Risco de sanções a Portugal coloca Passos e Costa do mesmo lado

A eventualidade da aplicação de sanções ainda não está decidida, mas Portugal tem-se batido para ficar com o estatuto de cumpridor. Costa fez o seu papel no Conselho Europeu. E Passos na reunião do PPE.

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Não é muito comum, mas em Bruxelas, Passos e Costa falaram a uma só voz contra as sanções Miguel Manso

A discussão pública por causa das sanções a Portugal, que envolveu Pedro Passos Coelho e Valdis Dombrovskis, foi um dos momentos de maior tensão vividos na ronda de encontros que precederam a cimeira do Conselho Europeu, realizada na quarta-feira, dia 29, e na qual participou António Costa. De um lado estava o ex-primeiro-ministro português a opor-se às sanções, do outro o comissário europeu responsável pelo euro e pelo diálogo social, o ex-primeiro-ministro letão Valdis Dombrovskis, que defendia a penalização de Portugal e de Espanha. O confronto foi na terça-feira, em Bruxelas, durante a reunião do Partido Popular Europeu (PPE)

No dia seguinte, na cimeira do Conselho Europeu a questão voltou a ser motivo de tensão e ocupou espaço de debate, embora não estivesse na agenda, mas ninguém entrou em conflito frontal, de acordo com as informações recolhidas pelo PÚBLICO. O chefe do Governo espanhol, Mariano Rajoy, também usou da palavra, numa intervenção caracterizada ao PÚBLICO como “muito dura”, para, pela primeira vez, rejeitar claramente a possibilidade de serem aplicadas sanções a Espanha.

A defesa de Portugal coube a António Costa, primeiro-ministro que se opôs a que o país venha a ser penalizado por incumprimento das regras, num momento em que está a recuperar da crise e em que seguiu à risca o guião acordado no memorando que assinou a 17 de Maio de 2011 com as entidades credoras, entre as quais estava a própria Comissão Europeia, além do Banco Central Europeu e do Fundo Monetário Internacional.

Tanto mais que, se forem aplicadas sanções a Portugal, em causa poderá estar a capacidade de recuperação económica do país que este ano, de acordo com os dados da execução orçamental, está dentro dos parâmetros orçamentais previstos. Isto porque o investimento público previsto depende dos fundos estruturais, que ficarão prejudicados no caso de sanções.

De acordo com os relatos obtidos pelo PÚBLICO, ninguém defendeu as sanções e, pelo contrário, terão sido vários os participantes na reunião que mostraram concordância com as posições portuguesa e espanhola, acenando a cabeça como quem diz que sim, quando Costa e Rajoy falavam. Terá mesmo havido líderes europeus que manifestaram verbalmente o seu apoio aos dois países da Península Ibérica.

Sublinhe-se que o maior apoiante da posição portuguesa tem sido o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, que tem manifestado o entendimento do quanto seria desastroso para Portugal a aplicação de sanções também pelo efeito que teria sobre os mercados financeiros e sobre os juros da dívida. Mas também sobre a possibilidade de Portugal continuar a receber os fundos estruturais.

Na quarta-feira, ao lado de António Costa, assumiram posição em defesa da não aplicação de sanções o primeiro-ministro italiano, Matteo Renzi, e o presidente francês, François Hollande, ambos socialistas, que já anteriormente tinham assumido a sua solidariedade com a posição portuguesa. Mas falaram também em defesa da não aplicação de sanções, o primeiro-ministro da Húngria, Viktor Orbán, e o recém-eleito chanceler da Áustria, Christian Kern, o primeiro de centro-direita e o segundo social-democrata.

Estatuto de “incumpridor”

Na terça-feira, dia 5 de Julho, a Comissão Europeia reúne-se em Estrasburgo para analisar e decretar o cumprimento ou o incumprimento do limite de 3% de défice em 2015 pelos países da União Europeia.

Nessa reunião a situação portuguesa e espanhola serão apresentadas pelo comissário Dombrovskis, que acumula agora também a pasta sobre mercados de capitais, após a demissão do comissário britânico Jonathan Hill. Além da apresentação feita por Dombrovskis, será importante, na reunião, a participação de Pierre Moscovici, vice presidente da Comissão Europeia para os assuntos económicos e sociais.

O resultado da reunião é difícil de prever de acordo com as informações recolhidas pelo PÚBLICO já que há uma fragmentação entre os comissários que nem sequer obedece à lógica da família política, a qual se sobrepõe uma lógica norte-sul.

Neste encontro pode haver uma votação para apurar uma conclusão.Em princípio, a Comissão Europeia apenas tem de decretar se Portugal é ou não incumpridor. Perante o quadro apresentado, há a possibilidade de Portugal não ser considerado incumpridor. Outro cenário possível é a Comissão Europeia adiar a solução até ao fim do ano para que a situação volte a ser equacionada em conjunto com as contas públicas portuguesas de 2016.

No caso de Portugal ser considerado incumpridor e de a Comissão entender que deve ser castigado, a decisão sobre o tipo de sanções a aplicar só será, porém, tomada na reunião dos ministros das Finanças, o Ecofin, que se realiza a 12 de Julho. Daí sairá uma eventual proposta que será, depois, aprovada (ou não) pelo Conselho Europeu.

PPE aqueceu

António Costa e Pedro Passos Coelho estiveram do mesmo lado da barricada na defesa de que Portugal não deve ser penalizado com a aplicação de sanções por incumprimento das regras do Tratado Orçamental e por ter atingido um défice excessivo em 2015. Ou seja, um défice de 4,4% do PIB, 1,4% acima dos 3% que é o limite admitido pelas regras europeias.

Com a gestão governativa do seu último ano de mandato posta em causa nesta análise, Passos Coelho tomou uma posição frontal e veemente contra as sanções durante a reunião do PPE. E questionou mesmo a razão de uma eventual penalização a Portugal e Espanha quando já se sabe que a França não será sancionada, embora não tenha respeitado o défice de 3%. Uma excepção que se deverá ao facto de o Governo francês não estar em excesso no défice estrutural.

O embate principal no PPE surgiu face ao comissário Valdis Dombrovskis, que insistiu na necessidade de as regras serem cumpridas e de Portugal e Espanha serem penalizados. A tensão dentro do PPE não existiu apenas na reunião da tarde. Ela prolongou-se também ao jantar que encerrou as reuniões preparatórias do PPE para a cimeira do Conselho Europeu do dia seguinte. Nessas reuniões participou também o comissário português Carlos Moedas.

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