Será Zakarin o ciclista que a Rússia tanto anseia?

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Zakarin venceu pela primeira vez no Tour LIONEL BONAVENTURE/AFP

No domingo, quando seguia na dianteira da corrida, na companhia de Rafal Majka (Tinkoff), Ilnur Zakarin desapareceu dos radares. As câmaras foram descobri-lo, parado, sozinho na berma da estrada. Mas a vertiginosa emissão televisiva não se compadece daqueles que ficam para trás e, rapidamente, abandonou o russo, sem que o espectador conseguisse descortinar o que tinha realmente acontecido. A explicação foi dada pelo próprio no final da etapa: “Na descida, perdi as minhas lentes de contacto. Por duas vezes, tentei voltar a pô-las, mas estava demasiado stressado e não consegui. Continuei só com uma, o que é particularmente difícil. Não podia fazer mais nada. Penso que terei ainda outras duas oportunidades para fazer melhor”.

E Zakarin não estava enganado. Nesta quarta-feira, o trapalhão ciclista da Katusha não perdeu nada na sua cavalgada rumo à primeira vitória no Tour, mas não conseguiu fechar a camisola a tempo de festejar. É assim a nova promessa do ciclismo russo, o sucessor há muito aguardado de Denis Menchov, o último vencedor nacional de grandes Voltas. Desastrado, como se viu no Giro, com uma queda que ainda hoje está por explicar e que o levou a desistir a dois dias do final, quando era quinto da geral. Hermético – fica nervoso diante dos jornalistas, com os quais fala num inglês macarrónico, a única língua que "arranha" além do russo. Talentoso, ou não fosse ele produto do projeto Russian Global Cycling Project, que procura (e encontra) potenciais figuras nascidas nos anos da perestroika.

Poucos ciclistas se poderão gabar de ter uma carreira tão meteórica quanto Ilnur, no melhor e no pior. Com apenas 17 anos, o tímido rapaz, nascido em Naberezhnye Chelny, sagrou-se campeão europeu de contrarrelógio de juniores, um feito que seria ‘esquecido’ dois anos depois, quando deu positivo por anabolizantes e foi punido pela Federação russa com 24 meses de suspensão. “Aquilo foi um erro estúpido do passado, agora quero olhar para o futuro”. E o futuro passou, como não poderia deixar de ser pela nacional Itera, a filial da Katusha, que o acolheu no seu regresso à estrada, em 2012. Uma temporada bem conseguida levou-o a dar o salto para a segunda formação russa, a RusVelo, onde conquistou o título de campeão nacional de contrarrelógio (2013) e venceu três provas por etapas de forma consecutiva em meras seis semanas.

A progressão natural levou-o, inevitavelmente, à Katusha. A chegada ao WorldTour, ao contrário de o intimidar, galvanizou-o. “Vejo-me como um ciclista muito completo. Em 2015, melhorei na montanha. Definir-me-ia como um ciclista para provas por etapas”, disse sem falsas modéstias, após entrar na história do ciclismo russo, ao tornar-se no primeiro corredor nacional a vencer uma corrida do WorldTour (a Volta à Romandia de 2015) desde que Menchov vestiu a camisola rosa do Giro2009. Mulçumano não praticante, o ciclista de 26 anos atribuiu o mérito desse feito à mulher, Viktoria, nutricionista de profissão, com quem vive em Limasol (Chipre). “Ela ajudou-me a ter uma dieta equilibrada. Em dois anos, perdi dez quilos, o que me tornou mais leve e, consequentemente, mais forte a subir”.

Com duas vitórias em grandes Voltas no currículo (além da de ontem, tem uma no Giro2015), este apaixonado pelo hóquei no gelo e pelo Rubin Kazan, que tem tatuada a frase “Agora ou Nunca”, não que ficar por aqui. “No futuro, quero ganhar uma grande e o Tour é a minha prioridade”.

 

 

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