O bicho-de-sete-cabeças

Exame de Português, destruidor de médias, pai de mil e quinhentas aflições, bravo e insubmisso bicho-de-sete-cabeças. Como domar uma criatura destas? Especialmente eu, um trinca espinhas que mal tem força para agarrar solenemente uma espada para o enfrentar. Todo um ano lectivo, no que diz respeito a esta disciplina, se resumiu a duas horas e meia de combate intenso.

Primeiro veio Felizmente Há Luar e o monólogo enternecedor e destemido de Matilde, comprimido entre três perguntas que me sugaram logo uma hora e dez minutos do tempo total, a meio da segunda já estava a ver a minha vida a andar para trás, os meus olhos esbugalhados de medo não conseguiam parar de relembrar um teste que fiz no final do primeiro período em que demorei tanto tempo nas perguntas de desenvolvimento que acabei por não conseguir terminar a prova e deixar o grupo três todo em branco. Resultado? “Nega.” Não podia deixar isso voltar a acontecer, além disso ainda não tinha atravessado aquela porta insalubre, negra e assustadora que me levaria às duas perguntas de lírica camoniana, por isso projectei toda a energia que os nervos me ofereciam para as minhas mãos, e juro-vos que parecia o Usain Bolt (se o Usain Bolt usasse as mãos para correr no lugar das pernas).

Camões, velho amigo, encontramo-nos de novo! Então que contas? Olha, diz-me uma coisa, quando te sentavas na escrivaninha, alguma vez cogitaste para ti próprio “Deixa-me lá pensar como é que eu vou conseguir dificultar a vida aos alunos de 12.º ano daqui a 470 anos”? Não? Pois, meu caro, conseguiste. Parabéns! Queres um olho?

Ui, aquilo que eu receava mais: funcionamento da língua e escolha múltipla. Os meus amigos dizem-me sempre que essa é a parte mais fácil dos testes e exames e, de certa forma, têm razão, é a mais fácil de fazer; porém, e muito como o Polvo do Sermão de Santo António aos Peixes, “com aquele seu capelo na cabeça, parece um monge”, se erras, não há volta a dar, és logo violentamente preso pelos seus tentáculos e devorado pelos dentes da gramática.

Ainda não pus os olhos nos critérios de correcção da prova, quis escrever isto antes de ficar deprimido (ou não). O grupo três, sejamos honestos, até não foi difícil, já praticámos vezes e vezes o texto expositivo-argumentativo. Neste não temos desculpa.

A todos aqueles que, destemidamente, enfrentaram este dragão de letras, estamos juntos, um bem-haja. Venha o próximo!

Aluno do 12.º ano, Escola Secundária Rainha Dona Amélia, Lisboa

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