Durão Barroso pede compromisso com reformas

O ex-presidente da Comissão Europeia manifestou-se também preocupado com um eventual Governo de esquerda, considerando tratar-se de uma solução que "não tem credibilidade" para Portugal.

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Durão defende “reformas estruturais para aumento da produtividade" AFP

O ex-presidente da Comissão Europeia Durão Barroso defendeu nesta segunda-feira um compromisso nacional com as reformas estruturais "independentemente da solução política" e alertou para o risco de desequilíbrio das contas externas com um crescimento económico assente na procura interna.

"A verdade é que tenho dúvidas que se mantenha, já não direi a acção, mas pelo menos a intenção das reformas estruturais [do trabalho]. Ou seja, que se aumente o input trabalho, quando tudo de que se fala é de se reduzir esse input", através da redução do horário de trabalho na administração pública, afirmou Durão Barroso.

O ex-presidente da Comissão Europeia falava na apresentação do estudo Portugal: Escolhas para o futuro da consultora internacional McKinsey, que concluiu que a maioria dos portugueses estaria disponível para trabalhar mais horas e sob maior pressão, com compensações associadas à produtividade, para obter mais rendimento disponível, qualidade na saúde e na educação.

Nesse sentido, Durão Barroso defendeu ser "necessário que, independentemente da solução política que venha a ser encontrada para esta crise em que actualmente nos encontramos, é absolutamente necessário que haja um comprometimento nacional com um esforço das reformas estruturais para aumento da produtividade", considerando que este estudo demonstra que há disponibilidade entre os portugueses para isso.

"Qual será a capacidade das autoridades públicas em Portugal para manter uma trajectória de reformas estruturais para garantir que a nossa economia tem maior adaptabilidade e flexibilidade?", interrogou o antigo primeiro-ministro português.

Referindo-se à "ideia de que o caminho mais fácil para o crescimento é o aumento da procura", Durão Barroso alertou para os seus perigos.

"Portugal tem um pequeno problema: é que cada vez que se aumenta mais do que é expectável a procura interna, o desequilíbrio externo acontece, porque isso aumenta as importações", disse, alertando que este é um ponto para o qual se deve ter atenção nos próximos tempos.

"Se se julga que é fácil em Portugal manter os objectivos do Programa de Estabilidade e Crescimento, sobretudo com uma política de apoio à procura interna, eu julgo que as pessoas se vão enganar: um efeito imediato é o desequilíbrio da balança externa", avisou o ex-presidente da Comissão Europeia.

Durão Barroso terminou a sua intervenção "com um ponto de interrogação quanto ao futuro do país" e com um "ponto de exclamação, ou esperança de que não se confirmem os vaticínios negativos e que o país seja capaz de manter ou reforçar o comprometimento de reforço da competitividade".

Sem nunca se referir a um eventual novo Governo do PS, o ex-primeiro-ministro social-democrata deixou assim dois avisos a António Costa, uma vez que a proposta de Governo socialista prevê o regresso às 35 horas de trabalho na função pública e um aumento do rendimento disponível, o que poderá aumentar o consumo e, consequentemente, fazer crescer a economia.

Solução sem “credibilidade”
Durão Barroso manifestou-se também preocupado com um eventual Governo de esquerda, considerando tratar-se de uma solução que "não tem credibilidade" para Portugal.

"Aparentemente, vamos ter um Governo minoritário, o que não é bom, mas ainda pior, é uma minoria suportada por partidos que são totalmente contra as políticas que são do consenso europeu - crescimento da produtividade, compromisso com o euro, reformas estruturais", afirmou.

O ex-presidente da Comissão Europeia admitiu estar preocupado com a actual situação política, embora tenha frisado que a sua opinião "nada tem a ver" com as suas preferências políticas, uma vez que já não tem "uma vida política activa".

"Estou preocupado com a situação actual, não só por causa da instabilidade política e da solução que parece ser a encontrada, mas porque é uma solução que não tem credibilidade suficiente, não tem estabilidade suficiente, e era desejável que tivéssemos o apoio da maioria dos partidos políticos em Portugal e que houvesse um consenso", considerou Barroso.

Embora reconheça que a decisão do parlamento deve ser respeitada, o antigo presidente da Comissão Europeia assinalou que "o problema é a direcção" que o país poderá ter nos próximos tempos, de reversão das políticas de ajustamento que foram aplicadas nos últimos quatro anos.

"O problema é a direcção [que Portugal poderá seguir] e se lermos os acordos, o que temos até agora são alguns documentos de um acordo entre o PS e três diferentes forças políticas [...] e até agora, todas as indicações vão no sentido de mudança de direcção; não é uma questão de grau do ajustamento, mas de reversão das políticas", referiu o ex-governante.

Durão Barroso alertou ainda para o facto de, no âmbito dos acordos assinados entre o PS, Bloco de Esquerda, PCP e Verdes, poderem ser revertidos os acordos de concertação social, bem como tudo o que foi feito em relação à legislação laboral, em particular, da função pública, dos transportes e outras.

"Eu estaria preocupado se estivesse na UGT, porque os acordos serão revertidos pela maioria no parlamento", disse.

Na opinião do antigo primeiro-ministro, e apesar de preocupado com uma futura governação à esquerda, "há margem para devolver aos pensionistas e aos trabalhadores algum do poder de compra que perderam durante a crise".

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