Depois de quatro anos em quebra, há mais vagas no ensino superior

Aumento é residual, mas quebra a tendência que se registava desde 2012. Cursos de engenharia e afins, ciências empresariais e saúde são os que mais lugares abrem. Politécnicos defendem que “ajustamento entre a oferta e a procura deveria ser maior”.

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Cada estudante pode concorrer a um máximo de seis combinações de instituições e cursos Rita Chantre

A área de arquitectura e construção perde uma centena de vagas face ao ano passado. Já os disputados cursos de medicina, que estão entre os que têm as notas de ingresso mais altas, mantêm a mesma oferta: 1441. Nas engenharias e afins quase não há variações: cerca de nove mil vagas. E o mesmo se passa a informática — 864. Ou até nos cursos de formação de professores e ciências da educação — 1220. Feitas as contas, há 50.688 lugares nas universidades e politécnicos públicos do país, disponíveis para serem ocupados por novos alunos — mais 133 do que em 2015.

A partir desta quinta-feira está aberta a 1.ª fase do concurso nacional de acesso ao ensino superior. E o que mostra a oferta disponibilizada nos 1060 pares instituição de ensino/curso é isto: depois de quatro anos (desde 2012) marcados por uma redução, ano após ano, do número de lugares abertos, 2016 é o primeiro a registar um aumento da capacidade instalada, ainda que não chegue às 150 vagas. Trata-se de um aumento residual, sublinham tanto o presidente do Conselho de Reitores das Universidades Portuguesas (CRUP), António Cunha, como o presidente do Conselho Coordenador dos Institutos Superiores Politécnicos (CCISP), Joaquim Mourato. António Cunha considera, de resto, que o número de lugares disponíveis “é razoável”. E acrescenta: “Está ligeiramente sobredimensionado, o que permite que os estudantes tenham mais liberdade para escolher um curso em função dos critérios que considerarem mais pertinentes, o que é positivo.”

Compare aqui as vagas, cursos e a nota do último colocado

Para o presidente do CRUP, a questão de fundo actual tem a ver com o número de candidatos que, apesar de uma ligeira subida no ano passado, tem vindo a decair. “O que nós precisamos é de mais gente no ensino superior, como aliás se pode constatar também pelas médias europeias, que são superiores”, defende.

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Na sua opinião, a existência de mais candidatos passa, sobretudo, por garantir, por um lado, que “as taxas de sucesso no ensino secundário sejam mais efectivas, no sentido de resultarem em mais estudantes com condições para se candidatarem”. Mas também por impedir que questões de “ordem financeira” limitem o prosseguimento de estudos. Para tal, diz, é preciso “alargar o universo de alunos abrangidos pela acção social escolar”.

No ano passado, houve 54.450 candidatos ao superior (mais 4390 do que em 2014) nas três fases que compõem o concurso nacional. E estavam disponíveis 50.555 vagas. Acabaram por entrar e matricular-se cerca de 44 mil alunos.

Regras foram cumpridas

Também o presidente do CCISP, Joaquim Mourato, considera que é residual o aumento de vagas proposto para o próximo ano lectivo, destacando, em vez disso, que existe “uma estabilização da oferta”. O CCISP já expressou, contudo, várias vezes, a opinião de que o “ajustamento entre a oferta e a procura deveria ser maior”, lembra. E isto porque “mais uma vez se espera que o número total de candidatos este ano esteja muito abaixo do número de vagas”.

“Não foi esse o entendimento do Governo, como não tinha sido do anterior”, constata Joaquim Mourato, acrescentando que os politécnicos têm capacidade formativa suficiente para a procura que actualmente existe — uma procura que, nota, não se restringe aos candidatos que concorrem ao concurso nacional de acesso.

De facto, este concurso que agora arranca não é a única forma de entrar no superior. Há várias outras vias. Dois exemplos: através dos concursos especiais, organizados pelas instituições de ensino, destinados aos maiores de 23 anos que prestam provas especiais; ou mediante os concursos de admissão também organizados pelas instituições para quem quer seguir um curso técnico superior profissional (o Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior diz que nos próximos dias será fornecida informação adicional sobre estes cursos).

Há ainda 660 vagas para os chamados concursos locais de acesso — destinados a seleccionar os candidatos a cursos com características específicas, caso de Música, Dança, Teatro ou Cinema. Também aqui houve um pequeno aumento da capacidade (em 2015 tinham sido 616 lugares).

Apesar de existirem vários cursos, nomeadamente do politécnico, com reduzidíssima procura, Joaquim Mourato garante que todos os que abrem novos lugares cumpriram os requisitos impostos pelo Governo. Requisitos que foram recordados num despacho que o Ministério da Ciência e Tecnologia e Ensino Superior (MCTES) fez seguir em Junho para universidades e politécnicos. A saber: as instituições não poderiam abrir vagas, salvo casos especiais, em cursos onde o número de alunos inscritos pela primeira vez no 1.º ano, tanto em 2014 como em 2015, tivesse sido inferior a 10; cursos onde houvesse, entre os recém-diplomados, elevadas taxas de desemprego registado no Instituto de Emprego e Formação Profissional não poderiam aumentar a oferta; e, por fim, o número total de lugares em cada instituição não podia “ser superior ao maior de entre a soma das vagas fixadas para os concursos nacional e locais, para essa instituição, em cada um dos dois últimos anos lectivos”.

Posto isto, o facto de ter existido um aumento de lugares este ano, ao contrário do que se passou em 2012, 2013, 2014 e 2015, foi, segundo o MCTES, uma “decisão das instituições dentro do plafond disponível”.

Apenas alguns exemplos de cursos que mantêm o mesmo número de vagas este ano, apesar de pouco concorridos: Engenharia do Ambiente, do Politécnico de Beja, teve no ano passado zero colocados no concurso nacional, mas atraiu 12 novos alunos, segundo dados fornecidos pelo ministério que lembra, uma vez mais, que há outras vias de entrada no ensino superior; Ciência e Tecnologia Alimentar, do Politécnico de Bragança, teve apenas um colocado no concurso nacional do ano passado, mas acabou por receber 13 “caloiros”; Engenharia Civil, no Instituto Superior de Engenharia da Universidade do Algarve, também teve zero colocados no regime geral, mas recebeu 14 novos alunos. Resultado: qualquer um destes cursos mantém o número de vagas este ano (23, 36 e 28, respectivamente).

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O país precisa de engenharias

A lista do MCTES mostra ainda o seguinte: a maioria da oferta disponível continua a concentrar-se no ensino universitário (55,9%). E há 44 cursos onde no ano passado não foram abertas vagas — o que significa que são cursos novos, ou cursos que alteraram a sua denominação.

As três áreas com mais peso na oferta disponível são engenharia e técnicas afins (17,7% das vagas), ciências empresariais (14,7%) e saúde (13,1%). E faz sentido que engenharia continue a ter este peso? O fim do boom da construção civil em Portugal levou a uma redução da procura de engenheiros civis, mas isso não quer dizer que a engenharia seja igual a desemprego, muito pelo contrário, frisa o bastonário da Ordem dos Engenheiros, Mineiro Aires. “O país precisa de engenheiros como de pão para a boca e há muitas empresas multinacionais que operam cá e que não conseguem nenhum.”

A lista completa de vagas e cursos a concurso na 1.ª fase (Excel)

Se para a engenharia civil, o destino “continua a ser a emigração, noutras áreas a empregabilidade é alta, senão mesmo total”, diz o bastonário. Não é só por isso que defende que o actual número de vagas se mantenha, apesar da redução drástica de candidatos. “Ajustar a oferta à procura seria um suicídio porque daqui a cinco anos não teríamos engenheiros e um país que não aposta nesta formação compromete o seu futuro.”

Outro dos problemas de engenharia tem sido o das disciplinas que funcionam como provas de acesso: Matemática e Física e Química, que este ano voltaram a ter menos inscritos. “Os jovens não devem ter medo destes fantasmas. Não é preciso ser um aluno de 18 para seguir engenharia, mas é preciso saber Matemática e Física para ter esta profissão”, diz.

As candidaturas ao concurso nacional fazem-se através da Internet, no site da Direcção-Geral do Ensino Superior, até 10 de Agosto. Cada estudante pode concorrer a um máximo de seis combinações de instituições e cursos. Os resultados são conhecidos a 12 de Setembro e segue-se, depois, com as vagas que sobrarem, a 2.ª fase do concurso (candidaturas entre 12 e 23 de Setembro).

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