Director-geral da Saúde alerta para riscos dos partos em casa

Em Portugal, todos os anos, mais de 600 crianças nascem fora dos hospitais. Francisco George quer travar esta realidade.

Foto
Entre 2000 e 2008 passou-se de 480 partos fora dos hospitais para quase 900 Fernando Veludo/NFactos

Em Portugal, a tendência para realizar os partos em casa ainda “não é muito expressiva” mas, dadas as consequências para as mães e os bebés, o director-geral da Saúde considera que é preciso “combatê-la desde já”. Francisco George reiterou nesta sexta-feira que nenhum bebé deve nascer sem assistência hospitalar e frisou que a equipa deverá ser sempre multidisciplinar, contando com médicos e enfermeiros. “Não temos este problema mas começamos a ter sinais de crianças que chegam aos hospitais em situação dramática. É preciso combater essa tendência dos partos em casa logo de início”, afirmou o responsável.

Francisco George, que falava durante a apresentação do Programa Nacional para a Vigilância da Gravidez de Baixo Risco, que decorreu no Centro de Saúde de Sete Rios, em Lisboa, começou por alertar que a tendência dos partos em casa começa a tentar implantar-se no terreno. Apesar do número ainda ser reduzido, o dirigente da Direcção-Geral da Saúde (DGS) sublinhou que as consequências para os bebés que são posteriormente recebidos nos hospitais são “dramáticas”.

O número de partos realizados em casa quase duplicou em Portugal nos últimos anos. Em 2000 nasciam 480 crianças fora dos hospitais e em 2008 o número chegou quase aos 900, de acordo com uma análise da natalidade e mortalidade infantil da Fundação Francisco Manuel dos Santos, publicada em 2013. Desde essa altura que o valor acabou por recuar mas, mesmo assim, os últimos dados do Instituto Nacional de Estatística indicam que em 2013 ainda houve 602 mulheres a terem os filhos em casa.

A Organização Mundial de Saúde, num guia sobre um parto normal e sem complicações que sejam expectáveis, considera que a mulher deve escolher para sítio do parto o local onde se sente melhor. Contudo, Francisco George contrapõe em Portugal é exemplo internacional no caminho que fez de redução da mortalidade infantil precisamente pelo acompanhamento que é feito durante a gravidez e o parto – em serviços hospitalares especializados.

Ainda a propósito dos partos, na mesma conferência, Francisco George afirmou ser contra os nascimentos que são apenas acompanhados pelos enfermeiros de forma autónoma. “Não posso apoiar que o enfermeiro possa fazer de forma autónoma o parto. Não podemos sequer arriscar e voltar ao passado. [As grávidas] Devem ser assistidas por equipas de várias especialidades. A Ordem dos Enfermeiros não conta com o director-geral da Saúde em termos de simpatia para a promoção de partos só assistidos autonomamente por enfermeiros”, acrescentou.

Também presente na plateia, o director do Serviço de Obstetrícia do Centro Hospitalar Lisboa Norte (Hospital de Santa Maria) corroborou a opinião da DGS e insistiu que “o parto hospitalar é o parto seguro e onde as coisas podem correr bem”. “De cada três bebés que morrem no parto domiciliário, dois seriam salvos no hospital. Dos bebés que morrem no parto hospitalar, nenhum teria sido salvo se fosse em casa. Isto é incontestável”, defendeu Luís Graça, citando dados de um estudo norte-americano sobre o tema. Já Vítor Varela, da Ordem dos Enfermeiros, pediu para intervir e citou trabalhos que contrariam a ideia de que a intervenção autónoma dos enfermeiros prejudica os indicadores da mortalidade materna e da mortalidade infantil.

Planear a gravidez

Na mesma sessão, a DGS apresentou o novo Programa Nacional para a Vigilância da Gravidez de Baixo Risco. O documento, sob a forma de livro, sintetiza e organiza muito do que já é feito no terreno, explicou Lisa Vicente, da Divisão de Saúde Sexual, Reprodutiva, Infantil e Juvenil da DGS, que coordenou o trabalho. Segundo a responsável, a ideia é “trabalhar mais o planeamento da gravidez, para modificar situações que não estão bem” e incutir a noção nos profissionais de saúde que “o ciclo não acaba no parto”.

Lisa Vicente adiantou que a ideia é incluir mais os parceiros das mulheres no processo de gravidez e “aproveitar a oportunidade de mudança” que a gravidez gera para melhorar alguns comportamentos da mulher e da família no que diz respeito, por exemplo, à alimentação e ao tabagismo. A propósito do tabaco, a directora do Programa Nacional para a Prevenção e Controlo do Tabagismo alertou que só 11% das mulheres param de fumar mal sabem que estão grávida e que 17% fumam até ao fim da gravidez.

Contudo, como explicou Lisa Vicente, a ideia é ir mais longe nos temas a abordar e aproveitar o momento para não deixar de lado assuntos em que as mulheres podem sentir-se mais inibidas de tomar a iniciativa de falar. Abordar o tema da violência doméstica e da saúde mental, mas também as dificuldades após o parto, como nas relações sexuais ou incontinência são outras das situações previstas no plano.

A DGS assegura que o manual é de “fácil consulta” e que inclui recomendações para todas as fases: pré-concepção, gravidez e puerpério. “Os cuidados centram-se nas necessidades de cada mulher, par, família, que devem ser considerados parceiros nas decisões e intervenções necessárias para a vigilância da gravidez. Da mesma forma, o conceito de vigilância pré-natal é alargado de modo a que seja inclusivo, abrangendo (quando for esse o caso) o pai, ou outras pessoas significativas, bem como a diversidade sociocultural e as pessoas com necessidades especiais”, sintetiza a DGS.

Sugerir correcção
Ler 1 comentários