“Sigam as regras”, diz um programa de TV aos refugiados chegados à Alemanha

Sim, é permitido gozar com o islão. Não, não se pode atravessar a rua com sinal vermelho. E, sim, as mulheres podem fazer sexo antes do casamento.

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O apresentador do programa, Constantin Schreiber DR
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Uma voluntária ajuda uma criança refugiada a escolher roupa num centro de ajuda em Munique AFP / CHRISTOF STACHE

O primeiro talk-show televisivo falado em árabe da Alemanha tem como objectivo apoiar a integração dos refugiados de países árabes com uma mensagem muito simples: “Sigam as regras!”

Num momento em que a Alemanha se prepara para processar mais de um milhão de pedidos de asilo até ao fim deste ano, a integração é uma questão para muitos alemães que temem que a chegada de muitos imigrantes muçulmanos possa por em causa a cultura alemã.

É para tentar lidar com essa preocupação que o programa Marhaba (Olá, em árabe) vai para o ar esta quinta-feira na n-tv, um canal privado do cabo. Apresentado num árabe irrepreensível por Constantin Schreiber, um alemão de olhos azuis, cabelo claro e informalmente vestido.

Tudo arrancou com um programa de cinco minutos que começou a ser emitido online no final de Setembro. A sua enorme popularidade levou a n-tv a transferir o Marhaba para o cabo, onde vai ter uma duração de 40 minutos com rubricas tanto em alemão como em árabe e com as legendas correspondentes.

“Também vos quero falar sobre alguns pequenos pormenores como a utilização de telemóveis e a necessidade de respeitar as regras, os sinais de trânsito e os semáforos neste país”, diz Schreiber no primeiro episódio transmitido online e chamado “Nós os alemães”. “Por exemplo, não usamos o telemóvel quando vamos a guiar, respeitamos os semáforos para os peões e não atravessamos quando está vermelho”.

Outro conselho útil dado pelo apresentador do Marhaba: não telefonem ou enviem mensagens aos alemães depois do jantar porque eles não vão certamente gostar, já que estão a descansar depois de um árduo dia de trabalho.

Schreiber recebeu mais de seis mil emails desde a estreia online do programa, quase metade delas enviadas por árabes de dentro e fora da Alemanha que elogiaram o seu trabalho. “Sou uma síria e quero agradecer-lhe pelo seu programa Sr. Constantin”, escreveu uma mulher num email. “As pessoas que têm mais de 50 anos têm dificuldade em aprender alemão por isso peço-lhe que continue a informá-las”.

Alguns mails incluíam críticas de alemães que preferiam que o programa fosse falado em alemão com legendas em árabe. Outros alertam que o Marhaba vai encorajar mais imigrantes a viajarem para a Alemanha. Algumas mensagens continham ameaças de morte.

“Parece haver uma procura tão grande de informação, uma necessidade de diálogo e discussão, que nós decidimos criar uma plataforma para responder a todo este desafio”, disse Schreiber, em declarações à Reuters.

Amor e sexo
O segundo episódio, chamado “A lei alemã e a sharia”, diz aos muçulmanos que nenhuma lei está acima da Constituição alemã. A sharia é o sistema legal do islão, existindo versões mais ou menos rígidas aplicadas em muitos países muçulmanos. “A liberdade religiosa, a liberdade de expressão e a liberdade de reunião são apenas três dos principais direitos assegurados pela lei alemã”, diz Schreiber, com o edifício do Reichstag (Parlamento) por trás de si. Os três direitos fundamentais são particularmente sagrados na Alemanha, uma vez que a História do país está marcada pelos “horrores da ditadura”, continua o apresentador.

A lei fundamental alemã, explica Schreiber, está na base da fundação na nova Alemanha democrática que nasceu das ruínas da II Guerra Mundial. O episódio é filmado nos edifícios do governo, onde o vice-ministro das Finanças, Jens Spahn, membro do partido liderado por Angela Merkel, os Democratas Cristãos, explica o que é a liberdade de expressão na Alemanha. “A liberdade de expressão quer dizer que qualquer pessoa pode dizer aquilo que pensa. A liberdade de imprensa significa que podemos dizer piadas, mesmo sobre religião”, diz Spahn. “Mesmo quando as piadas são sobre o Corão, isso tem que ser tolerado. ”

Sátiras e cartoons publicados em vários estados ocidentais da Alemanha provocaram protesto, alguns violentos, da comunidade muçulmana ao longo dos últimos anos. Cerca de quatro milhões de muçulmanos vivem na Alemanha, sendo quase 5% da população. Três milhões são turcos que chegaram nos anos 1960 e 1970 integrados num programa de recrutamento de “trabalhadores convidados” com baixas qualificações e que tiveram inúmeras dificuldades no processo de integração.

O Marhaba também tem um episódio chamado “Amor e sexo” que diz aos refugiados que a “autodeterminação sexual” é também um direito sagrado na Alemanha, onde as mulheres podem ter sexo antes do casamento sem enfrentarem consequências por parte dos homens da família.

“Para alguns imigrantes de primeira geração isto pode constituir um problema porque muitos carregam consigo os preceitos ideológicos do islão desde a infância”, explica a egípcia Hebatallah Ismail, em conversa com Schreiber à porta da catedral de Colónia. Ele acrescenta que a segunda geração de migrantes muçulmanos na Alemanha tende a discordar da visão dos pais sobre a sexualidade, o que explica que “de tempos a tempos se ouça falar de crimes de honra na Alemanha”.

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