Credibilidade das regras orçamentais europeias está “em risco”

Vítor Manuel Caldeira, presidente do Tribunal de Contas Europeu, diz que relutância da Comissão Europeia em aplicar sanções põe em causa as regras orçamentais.

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Reuters/Francois Lenoir

A Comissão Europeia nunca aplicou sanções aos países que desrespeitam os compromissos orçamentais. De acordo com Vítor Manuel Caldeira, presidente do Tribunal de Contas Europeu, tal atitude levanta sérios riscos à credibilidade das regras Europeias.

 Num relatório de avaliação ao procedimento por défice excessivo, publicado esta terça-feira, o Tribunal de Contas Europeu nota que “há falta de consistência e transparência” na aplicação das regras que ditam que os Estados-membros não devem registar défices acima dos 3% do PIB nem uma dívida pública acima dos 60% do PIB.

 No relatório que avaliou a implementação do procedimento entre 2008 e 2015 em seis países (França, Alemanha, Itália, Malta, República Checa e Chipre), o executivo notou ainda que a Comissão Europeia não usou todos os instrumentos à sua disposição para garantir que os respectivos governos corrigissem os seus orçamentos, nomeadamente sanções.

 “É claro do nosso relatório que a Comissão é relutante em usar esse mecanismo de execução [sanções]”, afirmou Vítor Manuel Caldeira ao PÚBLICO.

 “Tal levanta riscos de que os Estados-membros passem a acreditar que sanções nunca serão aplicadas. Uma percepção que põe em risco a eficiência e a credibilidade do procedimento por défice excessivo”, sublinhou.

 O assunto é extremamente político. Há vários governos a argumentar que se o país A não recebeu sanções e tem maior capacidade económica que o país B, porque haveria o último de receber multas por falta de cumprimento das regras?

 Vítor Manuel Caldeira prefere manter-se imparcial neste aspecto. Quando questionado se seria mais fácil ver um país com um maior potencial económico, como França, ou um outro com menor potencial económico, como Portugal, sancionado, disse que prefere não especular. “O simples facto é que até hoje não foi aplicada qualquer sanção.”

O relatório chama ainda a atenção para a aparente ignorância da regra relativamente à divida nacional. Todos os Estados-membros parecem cientes que na prática deviam registar um défice inferior a 3% do PIB, mas parecem menos esclarecidos que também não devem ultrapassar uma divida acima dos 60% do PIB.

 “O critério da divida foi introduzido mais tarde e está a ser implementado aos poucos”, disse Vítor Manuel Caldeira. “Pedimos à Comissão para se concentrar de perto nos desenvolvimentos das dívidas, especialmente nos Estados-membros onde esta é mais elevada”, continuou.

 Portugal foi deixado fora desta análise, até porque esteve sob um programa de ajuda financeira entre 2011 e 2014.

No que diz respeito ao Procedimento por Défice Excessivo que implica Portugal, a Comissão Europeia irá pronunciar-se sobre o caso nacional no próximo mês.

O Eurostat prepara-se para publicar esta quinta-feira os números oficiais do défice de 2015 em toda a zona euro, e os resultados não deverão ser satisfatórios para Portugal. Factores como a intervenção no banco Banif fizeram subir o défice para cima do limite de 3% do PIB, o que impossibilita Bruxelas de fechar o procedimento por défice excessivo este ano, como estava planeado.

Resta aguardar para ver se o executivo Europeu irá impor sanções a Portugal por não ter cumprido com os objectivos previamente estabelecidos, ou se, por outro lado, receberá um tempo adicional para corrigir as suas contas.

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