Assunção Cristas e as baixas expectativas

Será que Nuno Melo, Mota Soares e João Almeida perderam a sua oportunidade?

Não vai ser fácil suceder a Paulo Portas, um líder que formalmente esteve 16 anos à frente do CDS/PP, mas cuja influência nas decisões e nos momentos cruciais moldaram o destino e o perfil do partido desde 1992. Com um estilo muito peculiar na acção e na mensagem, um método de decisão iminentemente solitário e uma orientação doutrinária errática durante grande parte do seu consulado – populista e anti-europeia na primeira fase, europeísta e de regresso à matriz democrata-cristã na segunda –,  Portas foi levando o partido do inferno ao céu com a mesma convicção dos crentes perante os mistérios da fé. Poucos ousaram questioná-lo não por obstrução do próprio, mas basicamente porque o CDS/PP viveu enlevado com um líder que exercia sobre a militância o mesmo poder de atracção e a mesma irracionalidade com que as mariposas são ofuscadas pela luz. Talvez seja por isso que Ribeiro e Castro, um ex-líder muito crítico do consulado Portas, continue muito cáustico sobre este período. “Esta direcção é toda conivente com os desmandos no partido”.

Se desmandos houve, a verdade é que a saída de Portas não suscitou qualquer espécie de movimento de libertação para soltar as grilhetas de quem se sente de algum modo aprisionado pela longevidade de um líder carismático. Pelo contrário, o CDS chega a este congresso surpreendentemente calmo, com uma única candidatura à liderança e cuja preparação não desencadeou nem guerra nem barafunda. É estranho, mas pode explicar-se. Desde logo, porque dois dos principais protagonistas de futuro (Pedro Mota Soares e João Almeida) estão consumidos por quatro de anos de poder sob os auspícios da troika e porque Nuno Melo, que muitos tomam por líder natural de Paulo Portas, não quer chegar desgastado ao momento mais propício para tomar o poder, ou seja, num horizonte de eleições à vista.

Ao contrário do que sucedeu no PSD, os centristas perceberam logo que o Governo absolutamente minoritário de António Costa apoiado por dois parceiros muito difíceis e suspenso por acordos de geometria variável e consistência fluida, é capaz de durar bem mais do que o esperado. Razões de conjuntura e o insustentável regresso de uma desunião por motivos fúteis, trará aos partidos de esquerda perdas irreparáveis. Depois, há o precedente de uma união que afinal até funciona. As vicissitudes de um partido pequeno ajudam a não fazer dos desejos realidades e a refrear ambições. Foi isso o que aconteceu com aqueles três importantes dirigentes do CDS, que encaram Assunção Cristas como uma líder de transição, cuja candidatura só avança à custa do apoio táctico das tropas de Nuno Melo e do compasso de espera que se impuseram Mota Soares e João Almeida. Talvez se enganem. Cristas não só tem demonstrado a vontade e a determinação de quem veio para ficar, como se propõe mexer de alto a baixo no partido, sem medo de abalar os interesses instalados. Ou seja, quer construir a sua própria equipa, nos seus termos. Com um programa que deita borda fora o tempo dos “nichos” de votantes e a proposta de um método de decisão mais colegial. As baixas expectativas costumam ajudar.

 

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