Em Marte, no Verão, a água ferve aos zero graus

Cientistas fizeram várias experiências com água gelada colocada no cimo de um monte de areia, simulando as condições de pressão atmosférica em Marte.

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Câmara de simulação usada nas experiências para recriar a atmosfera de Marte DR

O aspecto da superfície de Marte, com estrias marcadas nas suas encostas, pode ser o resultado de água a ferver que escorre sob a baixa pressão atmosférica do planeta, segundo um estudo publicado na revista Nature Geoscience. Os cientistas tinham colocado a hipótese de estes canais e sulcos marcados nas encostas de Marte terem sido formados por água líquida muito salgada que escorreria sazonalmente no planeta vermelho.

Em Setembro, uma equipa de cientistas da NASA anunciou a existência água salgada em Marte. Era o resultado de análises às estrias escuras que foram descobertas em 2011 e que surgem e desaparecem todos os anos no planeta. Alfred McEwen, um dos autores desse artigo também publicado na Nature Geoscience e investigador principal da Experiência Científica de Imagens de Alta Resolução, um aparelho que pertence à Mars Reconnaissance Orbiter, a sonda da NASA que está a orbitar Marte desde 2006, adiantou na altura que “a água que escorre em Marte é muito, muito mais salgada do que a dos oceanos da Terra”.

Apesar de existir gelo no Pólo Norte de Marte, a existência de água líquida num planeta que tem uma temperatura média de 63 graus Celsius negativos e uma atmosfera finíssima sempre foi considerada altamente improvável. Na Terra, a água precisa de atingir os 100 graus Celsius para a ebulição. Porém, quanto maior a altitude mais diminui a pressão atmosférica, o que significa, por exemplo, que no topo do Evereste a água ferve aos 60 graus. Em Marte, com uma atmosfera bem menos densa do que a da Terra, a água entra em ebulição a partir dos zero graus.

Durante o Verão marciano, quando o gelo subterrâneo começa a derreter e aparece à superfície, numa altura em que a temperatura média ronda os 20 graus, a água começa imediatamente a ferver. Uma equipa de investigadores franceses, ingleses e norte-americanos liderada por Marion Massé, do Centro Nacional de Investigação Científica da Universidade de Nantes, em França, fez uma série de experiências simulando as condições atmosféricas do planeta vermelho.

Os cientistas colocaram um pedaço de gelo em cima de um talude inclinado a 30 graus e coberto de areia. Na atmosfera da Terra, este gelo infiltra-se lentamente na areia sem alterar a sua superfície. Em Marte é diferente. O gelo entra imediatamente em ebulição e o gás libertado faz levantar grãos de areia. Os grãos acumulam-se em pequenos montículos íngremes que, logo a seguir, se desmoronam causando verdadeiras avalanches de areia.

“Os fenómenos observados na areia usada nestas experiências são extremamente semelhantes aos vestígios observados em Marte”, afirmou Wouter Marra, da Faculdade de Utrecht, na Holanda, que comentou este estudo.

Para os investigadores, a existência de água líquida em Marte, mesmo que seja só em quantidades diminutas, a ferver e durante as horas mais quentes do Verão, desempenha um papel importante. E a instabilidade da água parece ainda aumentar significativamente o seu impacto sobre a morfologia da superfície do planeta. 

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