PS aponta "falta de confiança" no Banco de Portugal e defende mudanças

Em Bruxelas, António Costa lembra estatuto próprio do governador e repete críticas a Carlos Costa. PS e PCP juntam-se ao BE para pedir relatório da auditoria ao BdP. Passos admite "graves" problemas no caso dos lesados.

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O presidente do PS e líder da bancada parlamentar fez duras críticas à actuação de Carlos Costa. Enric Vives-Rubio

O líder parlamentar e presidente do PS defendeu esta quinta-feira mudanças no Banco de Portugal (BdP), considerando que os depositantes e utilizadores do sistema financeiro têm de recuperar a confiança e que a imagem do regulador é de crescente fragilidade. Em Bruxelas, também o primeiro-ministro António Costa repetiu as críticas ao governador do Banco de Portugal no caso dos lesados do BES, embora salientando o estatuto de independência de que goza a instituição.

No Parlamento, no final da reunião da bancada do PS, Carlos César foi questionado pelos jornalistas sobre se o PS entende que o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, deve deixar o cargo.

"Há uma realidade que os portugueses vivem: de alguma falta de confiança, ou pelo menos de uma avaliação frágil, quer dos depositantes, quer dos utilizadores do sistema bancário, em relação ao regulador, o Banco de Portugal", sustentou o presidente da bancada socialista. De acordo com Carlos César, "a fragilidade detectada na actuação do Banco de Portugal não tem sido minorada tendo, pelo contrário, sido agravada".

"Seguimos sempre com alguma preocupação a acção do Banco de Portugal e, em particular, o caso dos lesados do BES (Banco Espírito Santo), em relação ao qual há uma lentidão excessiva na tomada das decisões necessárias para que esse processo tenha o andamento adequado", referiu o presidente do PS, a título de exemplo. Para o líder da bancada do PS, em termos mais imediatos, será importante que o Banco de Portugal "seja mais regenerado e que recupere os níveis de confiança que os depositantes e utilizadores do sistema bancário requerem".

"Estou convencido que alterações muito radicais no Banco de Portugal, numa fase em que existem fragilidades múltiplas nos planos interno e externo, não são prioridade. Mas é prioridade uma mudança de pró-actividade e um melhor desempenho ao nível da precaução por parte do Banco de Portugal, tendo em vista que o sistema financeiro português recupere a sua credibilidade e o equilíbrio que necessita", contrapôs o ex-presidente do Governo Regional dos Açores.

Interrogado se o PS defende claramente que o governador do Banco de Portugal, Carlos Costa, deve abandonar as suas funções a curto prazo, Carlos César fez uma pausa por alguns segundos e respondeu: "Não devem existir perturbações excessivas no Banco de Portugal que agravem as fragilidades que hoje já conhecemos no sistema financeiro e na confiança interna e externa, quer no regulador, que nos bancos em geral."

Ou seja, segundo Carlos César, no plano imediato, "o melhor seria que o Banco de Portugal resolvesse os problemas que tem pendentes e que não está a resolver" e, por outro lado, "que recuperasse a confiança por parte dos depositantes e dos utilizadores do sistema bancário, de forma a que o país viva com maior tranquilidade".

O presidente do Grupo Parlamentar do PS defendeu mesmo que o sector financeiro está "a penalizar muito a imagem externa do país e está a comprometer muito a confiança dos cidadãos e das empresas". Este sector, acrescentou Carlos César, "onera especialmente a execução orçamental para o próximo ano e neste ano corrente".

António Costa mais prudente
Já o primeiro-ministro, António Costa, escusou-se a comentar, em Bruxelas, se Carlos Costa deve abandonar o cargo de governador do Banco de Portugal (BdP), recordando que a instituição "goza de independência". Na sequência das críticas que tem feito ao BdP na gestão da questão dos lesados do Banco Espírito Santo (BES), António Costa foi questionado sobre se Carlos Costa deve deixar a liderança da instituição e respondeu que "o BdP goza de independência e o governador goza de um estatuto próprio".

À saída de um encontro com o presidente da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, o primeiro-ministro português reafirmou o desejo de o BdP não adiar por "mais tempo aquilo que é o mínimo num Estado de direito", no qual "é absolutamente necessário assegurar a todos os cidadãos que os seus direitos e as suas pretensões sejam apreciadas e os seus direitos sejam protegidos".

"Um processo de segurança jurídica, rápido, eficaz e acessível a todos", resumiu António Costa, referindo que devem ainda ser apuradas as responsabilidades e pagas eventuais indemnizações. O chefe do executivo notou a "notável paciência ao longo destes meses e contenção" dos lesados do BES, ao enumerar "famílias a viver situações dramáticas", por terem perdido as "poupanças de uma vida de trabalho".

António Costa repetiu os elogios à "atitude muito colaborativa e empenhada" da Comissão do Mercados de Valores Mobiliários, aos BES e à administração do Novo Banco neste processo.

Na quarta-feira, em Aveiro, o primeiro-ministro tinha acusado o BdP de estar "a arrastar uma decisão" sobre os lesados do BES, dizendo que está a impedir uma solução já aceite pelas partes. "Tenho que lamentar a forma como a administração do Banco de Portugal tem vindo a arrastar uma decisão sobre esta matéria, a impedir que rapidamente a solução proposta pelo Governo e aceite pela maioria dos lesados do BES pudesse estar já implementada", criticou, manifestando esperança que "tão rapidamente quanto possível o BdP assuma a postura responsável que todas as entidades públicas e privadas estão disponíveis assumir".

O Governo propôs um mecanismo de conciliação, mediação e arbitragem para tentar resolver o problema dos lesados do BES.

Passos admite "factos que têm gravidade", mas não especifica
Também em Bruxelas, onde se encontra para uma reunião do PPE sobre a cimeira europeia, Pedro Passos Coelho assumiu que há factos "graves" no processo dos lesados do BES. "Há factos que têm gravidade, não vou disfarçar, e que se estão a passar em Portugal nessa matéria, mas não quero fazer em Bruxelas nenhum comentário sobre isso", afirmou o ex-primeiro-ministro.

Porém, quando questionado pelos jornalistas sobre que factos são esses e se o governador tem condições para se manter no cargo, Passos Coelho disse que essas questões são "graves" e "merecem ser devidamente respondidas em Lisboa" e não em Bruxelas.

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PS, BE e PCP querem relatório
O Bloco de Esquerda entregou na quarta-feira um requerimento na comissão de inquérito ao Banif para a divulgação do relatório da consultora BCG sobre a actuação do BdP no caso do BES que alegadamente admitirá que houve uma "falta grave" da supervisão no processo do Banco Espírito Santo. O PS, pela voz de João Galamba, e o PCP, com Miguel Tiago, já se vieram juntar aos bloquistas no pedido de divulgação do documento.

No Fórum da TSF desta quinta-feira, o deputado João Galamba defendeu que o relatório "tem de ser conhecido" pelos partidos e pelos portugueses em geral, independentemente de a avaliação ser positiva ou negativa. "Temos o direito de o conhecer e o senhor governador tinha o dever de o tornar público." Se a avaliação é negativa, "o facto de não o fazer [a divulgação] mostra que o senhor governador tem algo a esconder", apontou o socialista que, questionado sobre se o seu partido vai pedir a demissão de Carlos Costa, preferiu defender que a "prioridade do PS" é conhecer o conteúdo do relatório da BCG, que é "essencial para se fazer uma avaliação do BdP e em particular do senhor governador nestes últimos anos".

Mariana Mortágua, que assinou o requerimento do Bloco, realçou que "hoje há muito poucas instituições, muito poucas personalidades e muito poucas vozes capazes de vir a público defender a actuação do governador do Banco de Portugal. Seja pela falta de transparência que teve, pelas vezes em que devia ter agido e não agiu, pela forma como institucionalmente tratou grupos mais fragilizados que dependiam do BdP como o caso dos lesados do BES". Se se confirmar que houve uma "falha grave" por parte de Carlos Costa, o Bloco não vê quaisquer problemas em que se exija a saída do governador.

Na esteira de PS e BE, também o PCP vai pedir acesso ao documento com carácter de urgência e o deputado Miguel Tiago realçou que há muito os comunistas apontam o dedo às "falhas graves do supervisor, quer por acção quer por omissão".

"O Banco de Portugal em alguns casos actua mal e noutros não actua na medida do necessário. Há um conjunto de motivos que justificam que o Ministério das Finanças deva accionar os mecanismos que tem ao seu alcance para poder assegurar que o governador do BdP cumpra a sua função, e se for preciso a sua substituição, a exoneração do actual, isso deve ser um dos recursos", defendeu Miguel Tiago na TSF.

 

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