Portucalense e Atlântica estão a funcionar de forma irregular

Universidades não têm nenhum doutoramento acreditado, apesar de estarem legalmente obrigadas a isso.

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A Portucalense recusa a ideia de que esteja em situação irregular Nélson Garrido

A Universidade Portucalense e a Universidade Atlântica têm estado a funcionar nos últimos anos de forma irregular. Apesar de estarem legalmente obrigadas e ter um mínimo de três doutoramentos em funcionamento, não há nenhum curso deste tipo aprovado em ambos os casos. A Direcção-Geral do Ensino Superior (DGES) conhece a situação pelo menos desde 2013, mas não foi tomada nenhuma decisão quanto ao futuro destas instituições privadas de ensino superior.

Os dois casos são distintos. Enquanto a Universidade Atlântica, sediada em Oeiras, nunca teve nenhum doutoramento a funcionar desde a sua fundação em 1996, a Portucalense, do Porto, chegou a ter programas deste tipo, mas a sua acreditação terminou em 2012. Entretanto, ambas as instituições apresentaram novas propostas de formação doutoral para aprovação pela Agência de Avaliação e Acreditação do Ensino Superior (A3ES), mas aquele organismo tem “chumbado” sucessivamente os projectos.

Esta informação consta da base de dados pública da agência e foi confirmada pelo presidente daquele organismo, Alberto Amaral. As recusas das acreditações dos doutoramentos da Portucalense e da Atlântica “prendem-se sobretudo com o corpo docente e a falta de investigação” nas áreas em que as instituições querem, informa aquele responsável.

O Regime Jurídico das Instituições de Ensino Superior (RJIES), de 2007, estabelece um número mínimo de licenciaturas, mestrados e doutoramentos que têm que estar em funcionamento numa instituição privada para que esta possa ser considerada universidade. No caso dos doutoramentos são necessários três, em áreas científicas diferentes. Caso exista apenas um doutoramento aprovado, a instituição terá que adoptar a designação de instituto universitário. Se não tiver nenhum, assume o estatuto de instituto politécnico.

Não é certo, porém, o que pode acontecer a estas universidades face à situação irregular em que têm vivido. O RJIES inclui entre os motivos para o encerramento compulsivo de instituições de ensino superior “o não preenchimento dos requisitos necessários ao seu funcionamento”. No entanto, Portucalense e Atlântica cumprem todos os outros requisitos para se manterem em funcionamento, pelo que a situação acutal podia ser solucionada apenas pela adequação da sua designação.

Os problemas destas duas universidades privadas foram comunicados em “vários ofícios” ao Ministério da Educação durante o último mandato, garante o presidente da A3ES, Alberto Amaral. Fonte do novo Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior informa que o assunto está ainda a ser analisado, pelo que o ministro Manuel Heitor não quer comentá-lo de momento.

A DGES tem o tema em mãos desde, pelo menos, 2013. Nessa altura, decidiu não tomar qualquer decisão relativamente a uma eventual alteração do estatuto da Universidade Portucalense, enquanto aquela instituição tentava a aprovação de novos doutoramentos – entretanto “chumbados” pela A3ES. Pelo contrário, no caso da Atlântica, direcção-geral propôs à administração da instituição a sua reconversão em instituto politécnico, mas desde então o caso não teve qualquer desenvolvimento.

Contactadas pelo PÚBLICO, as duas universidades privadas reagem de forma distinta à situação. A Portucalense recusa a ideia de que esteja em situação irregular, defendendo que, ainda que o período de acreditação dos anteriores doutoramentos tenha terminado há três anos, estes estiveram em funcionamento até Setembro deste ano, para que os estudantes pudessem terminar as teses em curso.

Aquela universidade contesta também a decisão de não aprovar as propostas programas de doutoramento tomadas pela A3ES. “Dois dos programas propostos em 2014 obtiveram parecer favorável por parte das Comissões Científicas de Avaliação”, informa a directora de comunicação da instituição, Cláudia Carvalho. As propostas acabariam, porém, chumbadas pelo conselho de administração da A3ES, numa decisão que “foi objecto contestação” por parte da Portucalense que afirmou “não compreender a sua fundamentação e pelas notórias discrepâncias” de critérios face a decisões tomadas noutras instituições.

Já a Atlântica assume que se encontrar numa situação “irregular”, cuja responsabilidade a directora-geral, Natália Espírito Santo, atribuiu à anterior administração e reitoria: “Não agiram nem reagiram”. A Universidade Atlântica foi criada em 1996, com uma participação de 41% da Câmara de Oeiras. Nos seus órgãos sociais teve figuras da política como os socialistas Ana Benavente e Vera Jardim ou o social-democrata Luís Marques Mendes, tendo passado por sérias dificuldades financeiras nos últimos anos, que se agudizaram em 2014.

Há cerca de um ano, a empresa espanhola Carbures adquiriu 87% do seu capital, apostando num novo projecto sobretudo ligado às áreas da engenharia de materiais e aeronáutica. “Vamos partir para a revitalização da instituição, de forma a cumprir todos os requisitos legalmente previstos para as universidades”, promete Natália Espírito Santo. Desde a entrada dos novos accionistas, a Atlântica, que tem 900 alunos inscritos, “reforçou o seu corpo docente” e a maioria dos seus cerca de 70 professores é agora doutorado.

Em Setembro, a instituição de Oeiras propôs quatro novos doutoramentos: Engenharia de Materiais, Engenharia de Dispositivos Médicos, Gestão da Tecnologia e Inovação e Gestão por Competências. Também a Portucalense – que actualmente tem cerca de 2000 estudantes – submeteu este ano para acreditação cinco novos doutoramentos (nas áreas de Direito, Psicologia e Economia), acreditando ter capacidade para mantê-los em funcionamento depois de um “investimento ao longo dos últimos anos” na qualificação do corpo docente e na investigação científica.

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