Ministério para ensino superior é uma "boa notícia"

“Competência” de Manuel Heitor para o cargo é elogiada por instituições e alunos, mas o sector teme que constrangimentos financeiros não desapareçam

Foto
Daniel Rocha/ Arquivo

A configuração do Governo do PS anunciado esta terça-feira é uma “boa notícia” para o ensino superior, concordam universidades, politécnicos e estudantes. Tudo porque o primeiro-ministro indigitado, António Costa, decidiu voltar a criar um ministério autónomo para o ensino superior e a ciência, ao contrário do que aconteceu na anterior legislatura. A escolha de Manuel Heitor para ministro também merece elogios, mas no sector teme-se que os constrangimentos financeiros dos últimos anos não desapareçam.

A inclusão do ensino superior num grande Ministério da Educação e Ciência, liderado nos últimos quatro anos por Nuno Crato, “teve um impacto muito negativo para o sector”, avalia o reitor da Universidade de Lisboa, António Cruz Serra. “O ministro deu quase toda a tua atenção ao ensino básico e secundário”. Essa opção “menorizou o ensino superior” e retirou-lhe “peso político”, acrescenta o presidente da Associação Académica da Universidade do Minho (AAUM), Carlos Videira.

Antes das eleições, foi unanimemente defendido pelo Conselho de Reitores das Universidade Portuguesas (CRUP), Conselho Coordenador dos Institutos Superior Politécnicos (CCISP) e movimento associativo estudantil que, num futuro Governo, devia ser recuperado um ministério próprio para o ensino superior, à semelhança do que tinha acontecido nos executivos anteriores. Esta opção do PS é, por isso, entendida por instituições e estudantes como uma “boa notícia” e foi igualmente “bem recebida” pelo Sindicato Nacional do Ensino Superior (Snesup).

“Ao longo dos últimos anos, em alguns temas fracturantes, foi possível verificar que existe abertura e posições em comum com o novo ministro”, valoriza ainda aquela estrutura sindical num comunicado enviado poucas horas depois de conhecido o nome do novo titular da pasta. O Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior será liderado pelo investigador Manuel Heitor, de 57 anos, que foi secretário de Estado durante seis anos, entre 2005 e 2011, período em que José Mariano Gago foi o ministro responsável por estas áreas nos governos socialistas de José Sócrates.

Este conhecimento anterior da pasta garante-lhe “competência” para o lugar, considera o presidente da AAUM. “Sabemos qual é sua forma de trabalhar e o seu pensamento. E ele sabe o que esperar do sistema”, valoriza o presidente do CCISP, Joaquim Mourato, para quem este facto vai facilitar o trabalho com o novo responsável político pelo ensino superior e a ciência.

Apesar de conhecerem o pensamento de Manuel Heitor e saberem que ele é, no essencial, herdeiro do que tinha sido postulado por Mariano Gago em termos de centralidade do ensino superior no sistema científico e necessidade de investimento público no sector, instituições de ensino superior e estudantes temem que, na prática, os constrangimentos financeiros que marcaram os últimos anos demorem a desaparecer.

Por exemplo, a possibilidade de os orçamentos das instituições de ensino superior serem definidos numa base plurianual, que era defendida no programa eleitoral do PS e merecia a concordância dos principais actores do sector, era algo que já tinha sido tentado por Gago, com os contratos de confiança que, na prática, nunca foram concretizados.

O sucesso de Manuel Heitor no Ministério da Ciência e Ensino Superior vai “depender das circunstâncias”, antecipa Carlos Videira da AAUM. “Veremos qual será o programa do Governo e as condições financeiras do mandato”, acrescenta o reitor da Universidade de Lisboa. O líder dos politécnicos também concorda com esta visão e lembra que, nos últimos governos, tem existido “alguma subordinação do sector ao Ministério das Finanças”, que poderá limitar a acção do novo ministro.

Professor catedrático, Manuel Heitor era até agora director do Centro de Estudos em Inovação, Tecnologia e Políticas de Desenvolvimento (do Instituto Superior Técnico de Lisboa, ou IST), que fundou em 1998. Foi no IST que se licenciou em engenharia mecânica, em 1981. Quatro anos depois, doutorou-se no Imperial College, em Londres, também em engenharia mecânica, a que se seguiu um pós-doutoramento na Universidade da Califórnia em San Diego, em 1986.

Depois da formação e estadia no estrangeiro, desenvolveu a sua carreira académica e de investigação no IST, na área de mecânica de fluidos e combustão experimental. A partir do início da década de 1990 dedicou-se também ao estudo de políticas de ciência, tecnologia e inovação, incluindo políticas e gestão do ensino superior.

Sugerir correcção
Ler 2 comentários