Os psicólogos e a sustentabilidade do SNS

A transversalidade do trabalho dos psicólogos a vários sistemas exige um plano integrado que aglomere o contributo da Psicologia e dos psicólogos.

Os psicólogos são cada vez mais procurados pelos portugueses para apoio e ajuda nas mais variadas situações de saúde psicológica. Todavia, o acesso aos cuidados de saúde psicológica continua muito comprometido pelo escasso número de psicólogos no Serviço Nacional de Saúde (SNS),em particular nos cuidados de saúde primários. Hoje, pese embora a crescente procura e toda a investigação que afirma a eficácia e a custo-efetividade das intervenções psicológicas, continua a ser comum existirem centros e unidades de saúde sem qualquer psicólogo ou centros de saúde onde 20h semanais de um psicólogo servem uma população que pode chegar aos 40 mil utentes.

Esta situação é particularmente grave se for tida em conta a necessidade urgente de afectar mais psicólogos e mais trabalho de psicólogos à prevenção em saúde, enquanto especialistas na mudança comportamental, nomeadamente nas questões associadas aos hábitos e estilos de vida saudáveis e às doenças crónicas, como por exemplo a obesidade, a diabetes ou mentais como a depressão e ansiedade.

O caminho até agora trilhado pelo SNS é insustentável pois não consegue responder e travar as crescentes necessidades dos cidadãos tanto ao nível da saúde física como psicológica. Em ambas o psicólogo pode ajudar. E pode ajudar estando disponível para intervenções que em ambos os casos poderão evitar sofrimento no próprio e na família causado pelo adiamento das respostas terapêuticas o que aumenta consideravelmente a probabilidade das patologias se agravaremcom o consequente agravamento do custo da terapêutica e do período de intervenção (baixa médica, possibilidade de internamento, ...).

O psicólogo, intervindo preventivamente na mudança de comportamentos ou precocemente aquando dos pedidos de ajuda iniciais, poderá evitar sofrimento desnecessário, bem como custos acrescidos para o Estado. Em Portugal, e só no que se refere a medicamentos com a diabetes, poderíamos obter uma poupança estimada anual de cerca de 63 milhões de euros, com intervenções psicológicas (intervenções comportamentais, promoção da adesão à terapêutica, apoio emocional e/ou promoção da alteração dos estilos de vida).

Para a sustentabilidade do SNS contribuiriam ainda ações urgentes fora do próprio SNS. Neste âmbito enquadra-se o necessário reforço do trabalho dos psicólogos no sistema educativo, onde as suas respostas, além de prevenirem problemas futuros e promoverem comportamentos de autocuidado,evitariam o recurso ao SNS para situações de necessidades educativas especiais ou dificuldades de aprendizagem, entre outras. Neste quadro estão ainda envolvidas as empresas e organizações em geral que poderão e deverão realizar mais actividades de avaliação de riscos psicossociais dos seus colaboradorese intervir mais preventivamente nas situações de stress e burnout, garantindo ganhos de produtividade e evitando que cheguem mais situações destas ao SNS. Nestas actividades está reconhecido o papel central do psicólogo pela Agência Europeia para Saúde e Segurança no Trabalho e pela Autoridade para as Condições do Trabalho. Poderíamos a esta lista acrescentar: o reforço dos Psicólogos nos serviços prisionais, nos organismos da Segurança Social, nas Autarquias, nas IPSS ou nos Centros de Dia / Lares de Idosos como intervenções sustentáveis e de elevado retorno ao evitar sofrimento, custos desnecessários e o recurso ao SNS.

Neste novo ciclo político e agora que acaba de ser aprovado um novo orçamento para o país, é necessário agir. A transversalidade do trabalho dos psicólogos a vários sistemas, o seu contributo para a sustentabilidade do SNS, para o bem-estar físico, social e psicológico dos cidadãos e para o desenvolvimento económico da sociedade, exige um plano integrado que aglomere o contributo da Psicologia e dos psicólogos. É imperativo um compromisso de médio prazo com Estado e o seu Governo. Mas urge a criação de condições para imediatamente se concretizarem medidas que não podem mais esperar.

Coordenador do Contributo dos Psicólogos para a Sustentabilidade do SNS e Director Executivo da Ordem dos Psicólogos Portugueses

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