este ano, "descontado o dia de ontem", a época de incêndios tem sido "muito mais benigna" do que aquilo que era "a expectativa inicial".

"Isso significa o quê? Uma grande capacidade para intervir, uma grande coordenação de meios, uma grande disponibilidade para quem está no terreno, tanto a coordenar, como a apagar os incêndios", elogiou.

"Sem dúvida que a contratação de vigilantes da natureza que está prevista para o final deste ano é da maior importância para podermos estar ainda mais perto do território", afiançou ainda.

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