O descobrimento de Marcelo pelo Brasil

Presidente está à vontade quando se trata de espalhar simpatia, como demonstrou na quarta-feira à noite,numa recepção à comunidade portuguesa na residência do cônsul no Rio.

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Marcelo Rebelo de Sousa assiste esta sexta-feira à abertura dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro Diogo Baptista

O que é que a baiana tem? A julgar por um retrato a óleo que está em exposição no Museu de Arte do Rio (MAR), que Marcelo Rebelo de Sousa visitou nesta quinta-feira, no século XIX baiana que se prezasse tinha um bigode. “Aqui temos uma rica fazendeira com seus bigodes e seus brilhantes”, riu-se Paulo Herkenhoff, curador de arte e ex-director do MAR, apontando a tela de Dona Maria Epifânia de São José e Aragão, uma dama branca com a consistência de um lutador de sumo e um senhor bigode. “Típico!”, reagiu o Presidente da República português, animado. 

No segundo dia da sua visita oficial ao Brasil, a pretexto da abertura dos Jogos Olímpicos no Rio de Janeiro, Marcelo teve um programa inteiramente cultural. Começou por visitar uma exposição no MAR dedicada à princesa Leopoldina do Brasil (e rainha consorte de Portugal e dos Algarves por dois meses em 1826). A exposição pretende valorizar a influência e importância da princesa, que presidiu à reunião do Conselho de Ministros que decidiu a independência do Brasil em 1822, embora a história tenha atribuído exclusividade heróica ao marido, D. Pedro I. “Como é que nunca foi feito um filme sobre D. Pedro e Leopoldina?”, admirou-se Marcelo. “Porque é a génese do Brasil. Se fosse nos Estados Unidos da América estava feito.”

Ninguém parece ter reparado na ironia de a visita a uma exposição sobre uma mulher relegada para segundo plano por homens ter sido feita na companhia do número dois do Governo brasileiro, o chefe da Casa Civil Eliseu Padilha, e o ministro da Cultura brasileiro, Marcelo Calero, dois representantes de um executivo sem mulheres que tomou o poder depois de a única Presidente mulher do país ter sido afastada por um Congresso maioritariamente masculino e corrupto. Marcelo, que vai ser recebido esta sexta-feira pelo Presidente interino do Brasil, Michel Temer, numa recepção a 45 chefes de Estado que viajaram para o Rio para a cerimónia de abertura dos Jogos Olímpicos, tem evitado comentar a situação política brasileira. Questionado por uma jornalista brasileira sobre se o período de austeridade em Portugal poderia servir de modelo para a crise económica em que o Brasil se encontra, o Presidente português garantiu que o Brasil “tem tudo para dar certo”. “De vez em quando, até eu próprio me choco quando encontro amigos brasileiros que não têm auto-estima. Que é uma coisa também muito portuguesa”, disse. “Não acreditam no Brasil tanto quanto deviam acreditar.”

Depois do MAR, Marcelo visitou outra instituição da Fundação Roberto Marinho, o popular Museu do Amanhã. Projectado pelo espanhol Santiago Calatrava (o mesmo arquitecto da estação de comboios Oriente, no Parque das Nações, em Lisboa) e inaugurado em Dezembro, é um museu de divulgação científica, sem acervo e com um conteúdo essencialmente tecnológico. O museu estava cheio de famílias - foi decretado feriado no Rio por causa da chegada da tocha olímpica à cidade -, algumas das quais pediram para tirar fotografias com o Presidente de Portugal, mesmo que cinco minutos antes nem o reconhecessem (“Quem é? O de gravata azul?”). Marcelo está à vontade quando se trata de espalhar simpatia, como demonstrou na quarta-feira à noite, no banho de multidão que experimentou numa recepção à comunidade portuguesa na residência oficial do cônsul português no Rio. Esteve mais de uma hora a ser abraçado e a posar para selfies. E até o Cristo Redentor, ali tão perto do Palácio de São Clemente, se iluminou com o verde e vermelho da bandeira portuguesa.

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