Portugueses enviaram quase quatro toneladas de roupa para a Sérvia

Grupo informal "Não te refugies" angariou, a partir do Porto, cobertores e roupas quentes. Tem agora quase três mil euros para comprar tendas e outros bens.

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Jorge Sá e a companheira sérvia passaram Setembro em Belgrado, a ajudar refugiados sírios, afegãos e iraquianos DR

O mestrado em Arquitectura pode esperar. Há três meses que Jorge Sá dedica todo o tempo que pode a angariar roupas e outros bens para quem tenta entrar na União Europeia pela fronteira com a Sérvia. Nesta sexta-feira, 3,9 toneladas de roupas devem chegar às mãos da Cruz Vermelha de Belgrado.

Desembarcou em Belgrado a 10 de Setembro. Passou as férias a fazer voluntariado na CZA, uma organização não-governamental local, de que a companheira, Milica Bogdanov, já fazia parte. Não havia muito para distribuir. Quase tudo o que lá chegava era doado por sérvios e os sérvios tinham pouco para doar. Quando regressou a Portugal, no dia 28, já só pensava em encontrar formas de continuar a ajudar quem está a fugir da Síria, do Afeganistão ou do Iraque.

Um artigo publicado no PÚBLICO ajudou-o a abrir muitas portas. Levava-o sempre que ia falar com alguém, como um atestado de credibilidade. Chamou "Não te Refugies" ao grupo que formou com Milica. Depressa se lhes juntaram a designer Lígia Pinto e a médica Bárbara Seabra. Pediram à Cruz Vermelha que lhes desse uma lista de maiores necessidades. Falaram com todas as entidades que podiam ajudar, incluindo à Embaixada da Sérvia em Portugal. Milica descuidou o mestrado em Serviço Social – esteve três semanas em Portugal. E Jorge descuidou o mestrado em Arquitectura.

“Deixei de ter vida”, diz ele. “Daqui a dez anos não me vou lembrar que falhei a entrega de um trabalho de mestrado, mas vou lembrar-me disto.” “Isto” é a dedicação, o corte com amigos que não lidaram bem com esta vontade de ajudar quem vem de longe, o ganhar novos amigos, pessoas que vivem na área metropolitana do Porto e que com ele partilham a vontade de ajudar quem foge à guerra.  

Conseguiram que várias corporações de bombeiros e escolas servissem de local de recolha, que uma entidade pública emprestasse um espaço que fizesse as vezes de armazém, que duas empresas privadas garantissem o transporte, que umas 30 pessoas se mobilizassem na recolha, triagem, lavagem, arrumação de roupas. Uma delas, Sónia Rodrigues, organizou um grupo em Arcos de Valdevez que angariou 200 quilos de roupa e 1400 euros.

Segunda-feira, seguiram para Belgrado dois mil casacos, 1581 calças, 3828 camisolas, 213 cobertores e inúmeras peças acomodadas em 204 caixas. Já chegaram a Belgrado. Milica está lá a acompanhar os trâmites alfandegários, a garantir que nada se perde. Jorge está convencido de que a carga é libertada esta sexta-feira, mas não tem certeza. Admite que o seja só no início da próxima semana. O importante, parece-lhe, é que as roupas chegam antes do Inverno. Os Invernos, ali, são rigorosos.

Não mandaram tudo. Houve uns 900 quilos de roupa doada que entregaram à Cruz Vermelha do Porto. Não preenchiam os critérios. “Roupas de Verão”, resume Jorge Sá. Entretanto, chegaram-lhes às mãos mais 90 caixotes de roupas, antes pertencentes a uma empresa que faliu e doadas aos Médicos do Mundo. Neste fim-de-semana no armazém lá estarão Jorge, Lígia, Bárbara e outros a tratar de tudo.

Uma das ambições do “Não te refugies” era angariar tendas e sacos-cama, mas não encontrou quem doasse. Lançou a campanha "Tendas para Todos", que alojou na plataforma de financiamento colaborativo PPL Causas. O objectivo era obter dois mil euros, mas conseguiram 2911. Já não sabem se é preciso tendas e sacos-cama. Estão a aguardar notícias da Cruz Vermelha. A realidade altera-se, lembra o enfermeiro, que mora no Porto onde, além de estudar Arquitectura, trabalha numa empresa de ensaios clínicos. O importante, entende, é contribuir para o bem-estar e para a dignidade daquelas pessoas.

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