Comissão prevê derrapagem de 900 milhões no orçamento deste ano

Bruxelas alerta para aumento do défice estrutural e prevê menos crescimento em Portugal.

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Pierre Moscovic, comissário dos Assuntos Económicos e Financeiros, aqui na apresentação das previsões de Outono, em Novembro passado REUTERS/Yves Herman

A Comissão Europeia continua sem acreditar que o Governo será capaz de atingir as metas orçamentais a que se propôs com as medidas de consolidação até agora anunciadas. Bruxelas prevê um défice público abaixo de 3% este ano, mas 0,5 pontos percentuais acima do objectivo do Governo. E o défice estrutural, em vez de descer, continua a subir, segundo a Comissão.

Nas Previsões de Primavera divulgadas esta terça-feira em Bruxelas, os responsáveis do executivo europeu calculam que as mudanças realizadas por Lisboa ao orçamento para 2016 durante as negociações com a Comissão não serão suficientes para garantir o cumprimento das metas orçamentais estabelecidas.

A Comissão prevê, para este ano, um défice público de 2,7% do PIB, um valor que fica 0,5 pontos percentuais, ou cerca de 900 milhões de euros, acima dos 2,2% projectados no OE para 2016. Bruxelas garante que, para efectuar este cálculo, levou em conta “as especificações detalhadas de todas as medidas incluídas no orçamento para 2016. 

O facto de a previsão do défice português mesmo assim ficar abaixo de 3% significa que se abre a possibilidade de o país sair no final deste ano do procedimento por défices excessivos em que se encontra, depois de em 2015 ter registado um défice público de 4,4%.

Em contrapartida, Bruxelas dá ainda mais sinais de que não está satisfeita com o esforço de consolidação orçamental feito pelo executivo português. No decorrer das negociações com a Comissão Europeia no início do ano, o Governo prometeu uma redução do défice estrutural (o indicador que dá conta da evolução do défice retirando da análise as medidas extraordinárias e o efeito da conjuntura económica) de 0,3 pontos percentuais em 2016.

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Agora, a Comissão Europeia prevê que o défice estrutural não irá descer em Portugal, mas sim subir, em mais 0,2 pontos percentuais. Mais uma vez uma diferença de 0,5 pontos percentuais do PIB (cerca de 900 milhões de euros) em relação ao Governo. Bruxelas explica que este resultado se deve “ao volume limitado das medidas de consolidação orçamental”.

Para 2017, a Comissão prevê um défice público de 2,3%, um valor que fica acima dos 1,4% previstos pelo Governo no Programa de Estabilidade, e um défice estrutural novamente a subir, mais 0,3 pontos percentuais. “Na ausência de novas medidas de consolidação suficientemente especificadas, o saldo estrutural deverá continuar a deteriorar-se ligeiramente”, diz o relatório.

Bruxelas decide no final do mês

Depois da apresentação da sua proposta de orçamento, o Governo português acordou com o Eurogrupo que se comprometeria a apresentar uma lista de novas medidas de consolidação orçamental para utilizar no caso de derrapagem das metas orçamentais estabelecidas. Para já, o Governo tem defendido que apresentar esse “plano B” não é necessário, uma vez que os dados da execução orçamental vão no sentido necessário.

Uma opinião que, aparentemente, não é partilhada pela Comissão Europeia, que alerta ainda para a existência de riscos. "Os riscos para o cenário orçamental estão inclinados para a negativa, por causa das incertezas que rodeiam o cenário macroeconómico, as possíveis derrapagens na despesa e a potencial falta de acordo em relação a novas medidas de consolidação para 2016 e 2017", afirma o documento publicado esta terça-feira.

Durante o mês de Maio, as autoridades europeias irão proceder à avaliação da situação orçamental portuguesa no âmbito do procedimento por défice excessivo. Ao manter um défice acima de 3% em 2015, Portugal sujeita-se a que lhes sejam aplicadas sanções, uma decisão em que entre os factores considerados está a avaliação realizada ao esforço de consolidação que está a ser feito pelo país.

Esta terça-feira, na conferência de imprensa de apresentação das Previsões de Primavera, Pierre Moscovici, quando questionado sobre o futuro de Portugal no procedimento por défice excessivo, disse que é preciso paciência. O comissário europeu com a pasta da economia reafirmou que a decisão será apresentada no final deste mês e preferiu remeter quaisquer comentários sobre a necessidade de implementar ou não medidas orçamentais para então. "Têm que ser um pouco pacientes. Não vou comentar uma decisão que terá de ser tomada mais tarde", disse. 

Nas suas previsões em relação a Portugal, a Comissão Europeia traça igualmente um cenário menos optimista no que toca à recuperação económica no país. Portugal deverá registar um PIB de 1,5% este ano e 1,7% em 2017, de acordo com as mais recentes previsões económicas de Bruxelas.

Ambas as previsões foram revistas em baixa pelo executivo em 0,1 ponto percentual em comparação com as últimas estimativas feitas em Fevereiro. E ficam abaixo das projecções do Governo que aponta para uma variação do PIB de 1,8% em ambos os anos.

A principal diferença entre as previsões da Comissão e as do Governo reside na evolução esperada para a procura interna este ano. Bruxelas não está nada convencida da possibilidade de tanto o investimento como o consumo privado poderem apresentar o desempenho que é esperado pelo Governo.

No caso do investimento, a sua previsão aponta para um crescimento deste indicador de 1,6% este ano, o que representa uma desaceleração face aos 3,9% de 2015. Já o Governo acredita que o investimento pode acelerar para uma taxa de crescimento de 4,9% em 2016. No relatório, a Comissão explica este pessimismo em relação ao investimento, com os dados já disponíveis para este indicador no final de 2015 e arranque de 2016 e que, diz, mostram uma forte desaceleração, com efeitos potenciais para o resto deste ano.

No que diz respeito ao consumo privado, enquanto o Governo espera apenas um ligeiro abrandamento de uma taxa de 2,6% em 2015 para 2,4% em 2016, a Comissão aponta para uma taxa de variação de apenas 1,8%. Bruxelas até assume que as medidas de reposição do rendimento nos escalões mais baixos e o aumento do salário mínimo pode ter um efeito positivo no consumo no curto prazo, mas defende que tal não será sustentável, com a subida dos impostos indirectos e a ligeira subida dos preços dos combustíveis a prejudicarem.

No que diz respeito às exportações, a Comissão é ligeiramente mais pessimista do que o Governo para este ano (crescimento de 4,1% contra 4,3%), mas mais optimista em relação a 2017 (5,1% em vez de 4,9%).

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