Quem foi quem em Belém

Na ditadura, só havia uma máquina administrativa. A abertura da vida democrático implicou um corpo de assessores e um conjunto de consultores para apoiar os presidentes.

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Nuno Ferreira Santos

Quando, em 27 de Junho de 1976 e com 61,59% dos votos, Ramalho Eanes se tornou o primeiro Presidente da República eleito após o 25 de Abril de 1974, não se abria, apenas, um novo livro na vida do General nem um capítulo decisivo na consolidação do regime democrático. “Era preciso inventar”, sintetiza, ao PÚBLICO, Joaquim de Aguiar, assessor político de Eanes, como o foi, uma década mais tarde, de Mário Soares. Entre os inventos, constam os serviços internos de apoio ao Presidente. Assim começaram a desfilar nomes, mais tarde identificados como os homens dos presidentes. Uma lista de quem foi quem em Belém, com algumas permanências de décadas de aconselhamento e assessoria técnica.

A nova estrutura nasceu com todos os cuidados. Para não se confundir com a administrativa, herdada da ditadura, que não fora tocada pelas presidências de António de Spínola e Costa Gomes e só teria alterações com Mário Soares. “E para que não pudesse ser vista como um Governo-sombra, com designações idênticas às que se encontram numa estrutura de Governo”, explica Joaquim de Aguiar, gestor e politólogo. Um imperativo, portanto, aconselhado pelo equilíbrio institucional, para não haver suspeitas de interferência ou de acções paralelas às do executivo.

O modus operandi e o ritual de funcionamento eram, em 1976, condicionados pela realidade institucional ditada na Constituição da República. Então, o Presidente da República Ramalho Eanes presidia ao Conselho da Revolução – que viria a ser extinto em 30 de Setembro de 1982 pela primeira revisão constitucional. Uma vez por semana, geralmente antes da reunião do Conselho de Revolução, reunia o núcleo político essencial. Neste núcleo, pontificavam o Chefe da Casa Militar, General Garcia dos Santos, os chefes de gabinete, coronel Barroco e major Pimentel e o assessor político Joaquim de Aguiar. Para outros temas, o chefe da Casa Civil, cargo sucessivamente dirigido por Henrique Granadeiro, economista e gestor, José Caldeira Guimarães, economista, e o embaixador Fernando Reino reunia os assessores das áreas política, económica, representação de interesses, assuntos constitucionais e jurídicos, relações internacionais, assuntos sociais e comunicação social. Os assessores tinham dedicação exclusiva, enquanto os consultores mantinham outras.

“O General Eanes não queria posições conjuntas, ouvia o que cada um queria dizer, não gostava de trabalho prévio”, recorda Joaquim de Aguiar: “os assessores foram escolhidos em termos individuais, não eram representantes de outros.” Em termos de funcionamento corrente, cada assessoria tinha a obrigação de acompanhar a produção legislativa e os debates na sua área de competência de modo a preparar o trabalho de promulgação dos diplomas do Governo e da Assembleia da República. Do mesmo modo, acompanhavam as audiências concedidas pelo Presidente.

Nesta estrutura, então como consultor político, estava Carlos Gaspar, politólogo, que se manteria em funções nesta área com os presidentes Soares e Jorge Sampaio (ver infografia). Foi assim que, há 40 anos, o Presidente da República passou a contar com uma estrutura de apoio, cuja complexidade e número de envolvidos aumentaria significativamente no futuro.

Na presidência de Mário Soares (1986-96), o organograma sofre algumas alterações. Sinal dos tempos, a adesão de Portugal à então Comunidade Económica Europeia, a 12 de Junho de 1985, ditou a criação da assessoria de integração europeia, assegurada pelo economista José Amaral. Outras novidades: assuntos parlamentares, assuntos regionais e locais e cultura e juventude. Esta última, foi confiada ao jornalista José Manuel dos Santos, que se manteve também com Jorge Sampaio, tendo ainda integrado os núcleos políticos dos dois presidentes socialistas.

Por fim, vinda da presidência do conselho de ministros onde já trabalhara com Alfredo Barroso, chefe da Casa Civil de Mário Soares, entra em Belém como consultora jurídica Ana Martinho, que há três décadas se mantém na Presidência da República, tendo sido assessora nesta área de Sampaio e do actual Presidente Cavaco Silva. Quanto ao método seguido, Soares preferia almoços de trabalho com os seus colaboradores às reuniões.

Já Jorge Sampaio adoptou uma outra forma de trabalhar. Às segunda e terça feiras, decorriam reuniões das assessorias política e económica. O seu núcleo político, para além de José Manuel dos Santos, integrava Reis Novais, Carlos Gaspar, o advogado Magalhães e Silva, os historiadores João Serra e Fernando Marques da Costa nas áreas da política – englobando os assuntos parlamentares e regionais - e assuntos jurídicos. Na década de Sampaio em Belém, as questões europeias deixaram de ter uma assessoria autónoma.

No organograma de Aníbal Cavaco Silva, mantém-se uma estrutura clássica de assessorias. Ainda assim, a área da juventude engloba, também, as da educação, ciência e ambiente separando-se dos assuntos culturais. O actual Presidente não tem chefe de gabinete, as reuniões não têm dias fixos e o trabalho dos assessores dedica especial atenção aos eventos em que Cavaco Silva participa, sejam audiências no Palácio de Belém ou saídas. O núcleo político de Cavaco é integrado pelo chefe da Casa Civil, Nunes Liberato, economista, por António Araújo, jurista, pelo sociólogo David Justino e pela jurista Susana Toscano, respectivamente das assessorias política, de assuntos sociais e da juventude, educação, ciência e ambiente. 

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