El Chapo deu entrevista a Sean Penn quando estava em fuga

A revista norte-americana Rolling Stone é o veículo do mais recente desenvolvimento na vida do famoso barão da droga. Procura pela fama terá ajudado à captura do traficante mexicano.

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Joaquín Guzmán quando foi detido em 2014 Ronaldo Schemidt/AFP

O título do artigo da revista norte-americana Rolling Stone é sintético e revelador: “El Chapo fala”. O autor do longo texto e das questões que o famoso El Chapo, o barão da droga mexicano, responde é o actor norte-americano Sean Penn, que foi até ao México para conhecer Joaquín El Chapo Guzmán. O resultado é um longo texto na primeira pessoa com um vídeo onde o traficante assume que as drogas destroem as vidas das pessoas, mas defende que nada mudará no tráfico de droga mundial com a sua morte: “O dia em que eu deixar de existir, isso não vai diminuir em nada.”

Joaquín Guzmán, o chefe infame do cartel de droga de Sinaloa, foi apanhado pelas autoridades na sexta-feira de manhã, na cidade de Los Mochis, no Noroeste do México. A captura aconteceu após um tiroteio sangrento e de uma perseguição intensa onde El Chapo quase conseguia escapar de novo, depois de ter fugido da prisão em Julho, por um túnel com cerca de 1600 metros de comprimento, construído directamente até à sua cela.

A entrevista publicada na Rolling Stone, o último desenvolvimento da impressionante carreira de El Chapo, conta ainda com um vídeo em que o barão da droga surge com um camisa colorida e um boné preto no meio de um ambiente rural. Sean Penn chamou-a “a primeira entrevista que El Chapo deu fora de uma sala de interrogatório”.

As autoridades mexicanas souberam do encontro entre Sean Penn, uma actriz mexicana e Joaquín Guzmán, que decorreu em Outubro e monitorizaram os movimentos do actor norte-americano. O encontro ajudou as autoridades alcançarem o rancho onde El Chapo estava instalado, disseram duas fontes governamentais.

Esta revelação levou a uma primeira tentativa de captura. Apesar de o criminoso mexicano ter escapado por pouco às balas da polícia durante um raide, no estado de Durango, no Norte do México, este primeiro embate foi um passo importante na perseguição policial de El Chapo.

No artigo publicado na Rolling Stone, no sábado, Sean Penn escreve que Guzmán ficou interessado em fazer um filme sobre a sua vida quando foi inundado por pedidos de estúdios dos Estados Unidos, após a captura de 2014, adianta a agência Reuters.

Esta informação faz eco nas declarações do procurador-geral mexicano, Arely Gomez, que na sexta-feira disse que a vontade do barão da droga de aparecer nos ecrãs de cinema ajudou à sua própria captura. “Outro importante aspecto que ajudou a localizá-lo foi descobrir as intenções de Joaquín Guzmán de fazer um filme biográfico. Ele contactou actrizes e produtores, o que se tornou numa linha de investigação [para a polícia]”, disse Arely Gomez citado pela Reuters.

A reunião ao vivo de Sean Penn com El Chapo foi intermediada pela actriz mexicana Kate Del Castillo, que já fez de rainha da droga numa conhecida telenovela. A actriz mexicana acabou por desenvolver uma amizade improvável com o barão da droga. Outra fonte do Governo mexicano disse que as autoridades estavam a considerar se deveriam investigar ou não o actor norte-americano e a actriz mexicana, possivelmente por lavagem de dinheiro. Mas não adiantaram mais nada, adianta a Reuters.

A Rolling Stone publicou uma fotografia de 2 de Outubro onde o actor norte-americano dá um aperto de mão a Joaquín Guzmán. No artigo, Sean Penn revela factos de como Joaquín Guzmán se libertou da prisão, explicando que tinha enviado engenheiros para a Alemanha durante três meses para eles treinarem formas de evitar os problemas de escavar um túnel perto de lençóis freáticos, que existiam por baixo da prisão onde ele estava detido, para que o plano de fuga fosse bem feito, explica a Reuters.

Após o “encontro de sete horas”, Joaquín Guzmán aceitou dar uma entrevista a Sean Penn mais tarde, mas foi impossível realizá-la cara a cara. O traficante respondeu por vídeo às questões de Sean Penn, sem a presença do actor. “Das muitas questões que enviei a El Chapo, o operador da câmara, que está fora do plano, pergunta algumas directamente, refaz outras mantendo o sentido delas, suaviza muitas e outras salta, não as colocando de todo”, escreve Sean Penn.   

No vídeo, El Chapo dá algumas informações sobre a sua actividade. “Eu forneço ao mundo mais heroína, meta-anfetamina, cocaína e marijuana do que ninguém”, assume. “Tenho uma frota de submarinos, de aviões, de camiões e de navios.”

Sean Penn arranca o artigo com uma citação de Michel de Montaigne, humanista francês do século XVI: “As leis da consciência, que nós fingimos que nascem da natureza, descendem dos costumes.” É esta a tese do texto do actor norte-americano, que defende que o nascimento de carreiras como a de El Chapo é o produto de um contexto e de um requisito mundial por drogas, que torna este mercado possível.   

“Bem, é uma realidade que as drogas destroem. Infelizmente, como disse, onde cresci não havia e ainda não há outra forma de se sobreviver, não há outra forma de trabalhar na economia”, diz, por sua vez, El Chapo, que não tinha dúvidas sobre se seria morto ou não pelas autoridades mexicanas, num próximo confronto. “Não, creio que se eles me apanharem, eles detêm-me. De certeza.” Estava certo.  

De acordo com as agências noticiosas, o México quer extraditar Joaquín Guzmán para os Estados Unidos o mais rapidamente possível. É, aliás, como o artigo da Rolling Stone termina: “El Chapo? Tenho a certeza que não demorará muito até que o próximo carregamento para os Estados Unidos do cartel de Sinaloa seja o próprio homem.”

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