No debate Draghi vs Schäuble, o FMI está do lado do banco central

Fundo reviu em baixa previsões para a economia mundial, vê a zona euro a abrandar este ano e alerta para os riscos de deflação

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Christine Lagarde defende que a política monetária do BCE está a seguir no sentido correcto AFP PHOTO ERIC PIERMONT

Na luta cada vez mais evidente entre Mario Draghi e Wolfgang Schäuble sobre qual deve ser a política económica seguida na zona euro, Christine Lagarde confirmou esta quarta-feira que está do lado do presidente do banco central.

O Fundo Monetário Internacional (FMI) liderado por Lagarde defendeu nas Previsões de Primavera agora publicadas que na zona euro a política monetária deve continuar a ser muito expansionista e que os países que têm espaço de manobra orçamental como a Alemanha devem dar uma ajuda com mais investimento público, mesmo que isso signifique metas para o saldo orçamental menos ambiciosas.

O ministro das Finanças da maior economia europeia não deve ter gostado do que ouviu. O presidente do Banco Central Europeu (BCE) ter-se-á sentido um pouco mais confortado.

Nos últimos dias, o debate entre Schaüble e Draghi, que tem sido uma constante desde 2012, subiu ainda mais de tom. O presidente do BCE já tinha defendido em Março, num tom provocador aos seus críticos, principalmente na Alemanha, que se o BCE não tivesse feito nada, o resultado seria uma “deflação desastrosa”. O ministro alemão, em resposta, afirmou esta terça-feira que “é inquestionável que a política de taxas de juro baixas está a causar enormes problemas aos bancos e ao sector financeiro alemão”. E no dia anterior, a agência de notícias Dow Jones citava uma conversa de Schäuble com outros responsáveis em que este teria culpado Draghi pela subida eleitoral do partido anti-euro Alternativa para a Alemanha. “Eu disse a Mario Draghi: deve estar muito orgulhoso – pode atribuir 50% dos resultados de um partido que parece ser novo e bem-sucedido na Alemanha a esta política monetária”, terá afirmado o ministro.

Schäuble, que expressa uma visão que é bastante corrente na opinião pública alemã,  considera que a decisão do BCE de colocar as taxas de juro a níveis mínimos históricos e de efectuar volumosas compras de dívida pública nos mercados penaliza aqueles que poupam e pode vir a criar condições para um período futuro de inflação. O ministro defende que a única forma de colocar a economia europeia a crescer é por via de reformas estruturais, recusando igualmente a aplicação de estímulos orçamentais.

No FMI, contudo, apesar de também se defender a importância das reformas estruturais, a visão é em tudo semelhante à que tem sido defendida por Draghi para a política monetária e orçamental.

No relatório sobre a economia mundial agora publicado, os responsáveis do FMI explicam que o problema na zona euro é que “os efeitos da procura externa mais fraca são mais fortes do que os efeitos favoráveis da descida dos preços da energia, da modesta expansão orçamental e das melhores condições financeiras”, voltando a avisar para o risco que constitui a manutenção por um período de tempo tão longo de um cenário em que a taxa de crescimento da economia e a inflação permanecem a níveis tão baixos.

E por isso, as soluções defendidas pelo Fundo para a Europa são as mesmas já apresentadas em relatórios anteriores: a continuação de uma política monetária expansionista, a realização de reformas estruturais e a aplicação de políticas orçamentais expansionistas pelos países que tenham espaço de manobra para isso, sendo o caso da Alemanha o mais evidente de todos.

O Fundo faz estas recomendações no meio de uma conjuntura internacional que vê como bastante perigosa. Nas suas Previsões de Primavera, a entidade liderada por Christine Lagarde viu-se forçada a rever novamente em baixa as suas projecções para a economia mundial e deixou um aviso: tudo poderá ser ainda pior se a instabilidade nos mercados financeiros regressar, a China falhar a sua aterragem suave e as economias avançadas como a da zona euro caírem na armadilha da deflação.

O crescimento da economia mundial agora previsto de 3,2% em 2016 compara com os 3,4% previstos em Janeiro e os 3,6% apresentados nas Previsões de Inverno, feitas em Outubro. Para 2017, a previsão de crescimento também foi revista de 3,6% para 3,5%, quando em Outubro era de 3,8%.

Para a zona euro, o FMI passou mesmo a prever um abrandamento da economia, dos 1,6% de 2015 para 1,5% em 2016. Antes, em Janeiro, previa uma ligeira aceleração, para 1,7%. Em Outubro, apontava para 1,9%.

A revisão de 0,2 pontos percentuais para a zona euro é ditada principalmente com a deterioração das expectativas no mesmo nível para as duas maiores da região, a Alemanha e França. Mas as mudanças são semelhantes em praticamente todos os países, incluindo Portugal.

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