Um ano depois do LuxLeaks, a Europa ainda aguarda uma “nova realidade” fiscal

Parlamento Europeu discutiu práticas fiscais agressivas. Elisa Ferreira diz que é preciso pressionar Bruxelas a avançar com mudanças na área fiscal.

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Elisa Ferreira diz que houve “muita informação” que foi negada à comissão TAXE Diogo Baptista

Um ano depois do escândalo LuxLeaks, o debate sobre as práticas fiscais agressivas na Europa está longe de estar terminado. A prova foi o debate desta terça-feira no Parlamento Europeu a propósito do relatório sobre “decisões fiscais antecipadas”, do qual é co-relatora a eurodeputada do PS Elisa Ferreira, que apelou em Estrasburgo a uma “nova realidade” fiscal na União Europeia.

Por exemplo, para que os impostos directos sobre os lucros das empresas sejam calculados de acordo com métodos comuns na União Europeia; ou simplesmente para que as multinacionais passem a prestar informação sobre os “negócios que realizam em cada país”; ou ainda para que haja uma “definição europeia de paraísos fiscais” e tolerância zero com os centros financeiros offshore.

Estas foram algumas das propostas que resultaram dos oito meses de trabalho da comissão parlamentar TAXE. Mas como “muito ficou por averiguar”, Elisa Ferreira defendeu o lançamento de uma TAXE II, uma segunda fase dos trabalhos para manter a “pressão política” sobre o Conselho e a Comissão Europeia, para que haja “urgentemente na nova realidade europeia em matéria fiscal”.

Segundo a eurodeputada socialista, que teve como co-relator o eurodeputado alemão Michael Theurer (dos liberais), houve “muita informação” que foi negada aos eurodeputados. A “inquirição de responsabilidades e de práticas desleais” ainda não está terminada e interessa “reforçar a investigação sobre o passado” para pressionar o Conselho e a Comissão.

A Elisa Ferreira coube, com ironia, sensibilizar os eurodeputados para o problema: “Se vos anunciassem agora que este ano iriam pagar uma taxa de imposto sobre os vossos rendimentos de apenas 5%, ninguém acreditaria, apesar de estarmos tão perto do Natal. Pois bem, essa é a realidade da maior parte das grandes empresas multinacionais na Europa, que pagam taxas efectivas de 5% e por vezes ainda inferiores, mesmo nos países em que a taxa nominal do imposto ronda os 30%”.

Os trabalhos da comissão especial surgiram na sequência do escândalo LuxLeaks, revelado em Novembro do ano passado pelo Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (CIJI), que deu conta de acordos secretos celebrados entre o Luxemburgo e mais de 300 multinacionais. Tudo aconteceu entre 2002 e 2010, era então primeiro-ministro do país Jean-Claude Juncker, o actual presidente da Comissão Europeia.

O caso embaraçou o início da Comissão Juncker e ainda hoje gera desconforto entre os democratas-cristãos. No plenário desta terça-feira, o eurodeputado do PCP João Ferreira, membro da comissão TAXE, questionou a eurodeputada Danuta Maria Hübner, do Partido Popular Europeu, se os democratas-cristãos estão dispostos a chamar Juncker a prestar mais esclarecimentos ao Parlamento Europeu – para “apurar muito melhor qual a sua participação em todo este processo”.

A eurodeputada do PPE, membro da comissão TAXE, escudou-se em dar uma resposta taxativa, dizendo que a pergunta se dirigia “mais ao coordenador” do grupo parlamentar. “Não parece que essa necessidade exista”, afirmou, embora acrescentando: “Temos o maior gosto em debater essas questões”.

Da parte da manhã, Juncker prometeu: “A ambição da Comissão Europeia consiste em fazer tudo para que a Europa, em matéria fiscal, seja dotada de uma mesma base de matéria colectável”. O comissário europeu Pierre Moscovici salientou que o executivo comunitário já foi “mais longe do que alguma Comissão fez até agora” e prometeu usar “todos os instrumentos de que dispõe” para combater as práticas fiscais agressivas.

Os eurodeputados da TAXE consideram ainda insuficiente o projecto da Comissão, que obriga os Estados-membros à troca automática de informações sobre decisões fiscais antecipadas. Foi o co-relator Michael Theurer a dizê-lo, lembrando que “muitas empresas internacionais conseguem utilizar lacunas fiscais” para diminuir os impostos que pagam.

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