Os erros de palmatória do Governo

Nos últimos dias a equipa de António Costa tem vindo a desperdiçar capital político

Não demorou muito a este Governo ter o seu primeiro ciclo de crise e é muito natural que haja quem entre em euforia, apressando contagens decrescentes que ainda não se vislumbram. Mas é inegável que este tipo de situações, sobretudo se se prolongam no tempo ou se ocorrem em várias frentes, como é o caso, acabam por criar erosão na imagem de uma equipa e afectar a sua performance. Mesmo assim, a demissão do ex-ministro da Cultura João Soares, quatro meses e meio depois da tomada de posse deste Governo e a sua primeira baixa, esteve muito longe de bater o recorde de Henrique Chaves, que não aguentou mais de oito dias na pasta da Juventude, Desporto e Reabilitação no Governo de Santana Lopes, ou os 19 dias que Francisco Murteira Nabo ocupou a pasta do Equipamento Social no primeiro Governo de António Guterres.   

Mas há um aspecto muito curioso neste ciclo de crise que leva já uma semana: as demissões e as polémicas que lhe têm estado associadas devem-se essencialmente a questões ligadas à forma de governação e menos ao conteúdo das políticas. Ou seja, o que tem estado em causa é sobretudo o estilo, para uns "arrogante" para outros "irreflectido", com que certos governantes têm lidado com o exercício do poder. Isto é muito visível na resposta dada por João Soares, via Facebook, à crítica política que Augusto M. Seabra lhe fez em artigo publicado neste jornal. Mas também na falta de tacto com que Azeredo Lopes tratou o caso do Colégio Militar, esquecendo-se que se pode e deve ser rigoroso na defesa das questões de princípio, sem pôr em causa o relacionamento com um sector tão sensível como é o das Forças Armadas. Ou seja, estes dois políticos são penalizados por terem agido por impulso, justamente o contrário do caso que envolve o primeiro-ministro e o seu amigo Diogo Lacerda Machado: António Costa saiu fragilizado por permitir que uma situação politicamente indefensável se arrastasse ao ponto de o obrigar a agir sob pressão da opinião pública e dos partidos à esquerda e à direita.

Nesta crise que abalou pesos pesados da governação demitiu-se também o secretário de Estado da Juventude e Desporto, com justificações que bem podem fazer luz sobre uma outra bomba-relógio que vai fazendo um tique-taque de desfecho cada vez mais previsível: o ministro da Educação. Diz João Wengorovius Meneses que sai "em profundo desacordo" com Tiago Brandão Rodrigues, quer quanto às políticas seguidas, quer quanto "ao modo de estar" no exercício de cargos públicos. Elucidativo.

Talvez seja o momento de o Governo fazer uma reflexão interna, porque estas coisas para já não matam, mas vão moendo. Por outro lado, não deixa de ser pueril desperdiçar capital político por erros de palmatória. Além de que o abraço do Presidente da República não dura para sempre e o ambiente económico está cheio de imponderáveis. E isso não deixará de pesar no humor dos partidos que apoiam o Governo.

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