Governo madeirense vende jornal de Jardim

Jornal onde o ex-presidente regional assinou diariamente uma página de opinião, e foi director após o 25 de Abril, chegou a custar perto de sete mil euros por dia ao orçamento madeirense. Dono do Oje é um dos interessados na compra.

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Por dia, o jornal chegou a custar sete mil euros à região Rui Gaudêncio

O Jornal da Madeira, onde Alberto João Jardim escreveu diariamente durante anos contra adversários políticos, incluindo os do próprio partido, vai ser vendido até ao final do ano. O matutino, que recentemente alterou o título para JM, e foi alvo de uma profunda restruturação, vai passar para mãos privadas, libertando assim o orçamento regional em cerca de dois milhões de euros anuais.

O anúncio foi feito esta semana pelo secretário regional dos Assuntos Parlamentares e Europeus, Sérgio Marques, no final da reunião de conselho de governo. Marques não adiantou o nome de potenciais interessados, mas o PÚBLICO sabe que o grupo Megafin, proprietário do jornal económico Oje, está bem posicionado para adquirir a Empresa Jornalística da Madeira, que além do JM detém ainda uma rádio local, a RJM.

Para além da Megafin, que este mês admitiu ter interesse em reforçar o portfólio media com o ETV e com o ‘site’ do Diário Económico, existe também um conjunto de empresários madeirenses na diáspora interessados em adquirir o título, que nos últimos anos assumiu uma linha editorial pró-jardinista com um custo para a região a rondar os sete mil euros por dia.

A venda do jornal foi uma das promessas eleitorais de Miguel Albuquerque, ele próprio visado, durante o processo de sucessão de Jardim no PSD-Madeira, pelos artigos de opinião monocromáticos e alinhamento editorial crítico do JM.

Sem valor base para venda, o caderno de encargos do concurso obriga quem adquirir o JM a manter a publicação diária em papel por um período mínimo de quatro anos, sempre com 70% dos conteúdos de cariz regional e generalista. Para o processo, conta a melhor proposta financeira, mas o governo madeirense ressalva que esse não é o único critério.

Por isso, a experiência do grupo Megafin coloca-o na linha da frente, embora até ao final do processo possam surgir outros interessados. Para já, disse fonte do executivo regional, apenas dois grupos empresariais formalizaram interesse, tendo ocorrido várias reuniões exploratórias.

Sérgio Marques, quando apresentou o decreto regulamentar que estabelece as condições de venda da empresa, traçou como meta o final do ano, mas esse prazo poderá ser demasiado conservador, tendo em conta o estado avançado das negociações com os interessados. O dossier, apurou o PÚBLICO, deverá estar fechado ainda durante o Verão.

O objectivo, disse o secretário regional, é a desoneração do erário público e ao mesmo tempo garantir a pluralidade informativa no arquipélago. Isto porque para além do JM, o arquipélago conta apenas com outro matutino (Diário de Notícias da Madeira, detido por privados) e um semanário (Tribuna, também fora da esfera pública), quando os Açores têm sensivelmente o dobro de títulos informativos.

A pluralidade de informação foi sempre a justificação que Alberto João Jardim apresentou para subsidiar o jornal, que era detido em 99,98% pelo governo regional e tinha a Diocese do Funchal como sócio minoritário. O jornal, que terá absorvido perto de 50 milhões de euros do orçamento regional só na última década, e para onde era canalizada toda a publicidade institucional do Governo, foi alvo de várias queixas à Entidade Reguladora para a Comunicação Social, Autoridade para a Concorrência e várias vezes escrutinado pelo Tribunal de Contas.

Em 2008, o executivo de José Sócrates aprovou a ‘Proposta de Lei do Pluralismo e da não Concentração nos Meios de Comunicação Social’, que impedia governos e autarquias de terem órgãos de comunicação social. Uma “pulhice”, acusou Jardim, que, sem olhar a custos, ignorou a legislação passando a distribuir gratuitamente o jornal.

Aumentando a tiragem e pagando principescamente a colunistas próximos da liderança do PSD-Madeira, o jornal foi-se tornando um peso cada vez maior para os cofres regionais e tem, desde que Albuquerque tomou posse, sido apontado pela oposição como uma despesa injustificável para a região.

Depois de ter assumido o passivo da empresa, a rondar os 52 milhões de euros, o governo regional colocou em marcha um processo de restruturação que implicou a saída de 24 trabalhadores, quase metade dos recursos humanos do jornal, que no último ano de Jardim na Quinta Vigia [sede do executivo] apresentou um resultado liquido negativo de três milhões de euros.

O título foi alterado para JM – a Diocese do Funchal ficou com a ‘marca’ Jornal da Madeira - e os suprimentos do orçamento regional reduzidos de 2,6 milhões de euros para 1,1 milhões. Em termos editoriais o governo afastou-se. Ao mesmo tempo o jornal foi alvo de alterações gráficas e de uma redução na tiragem de acordo com o mercado.

“Um importante trabalho de restruturação”, destacou Sérgio Marques, que contribuiu para reduzir três quartos do défice encontrado e tornar o título mais atractivo para potenciais compradores.

 

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