Maria de Belém sugere que lei da PMA tenha parecer do Conselho Nacional de Ética

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Rui Gaudêncio

Candidata conduziu, em 2006, a elaboração da lei que regula o acesso à Procriação Medicamente Assistida (PMA). Hoje mantém as dúvidas sobre se esta técnica deve ser reconhecida enquanto método de procriação alternativa e não apenas como terapêutica, como é. E considera que o actual processo legislativo deve contar com o parecer do Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida. Quanto à eutanásia, discorda porque teme que, num país como Portugal, esta técnica possa ser usada com fins matérias de obtenção de património.

Se estivesse na AR, teria votado a lei da PMA na versão do PS, que dá o direito à PMA a mulheres sozinhas e o projecto do BE que fala de maternidade de substituição não remunerada?
Como sabem fui a pessoa que liderou, quer em termos de apresentação de propostas, quer depois de coordenação do grupo de trabalho que deu origem à lei de PMA, que foi a lei moderníssima em termos de direito comparado em 2006. Essa lei tinha uma filosofia que era a PMA ser uma técnica terapêutica, a utilizar em caso de diagnóstico de infertilidade. O alargamento pressupõe que seja um método alternativo de procriação. E está a perguntar-me se eu fosse deputada do PS, não é? No programa do PS, submetido a sufrágio universal, eleitoral, desculpe.

... e universal ...
Constava a alteração da filosofia subjacente à lei da PMA, portanto, é natural que tendo esse programa sido sufragado eu pudesse votar favoravelmente, mas com uma declaração de voto. Porquê? Qual a minha preocupação? A minha preocupação é a seguinte. Eu não sei se houve algum parecer da comissão de ética [Conselho Nacional de Ética para as Ciências da Vida] sobre o projecto-lei nesta formulação.

Está ainda em comissão, poderá haverá.
Acho que deveria haver. Depois, também acho que quem teve responsabilidades como eu tive como ministra da saúde como ministra da saúde e existindo tantas fragilidades no SNS em relação à cura das doenças e à intervenção, sendo esta técnica uma técnica muito cara, eu tenho a preocupação em relação à distribuição equitativa dos recursos. Aquilo que me perturba mais, preocupa mais é que, por exemplo, haja uma lista de espera que compromete o diagnóstico do cancro.

Senhora doutora...
Deixe-me acabar. Portanto, a questão da equidade na distribuição de recursos na saúde é muito importante. Depois há outro aspecto. Tendo em atenção a enorme lista que existe a nível da PMA, a gestão do alargamento do acesso também pode ser muito problemática para as instituições de saúde.

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Por que é que a lei tem de privilegiar casais e a mulher sozinha não pode ser contemplada?
Porque um diagnóstico de infertilidade pressupõe um diagnóstico enquanto gâmeta masculino e feminino.

PNa sua concepção, só deve ser contemplada como terapêutica?
Não foi isso que eu disse. No contexto em que a lei foi aprovada, negociada, para ter uma ampla sustentação.

Mas hoje?
Uma vez que avançamos para técnicas e medidas que não estão contempladas na maioria dos países da Europa Ocidental, como sejam a experimentação em embriões, o diagnóstico pré-natal pré-implantatório e como eu fui gestora desse processo, eu tenderia nessa declaração de voto a referir que sem haver um parecer da comissão de ética preferiria manter a filosofia anterior. No entanto, como a alteração dessa filosofia foi submetida ao eleitorado se o eleitorado aceita, não devo eu inviabilizar. Sobre a maternidade de substituição não remunerada eu fui sempre defensora desde que autorizada caso a caso pelo Conselho Nacional de PMA.

Teria votado a favor da lei que reconhece o direito aos casais do mesmo sexo a candidatarem se a adopção?
Teria votado favoravelmente, também com uma declaração de voto no sentido que houve um grande debate na sociedade portuguesa para que ficasse claro, mais uma vez, que ai o que interessa é assegurar o interesse da criança. Ganhamos muito em fazer debates alargados na sociedade portuguesa sobre estes temas.

É a favor da eutanásia? Deve ser legalizada em Portugal?
Não sou favorável à eutanásia num país em que nós estamos longe de ter ainda um acesso garantido aos cuidados paliativos. Considero que no contexto em que se vive, poderia suscitar-se uma grande perplexidade e um grande receio na sociedade portuguesa de que a eutanásia fosse aplicada de uma forma não controlada ou não controlável. Sabemos que um dos grandes riscos da eutanásia é ela poder vir a ser aplicada tendo em atenção muito mais interesses patrimoniais do que os interesses das pessoas. São matérias muito melindrosas desse ponto de vista. Numa época de crise podia-se suscitar um temor alargado na sociedade portuguesa. Sou contra.

Em relação à morte medicamente assistida?
Também sou contra por estas razões. Reconhecendo toda a legitimidade de quem pensa de maneira diferente.

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