“Não é a idade que define quando deixamos de ser activos é a saúde”

Os idosos não são todos iguais e não devem ser olhados da mesma forma, defende o vice-presidente da Plataforma AGE Europa. Há muitos que querem continuar a trabalhar, ter uma voz activa na sociedade. Os idosos estão também a tornar-se um nicho de mercado importante no consumo ou o turismo.

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Nuno Ferreira Santos

O dinamarquês Ebbe Johansen veio a Portugal para falar da importância de os idosos participarem nas decisões políticas que os afectam e de construírem projectos que dêem respostas às suas necessidades. Já depois dos 70 anos, este engenheiro civil e antigo responsável na IBM é um dos líderes da DaneAge, a associação que representa 40 milhões de europeus, incluindo os portugueses da Associação de Aposentados Pensionistas de Reformados ( APRe!), que na sexta-feira se reuniram em Lisboa para debater que o Futuro não tem idade.

Num continente cada vez mais envelhecido, este é um combate em várias frentes, defende. E muitas respostas podem ser dadas por quem representa os idosos no terreno. No seu país, a DaneAge tem actuado em parceria com voluntários e empresas, em projectos de combate à solidão ou de manutenção de emprego para quem não quer reformar-se. 

A Suíça foi considerada o melhor país do mundo para envelhecer no index do AgeWatch de 2015. O resto da Europa está preparada para lidar com os seus velhos?
Há diferenças entre os países, e dentro da União Europeia e temos um trabalho a fazer para responder a estes desafios. Na Plataforma AGE Europa olhamos para os problemas políticos, e fazemos recomendações à Comissão Europeia (CE). Por outro lado, também actuamos através de projectos concretos. A Comissão entregou-nos, por exemplo, a missão de implementar o Convénio Europeu para as Alterações Demográficas, que começou em 2013 com uma declaração sobre o que era necessário para ter uma Europa mais ‘amiga das pessoas idosas’. E em Dezembro passado, em Bruxelas, foi anunciado que já há mais de 100 entidades públicas, organizações e empresas empenhadas em conseguir um envelhecimento activo e saudável na Europa.

Que áreas são prioritárias?
Temos de olhar para o ambiente em que os idosos vivem, ter em conta por exemplo as condições de habitação ou transporte, mas também para a forma como os mais velhos participam nas decisões, combatendo a discriminação etária, garantindo o acesso ao emprego e depois há questões como os serviços de saúde prestados. 

Os idosos são ouvidos na definição destas questões?
Essa é a grande vantagem da Age Platform Europe. Representamos 150 organizações que reúnem 40 milhões de pessoas com mais de 50 anos e que, por isso, sabem do que falam. Por outro lado, também pedimos à CE para nomear peritos para trabalhar em conjunto em 12 áreas prioritárias. Isto permite-nos ter informação das necessidades de cada país e depois poder transmiti-la à CE. O mesmo acontece no sentido inverso. Quando recebemos informação sobre as intenções da CE podemos transmita-la às organizações.

Não devia haver mais idosos, a nível local, a participar nas decisões que lhes dizem respeito?
No meu país, a Dinamarca, todos os governos têm um conselho consultivo composto por idosos. Este conselho faz propostas concretas, por exemplo, em áreas como a saúde. E isso é importante porque muitas vezes não se perde tempo a ouvir o que os idosos têm para dizer. Preocupa-nos muito esta questão da dignidade, porque eles têm de ser ouvidos.

Estão aliás a trabalhar numa Convenção dos Direitos das Pessoas Idosas...
Estamos a trabalhar com as Nações Unidas, em conjunto com outras organizações, para elaborar uma Convenção, tal como existe para as crianças ou para as mulheres. Houve um primeiro esboço feito por peritos universitários, que não tinha o contributo dos idosos. Por isso foi pedido a uma especialista independente da Argentina que está a recolher informação sobre a situação nos diferentes países, e que em Setembro entregará um relatório, que será importante para um novo esboço. Ela já fez, aliás, um primeiro relatório sobre esta realidade.

E chegou a que conclusões....
Apontou alguns caminhos importantes. A ideia é que a idade já não é o limite, mas que é a saúde que define a altura em que deixamos de ser activos e autónomos. Esta é uma discussão importante, porque a definição cronológica do envelhecimento já não deve ser um critério. Se conseguirmos mantermo-nos autónomos vamos conseguir ter uma vida activa. E a grande maioria dos idosos na Europa é autónoma. Na Dinamarca, 83% dos mais velhos são autónomos e 17% estão dependentes. E nós muitas vezes focamos a nossa atenção nestes idosos dependentes, que não representam a maioria.

Um dos grandes problemas desses idosos activos é o afastamento do mercado de trabalho. A tendência é a de aumentar progressivamente a idade da aposentação, para reduzir o peso dos gastos das pensões...
Se a idade continuar a ser um indicativo para a reforma, o número de pensionistas não vai parar de crescer. Se houver uma opção de prolongamento do emprego, essa pode ser uma solução para aliviar o peso sobre os sistemas de pensões. Na Dinamarca, onde a partir dos 65 anos podemos candidatar-nos à aposentação, o Governo criou recentemente benefícios para quem quer prolongar a vida activa. Se uma pessoa trabalhar mais um ano além dos 65, terá um bónus de dois por cento no valor da reforma estatal. Esse bónus vai aumentando com o tempo, passando para 6%  ao fim de dois anos de trabalho extra e pode chegar até um aumento de 25% no montante da reforma que o trabalhador receberá quando se aposentar.

No mês passado foi lançada uma campanha europeia para tornar os locais de emprego mais atractivos para os mais velhos...
Na minha associação na Dinamarca, a DaneAge que representa 750 mil pessoas com mais de 65 anos, já estamos a discutir com as empresas formas de o fazer. Não têm de ser empregos a tempo inteiro, podem ser empregos a part-time. E esse trabalho pode implicar mudanças de funções: Um director pode deixar o cargo e passar a ser consultor ou a ter outras funções, mas com menos responsabilidades.

Qual tem sido a resposta das empresas?
Perceberam que há vantagens em manter estas pessoas no mercado, porque têm uma experiência profissional que deve ser preservada. Aliás, no país, o programa de reformas antecipadas do Governo não deu mais emprego aos jovens. Os mais velhos têm mais experiência e um jovem nunca os poderá substituir.

E que outros projectos tem a Dinamarca para dar resposta aos problemas sociais?
Temos um programa de combate à solidão, que afecta tanto os idosos como os mais jovens. Neste momento, estamos a sentá-los à mesa às refeições para que comecem a relacionar-se entre uns e outros, a conversar. Cada pessoa tem de escolher alguém que conheça e que possa beneficiar deste programa, levando-a a um restaurante para almoçar. Temos também 240 grupos de voluntários que trabalham exclusivamente em programas como os de apoio às famílias de idosos com demências. Estes familiares estão muitas vezes sobrecarregados e desenvolvemos programas para os aliviar, dando-lhes possibilidade de terem algum tempo livre. Muitos destes projectos podem ser replicados e adaptados a outros países.

Fala-se cada vez mais num sector de mercado destinado aos mais velhos, a chamada “silver economy”.
As empresas estão a aperceber-se que o poder de compra das pessoas idosas é maior do que o das gerações mais novas, onde até agora a maioria do mercado tem focado a sua atenção. Apercebem-se de que vale a pena desenvolver produtos que sejam actrativos para as gerações mais velhas, seja na área tecnológica, seja no turismo. É uma forma de impulsionar a economia europeia. É um grande mercado e uma grande oportunidade. 

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